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Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

O Vulcão Dourado do Amor Divino

de

Sua Divina Graça Sri Srimad Srila
Bhaktirakshaka Sridhar Dev-Goswami Majaraja Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya

 

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

O Vulcão Dourado do Amor Divino

 

Índice

Nota do Tradutor

Introdução

Parte 1 - A Vida de Sri Chaitanya Mahaprabhu

Capítulo 1 - O Avatara Dourado

Capítulo 2 - A Encarnação Misteriosa

Capítulo 3 - O Amigo dos Caídos

Capítulo 4 - O Louco Nimai Pandita

Capítulo 5 - Uma Tragédia de Separação

Parte 2 - Shikshastakam - Os Ensinamentos do Senhor Chaitanya

1 - O Santo Nome de Krishna

2 - Os Ilimitados Nomes de Deus

3 - Mais Humilde do que uma Folha de Grama

4 - Devoção Pura

5 - Rei da Terra do Amor

6 - Anseio por Perfeição

7 - Com Você para Sempre

8 - União na Separação

Parte 3 - Epílogo

 

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

O Vulcão Dourado do Amor Divino

 

Nota do Tradutor

Traduzi este Néctar maravilhoso de Sua Divina Graça Sri Srimad Srila Bhaktirakshaka Sridhar Dev-Goswami Maharaj Prabhupada, Paramahamsa Thakura Mahashaya, ou seja, nosso amado Srila Guru Maharaj Prabhupada, no começo de 1993, a pedido dos representantes oficiais e herdeiros oficiais de Srila Guru Maharaj. O prefácio que escrevi na época também foi a pedido deles.

Fiz essa tradução somente pela graça divina de meu amado Gurudeva, Srila Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada, Paramahamsa Thakura Mahashaya, somente pela inspiração divina dele, e do próprio Srila Guru Maharaj.

O Vulcão Dourado do Amor Divino é um néctar maravilhoso que emanou da boca de lótus de Srila Guru Maharaj, que é considerado uma encarnação do próprio Srila Rupa Goswami Prabhupada. Por isso, tomo a liberdade de chamá-lo de Prabhupada também. Se ele não for Prabhupada também, quem será?

Srila Guru Maharaj não escreveu o Vulcão Dourado do Amor Divino, é uma transcrição de uma de suas palestras divinas. E é um Livro fundamental para quem quer compreender melhor a natureza e vida de Sri Chaitanya Mahaprabhu, e o que é a Consciência de Krishna de verdade.

Prabhupada além de ser um irmão querido de Srila Guru Maharaj o considerava como seu shiksha-guru (mestre espiritual instrutor). Prabhupada afirmou que Srila Guru Maharaj foi quem o preparou para vir ao Ocidente.

Além do mais, a última instrução de Prabhupada para seus discípulos é que se abrigassem sob os pés de lótus de seu irmão querido, Srila Guru Maharaj. Essa foi sua última instrução.

Como já é mais do que sabido, a grande maioria de seus discípulos (99,9 %) não seguiu essa última instrução de Prabhupada e preferiu ficar do lado dos bens materiais, e dos líderes dominados pelo demônio Kali que destruíram a Missão de Srila Prabhupada. Claro que só no aspecto externo, pois a Missão de Prabhupada é a Missão do Senhor Chaitanya Mahaprabhu, e não está sujeita a nenhuma situação material.

Como Krishna afirma no Bhagavad-gita (7.3):

manusyanam sahasresu
kascid yatati siddhaye
yatatam api siddhanam
kascin mam vetti tattvatah

"Entre muitos milhares de pessoas, talvez uma se esforce pela perfeição, e entre as que alcançaram a perfeição, dificilmente uma Me conhece de verdade".

Só para esclarecer quem ficou em dúvida sobre o Néctar "A Missão do Senhor Chaitanya Mahaprabhu", onde percebemos que a história se repete. Sri Chaitanya Charitamrita (Adi 12.8). Pois é um assunto que não merece mais discussão.

A Segunda Parte de O Vulcão Dourado do Amor Divino descreve os ensinamentos de Sri Chaitanya Mahaprabhu na forma de Seu Shikshastakam, ou seja, os oito versos de Sua autoria que resumem de forma mística todos Seus Ensinamentos. Sri Chaitanya Mahaprabhu apesar de ser o maior sábio erudito da época, escreveu somente esses oito versos, pois deixou a Missão de escrever a Literatura Divina a cargo de Seus discípulos diretos, nossos Mestres Divinos, liderados por Srila Rupa Goswami Prabhupada e Srila Sanatana Goswami Prabhupada.

Como Srila Prabhupada ensinou na canção "Lalasamayi Prarthana" de Srila Narottama Dasa Thakur: "Narottama Dasa diz em seguida, rupa-raghunatha-pade hoibe akuti: Quando estarei muito ansioso para estudar os livros deixados pelos seis Goswamis? - Akuti significa ansiedade"...

Prabhupada afirma ainda no Significado do Sri Chaitanya Charitamrita (Adi 2.116-121):

<<Devotos de imitação, que querem parecer Vaishnavas elevados e imitam os Acharyas prévios mas não os seguem em princípio, são condenados nas palavras do Srimad Bhagavatam como possuidores de coração de pedra. Srila Visvanatha Chakravarti Thakur comentou sobre a condição de coração de pedra: "Aqueles que derramam lágrimas por prática mas cujos corações não mudam, são conhecidos como devotos de coração de pedra do mais baixo grau. Seu choro de imitação, induzido por prática artificial, é sempre condenado". Essa mudança de coração é visível na relutância a fazer qualquer coisa não adequada ao caminho devocional. Para que essa mudança de coração ocorra, discussões conclusivas sobre Sri Krishna são absolutamente necessárias. Falsos devotos podem pensar que simplesmente por derramar lágrimas serão conduzidos ao plano transcendental, mesmo sem ter uma verdadeira mudança de coração, mas tal prática é inútil se não houver realização transcendental. Falsos devotos pensam que por derramar lágrimas artificialmente, serão liberados, mesmo sem conhecer a conclusão sobre o conhecimento transcendental. Similarmente, outros falsos devotos pensam que é desaconselhável estudar livros dos Acharyas prévios, como se fossem filosofias empíricas secas. Mas Srila Jiva Goswami, por seguir os Acharyas prévios, apresentou as conclusões das escrituras nas seis teses chamadas Sat-samdarbhas. Devotos falsos, que têm muito pouco conhecimento sobre tais conclusões, falham em alcançar devoção pura, devido ao excesso de zelo em aceitar instruções favoráveis ao serviço devocional dadas pelos devotos auto-realizados. Tais falsos devotos são iguais aos impersonalistas, que consideram o serviço devocional como atividades lucrativas>>.

Agora, veio a inspiração para revisar este Néctar divino e colocá-Lo no ar. Na época em que traduzi, com a intenção de caprichar, fiz os diálogos na segunda pessoa (tu e vós), mas hoje, percebo que ficou horrível, a gente não fala desse jeito. Portanto, transformei todas as segundas pessoas para a terceira mesmo (você) como falamos normalmente. Também, tentei tirar todos os gerúndios desnecessários. Além do mais, a cópia que anda pela Internet está incompleta, falta a Terceira Parte. Mas agora o Néctar está revisado e inteiro para o deleite e iluminação de todos nós.

Boa Leitura!

Nitai Gaura Hari Bol!

Visvavandya Dasa
São Paulo, sexta-feira, 5 de junho de 2009

 

 

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

O Vulcão Dourado do Amor Divino

de

Sua Divina Graça Sri Srimad Srila
Bhaktirakshaka Sridhar Dev-Goswami Majaraja Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya

 

Introdução

Sri Chaitanya Mahaprabhu pregou a concepção teísta plena dada no Srimad Bhagavatam. O Srimad Bhagavatam trata principalmente do estudo comparativo do teísmo e da ontologia da consciência de Krishna. Ele supera todas outras literaturas Védicas, até mesmo os Puranas. O Brahmavaivarta Purana e o Padma Purana apresentam a importância da devoção a Krishna através de narração e história até certo ponto, mas carecem do nível filosófico e ontológico estabelecido pelo Mahapurana, Srimad Bhagavatam. O Srimad Bhagavatam pode satisfazer todos vedantistas eruditos, pois apresenta a consciência de Krishna em sua dignidade plena. O Srimad Bhagavatam explica que a maior conquista do teísmo não é consciência, inteligência ou ontologia, mas sim êxtase, beleza e harmonia - rasa. Rasa é o mais importante para o Srimad Bhagavatam. É uma obra inigualável, pois eleva o teísmo do plano de ilusão intelectual para o ambiente de rasa.

Certa vez, comecei a escrever um livro que deveria ser um estudo resumido dos 18.000 versos do Srimad Bhagavatam. Bhaktivinoda Thakura condensou no seu Bhagavata-arka-marichi-mala todo o principio do Bhagavata em 1.000 versos. Eu pensava em consolidá-lo mais ainda, para apresentá-lo em 300 versos. Comecei o livro mas não consegui acabá-lo.

O Srimad Bhagavatam é uma grande obra da língua sânscrita, cheia de informação essencial, referências históricas e explanações sobre as principais escolas de filosofia. O Srimad Bhagavatam também menciona muitos detalhes de história e geografia, em reforço a suas conclusões, mesmo que não sejam essenciais. Tudo que é desnecessário no Srimad Bhagavatam é eliminado quando seu significado alcança sua glória mais pura e intensa nos ensinamentos de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Assim, se considerarmos a essência do Srimad Bhagavatam, devemos estudar a vida e ensinamentos de Sri Chaitanya Mahaprabhu. A essência do Srimad Bhagavatam foi filtrada pela vida e ensinamentos de Sri Chaitanya Mahaprabhu, da mesma forma como os ensinamentos do grande autor do Srimad Bhagavatam, Srila Vyasadeva, foram filtrados pelas realizações de Shukadeva Goswami.

Portanto, gostaria de incluir aqui alguns versos que compus originalmente para a introdução do meu estudo resumido, pois os ensinamentos de Sriman Mahaprabhu representam a essência do Srimad Bhagavatam. Os versos glorificam a posição exaltada de Gadadhara Pandita, o companheiro mais íntimo de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Gadadhara Pandita costumava ler o Srimad Bhagavatam em Jagannatha Puri, no templo de Tota Gopinatha. Ele lia, e Sriman Mahaprabhu junto a grandes devotos como Swarupa Damodara e Ramananda Raya eram sua audiência:

nilambhodhi-tate sada sva-virahaksepanvitam bandhavam
srimad-bhagavati katha madiraya sanjivayam bhati yah
srimad-bhagavatam sada sva-nayanasru-payanaih pujayan
gosvami-pravaro gadadhara-vibhur-bhuyat mad-eka-gatih

"Gadadhara Pandita, nas margens do vasto oceano azul, costumava ler o Srimad Bhagavatam para Sri Chaitanya Mahaprabhu, que sofria intensamente de profunda dor interna da saudade Dele mesmo (Krishna). Gadadhara Pandita supria o vinho de Krishna-lila para inebriar Seu amigo aflito, e aliviá-Lo. À medida que lia, lágrimas escorriam de Seus olhos como oferendas de flores às páginas do Srimad Bhagavatam. Que o prazer dessa personalidade brilhante, Gadadhara Pandita, o melhor dos Goswamis, seja meu único objetivo ao escrever este livro".

O titulo deste livro é O Vulcão Dourado do Amor Divino. Sri Chaitanya Mahaprabhu sentia uma intensa dor de separação de Krishna, que queimava como fogo, e foi expressa como o Shikshastakam. Isso é explicado no Prema Dhama Stotram (54):

sri-svarupa-raya-sanga-gambhirantya-lilanam
dvadasabda-vahni-garbha-vipralambha-silanam
radhikadhirudha-bhava-kanti-krsna-kunjaram
prema-dhama-devam-eva-naum-gaura-sundaram

"Ao mergulhar fundo na realidade de Sua própria beleza e doçura, Krishna roubou o humor de Radharani, e Se vestiu com o esplendor brilhante Dela, assim apareceu como Sri Chaitanya Mahaprabhu. Nos últimos doze anos de Seus passatempos, absorveu-Se profundamente em união na separação, e compartilhou Seu coração de sublimes sentimentos com Seus devotos mais íntimos. Erupções vulcânicas de êxtase fluíam de Seu coração agonizante de saudade de Krishna. Suas instruções chamadas Shikshastakam surgiam em Seus lábios como rios dourados de lava. Caio aos pés de Sri Chaitanya Mahaprabhu, O Vulcão Dourado do Amor Divino".

Ele vomitou o fogo da separação dolorosa de Krishna na forma do Shikshastakam. É por isso que Sri Chaitanya Mahaprabhu é comparado a um vulcão dourado e o Shikshastakam à lava divina.

Sri Chaitanya Mahaprabhu nos ensinou que a separação é o mais elevado principio da divindade. A mais intensa concepção de êxtase é a companhia de Krishna, e a mais intensa concepção de dor é a separação de Krishna. Mesmo assim, a dor sentida pela separação de Krishna é muito mais intensa do que o êxtase sentido por Sua companhia.

Sriman Mahaprabhu diz: "Não entende em que situação dolorosa está metido? Todos seus sentidos devem estar destruídos! Senão teria morrido por causa da dor de separação de Krishna. Isso é inconcebível. Pertencemos totalmente a Ele. Ele é tudo para nós, e não podemos vê-Lo. Estamos separados Dele à força. Como podemos suportar"? Bhaktivinoda Thakur disse ainda certa vez: "Não posso mais suportar a separação de Krishna. Posso agüentar apenas por mais três ou quatro dias, depois deverei abandonar este corpo".

Amar a Krishna significa ter de "morrer para viver". O amor divino no começo parece com a lava, morte, mas na realidade é néctar, vida. Muitas pessoas neste mundo ordinário também estão frustradas com o amor. Às vezes, enlouquecem e cometem suicido por não suportarem a dor. Mas a dor que vem da separação de Krishna, mesmo comparada à lava, não é prejudicial como a lava. Kaviraja Goswami explica:

bahye visajvala haya bhitara anandamaya,
krishna-premara adbhuta carita

"A característica maravilhosa do amor divino de Krishna é que, embora pareça lava feroz externamente, internamente é como um doce néctar que satisfaz o coração com a maior alegria".

Sri Chaitanya Mahaprabhu sentiu a maior dor de separação de Krishna, mesmo assim, experimentou a felicidade mais extática dentro do Seu coração. Os sintomas extáticos manifestados por Sri Chaitanya Mahaprabhu nunca foram vistos antes na história universal nem expressos em nenhuma escritura. Encontramos Nele a mais elevada concepção da Realidade última. Isso se explica no meu Prema Dhama Stotram (66):

atma-siddha-sava-lila-purna-saukhya-laksanam
svanubhava-matta-nrtya-kirtanatma-vantanam
advayaika-laksya-purna-tattva-tat-paratmaram
prema-dhama-devam-eva naumi gaura-sundaram

"Essa é a conclusão sempre vitoriosa. A maior concepção da Realidade última também deve ser a maior forma de ananda, êxtase. Sri Chaitanya Mahaprabhu é Krishna, êxtase em pessoa, que saboreia Sua própria doçura e dança em alegria extática. Seu próprio santo nome é a causa de Seu êxtase, expresso como dança, e o santo nome é o efeito do Seu êxtase, expresso como canto. A causa é o efeito. O dínamo cria a energia extática que O faz dançar, e Seu canto distribui esse êxtase a outros".

E assim, em cada palavra de Sua boca de lótus e em cada gesto e movimento de Sua bela figura dourada, Sri Chaitanya Mahaprabhu realiza Seus passatempos extáticos de amor divino.

 

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

O Vulcão Dourado do Amor Divino

de

Sri Srimad Srila
Bhaktirakshaka Sridhar Dev-Goswami Majaraja Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya

 

Parte 1

A Vida de Sri Chaitanya Mahaprabhu

 

Sri Chaitanya Mahaprabhu

Sri Chaitanya Mahaprabhu é a Verdade Suprema Absoluta em sua expressão mais completa e mais dinâmica. A influência de Radharani sobre Krishna O transformou em um devoto, e Ele está na busca por Si mesmo.

Krishna; a personificação do êxtase e da beleza; é louco por saborear Seu próprio néctar interno, e Sua dança indica que Ele é repleto de êxtase. E Seu movimento sankirtana é a distribuição desse êxtase a outros.

 

Sripada Nityananda Prabhu

Pela graça de Nityananda Prabhu, desenvolvemos nossa atração por Sri Gauranga. Nityananda Prabhu nos ajuda a consolidar a base que nos ajuda a progredir adiante. Sua misericórdia às vezes excede a misericórdia de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Ele não permite que mesmo os que querem evitar a Consciência de Krishna escapem. Se alguém diz: "Não quero isso", Nityananda Prabhu não permite. Ele diz: "Não! Você tem que querer. Eu lhe peço intensamente - aceite! Use e será capaz de ver o valor da Consciência de Krishna".

 

Capítulo 1

O

Avatara

Dourado

 

Nos ensinamentos de Karabhajana Rishi (Bhag. 11.5.27), encontramos descrições das encarnações das diversas eras (yugavataras). Menciona-se o yugavatara para a dwapara-yuga da seguinte maneira:

dvapare bhagavan syamah
pita-vasa nijayudhah
srivatsadibhir ankais ca
laksanair upalaksitah

"O Senhor Krishna aparece na dwapara-yuga com a cor de uma nuvem escura de chuva, e usa vestes de tecidos coloridos brilhantes. Ele usa vários adornos, Seu peito porta a marca de Srivatsa, e traz Suas armas particulares". Após a descrição do yugavatara de dwapara-yuga, Karabhajana Rishi descreve o kali-yugavatara. Ele diz:

iti dvapara urv-isa
stuvanti jagad-isvaram
nana-tantra-vidhanena
kalav api tatha srnu

"Ó rei, acabei de descrever as encarnações das eras especificas até dwapara-yuga, para lembrar as pessoas sobre os deveres mais apropriados para suas eras. Elas nos dizem: 'Se agirem dessa forma obterão o melhor beneficio'. Ó rei, após o término de dwapara-yuga, começa a era de Kali. A encarnação da era de Kali é mencionada em várias partes das escrituras, e agora vou te explicar essa informação". (Bhag. 11.5.31).

krsna-varnam tvisa'krsnam
sangopangastra parsadam
yajnaih sankirtana-prayair
yajanti hi su-medhasah

O verso explica o advento de Sri Chaitanya Mahaprabhu em forma disfarçada. O significado normal de krsna-varnam é "de cor negra". Enquanto tvisakrsnam significa "Sua cor não é negra". Acompanhado pelos Seus associados, Ele é adorado pelo processo de sankirtana, o cantar dos santos nomes de Krishna, e aqueles dotados de intelecto aguçado realizarão essa adoração.

Dádiva Dourada do Senhor Dourado

Jiva Goswami explica o significado desse verso em outro verso paralelo de sua autoria:

antah krsnam bahir gauram
darsitangadi-vaibhavam
kalau sankirtanadyaih sma
krsna-caitanyam asritah

"Eu me abrigo em Sri Krishna Chaitanya Mahaprabhu, que é de cor dourada externamente, mas internamente é o próprio Krishna. Nesta era de Kali, Ele mostra Suas expansões enquanto executa o canto coletivo do santo nome de Krishna. Que Ele é negro por dentro significa que Ele é Krishna internamente, que Ele é dourado por fora quer dizer que aceitou o humor de Srimati Radharani. O Senhor Dourado é visto, na era de Kali, acompanhado de Suas expansões, companheiros, e devotos íntimos na realização de sankirtana".

Alguém poderá argumentar que o significado de krsna-varnam é que Sua cor é negra, e Seu brilho também. Mas como é possível? Isso seria redundante. A conjunção das palavras tvisa e akrsnam significa que Sua cor é krsna, negra, mas Seu brilho é akrsnam, não negro. Alguém poderá argumentar ainda: "Não negro não necessariamente significa dourado. Por que deveria significar dourado?" A resposta se encontra no Srimad Bhagavatam.

Certa vez, Vasudeva mandou o astrólogo sacerdote Garga Rishi a Vrindavana para realizar a cerimônia de dar nome para Krishna. Quando Garga Rishi chegou à casa de Nanda Maharaja, explicou que Vasudeva o tinha enviado e disse: "Seu filho já está um pouco crescido, por isso, a cerimônia de dar nome deve ser realizada". Então, citou o seguinte verso:

asan varnas trayo hy asya
grhnato'nuyugam tanuh
suklo raktas tatha pita
idanim krsnatam gatah

"Esse menino apareceu em Suas encarnações passadas com cores diferentes: branca, vermelha e dourada, conforme a era em particular na qual apareceu. Agora, Ele assumiu a, cor negra".

E continuou: "Krishna vem numa cor branca na satya-yuga, vermelha na treta-yuga, e também aparece com a tez dourada. Agora, em dwapara-yuga Ele veio em cor negra". Aqui se encontra referência à cor dourada (pita), pois essa cor sobrou só para a presente era de Kali. Há outra referência sobre essa cor dourada nos Upanishads: yada pasya pasyate rukma varnam: "Krishna, o Brahman Supremo, aparece em uma forma dourada". Rukma varnam quer dizer dourado. E aqui também, não negro quer dizer dourado.

Krishna queria voltar como a encarnação desta era de Kali, bem como cumprir Sua promessa em Vrindavana: "Eu cantarei as glórias das gopis, especialmente de Srimati Radharani. Eu cantarei Seu Nome, Suas glórias, e rolarei na poeira da Terra"! Mas Radharani disse: "Não permitirei que Seu corpo role na poeira da Terra. Eu O cobrirei com Meu brilho". Tanto o humor quanto o brilho de Radharani capturam Krishna quando Ele vem aqui na kali-yuga. Mas isso não acontece em todas as kali-yugas, é só em uma kali-yuga especial.

O yugavatara vem em todos os dias de Brahma e em cada yuga, mas Krishna só aparece em um dia de Brahma, ou seja, a cada 4,3 bilhões de anos. Nessa época, a Personalidade de Deus Original (svayam bhagavan) aparece com Suas moradas, Vrindavana e Navadwip. Krishna e Mahaprabhu não vêm sozinhos, mas com Sua parafernália e companheiros adequados.

Doçura que Se Auto Saboreia

Ele realiza duas funções nesta era de Kali: prega o nama-sankirtana, e o mais importante, assume o humor de Radharani para saborear Sua própria doçura, rasa. Ele é rasa em pessoa. Krishna pensa: "Qual é a intensidade do rasa mais refinado em Mim? Gostaria de experimentar". Mas só os devotos podem sentir esse sabor, por isso Ele assumiu a posição de Radharani para saborear a Si mesmo como Krishna, a morada central, final e perfeita do rasa. Somente Radharani pode saborear o rasa máximo. Assim, Ele tem que assumir a natureza, o humor e o temperamento Dela, a fim de saborear Seu próprio êxtase intrínseco. Esse foi o motivo pelo qual Ele descendeu. Seu primeiro dever foi propagar nama-sankirtana, e Seu dever secundário, interno e íntimo era realizar bhajana-vibhajan, saborear Seu próprio êxtase interno no humor de Radharani. Ele saboreou o grande oceano de união em separação continuamente por doze anos em Puri, junto com Ramananda Raya, Swarupa Damodara, e outros companheiros íntimos. Passou o tempo todo exclusivamente dedicado ao processo de saborear essa doçura nos últimos doze anos.

Essa encarnação é geralmente adorada com sankirtana. Gauranga e Sua parafernália não podem ser adorados sem sankirtana. Ele é o proponente do sankirtana, Ele ama sankirtana e só Se satisfaz com sankirtana. Somente aqueles possuidores de mérito suficiente (sukritivan) O adorarão através desse processo. A massa comum não pode participar dessa campanha. Quem tem boa conduta internamente e boa fortuna pode capturar o âmago da verdade e se ocupar no processo de nama-sankirtana.

O Amor é Supremo

Um cérebro poluído não pode detectar o que é certo ou errado, nem a importância disso. Não pode entender e nem seguir essa linha de pensamento mais elevada. A pessoa deve ser julgada pelo seu ideal, suas aspirações por tópicos superiores. A pessoa é grande se o ideal for grande. Qual é o ideal mais elevado? Amor. Amor é a coisa suprema. É o que existe de mais raro e precioso. O amor e beleza divinos são o plano mais elevado concebido no mundo, aqueles que podem realizar isso são de verdade dotados de um bom intelecto (su-medhasah). E quem possui o ideal superior deve ser considerado de classe superior. Só ele pode entender e praticar sankirtana. Somente ele pode adotar esse caminho, esse processo de satisfazer o Ser Supremo pelo cantar do santo nome do Senhor.

A Encarnação Escondida

Isso é mencionado no Srimad Bhagavatam bem como no Mahabharata e outras escrituras Védicas. Karabhajana Rishi, o último dos nove grandes yogis, nos deu uma pista para entender que Sri Chaitanya Mahaprabhu é a encarnação especial desta era. Ele mencionou a encarnação da era de Kali numa forma mística. Podemos pensar: Por que essa descrição não foi feita de uma forma clara? Muitos avataras são claramente descritos, mas quando o Srimad Bhagavatam descreve Sri Chaitanya Mahaprabhu como a encarnação da era de Kali, faz de uma forma mística. A solução está nos ensinamentos de Prahlada Maharaja que diz: "Ó Senhor, um de Seus nomes é Triyuga, que significa aquele que encarna em três eras - Satya, Treta e Dwapara - mas não em Kali. Por quê? A encarnação da era de Kali é disfarçada (channa kalau yad abhavas tri-yugo'tha sa tvam)". Aqui encontramos a chave para essa forma mística de representar Sri Chaitanya Mahaprabhu para o círculo dos afortunados e inteligentes (su-medhasah); pessoas comuns podem não ter nenhuma chave de acesso.

dhyeyam sada paribhava-ghnam abhista-doham
tirthaspadam siva-virinci-nutam saranyam
bhrtyarti-ham pranata-pala bhavabdhi-potam
vande maha-purusa te caranaravindam

"Ó Mahaprabhu, Seus pés de lótus são o objetivo mais elevado da meditação, pois não somente destroem a dor da existência material, como concedem a satisfação maior para todas as almas que se abrigam sob eles. Seus pés de lótus purificam até mesmo todos os santos e locais sagrados. O Senhor Shiva e o senhor Brahma anseiam pelo abrigo em baixo de Seus pés de lótus. Ó Mahaprabhu, o Senhor abriga todos aqueles que simplesmente se prostram perante Você. O Senhor alivia todas as aflições de Seus servos rendidos.

Podemos cruzar o oceano de misérias materiais no grande navio de Seus pés de lótus. Ó Mahaprabhu, caio prostrado a Seus pés de lótus".

Após mencionar a encarnação do Supremo para a era de Kali, o Srimad Bhagavatam subitamente começa essa canção em adoração ao yugavatara, Sri Chaitanya Mahaprabhu. O Bhagavatam cantou com voz magnífica a prece desse guia de kali-yuga. A prece segue o verso que menciona o avatara de kali-yuga. Krishna-varnam significa aquele que sempre descreve Krishna, que tem sempre em Seus lábios as palavras: "Krishna, Krishna, Krishna". Outro significado dessa expressão é: "Aquele que é Krishna em pessoa, mas cujo brilho não é negro". Se olharmos profundamente, veremos que por trás de Seu brilho dourado está o corpo negro de Krishna. Ele veio a este plano com Sua parafernália pessoal, só se serve a Ele através do sankirtana, som divino em canto de massa. Podemos reconhecer Sua posição divina através desses sintomas.

Sri Chaitanya Mahaprabhu é uma encarnação oculta. Ele vem disfarçado. Tal avatara é adorado pelos possuidores de intelecto divino. E assim, o Srimad Bhagavatam descreve a personalidade sem igual, Sri Chaitanya Mahaprabhu, numa forma mística e depois proclama Sua nobreza e grandeza.

O Srimad Bhagavatam explica: "A mesma personalidade que apareceu como Ramachandra e Krishna, apareceu novamente. Ele veio para o dirigir à real satisfação da vida. Ele derrama o doce néctar para o beneficio de todos. Medite somente Nele que todos seus problemas terminarão. Ele é o agente que purifica todos os locais de peregrinação e os grandes santos pelo Seu toque, Ele traz o que há de mais elevado no mais alto plano pelo Seu sankirtana. Até mesmo Brahma e Shiva, desnorteados por Sua nobre dádiva, começam a glorificá-Lo. Eles anseiam ardentemente pelo abrigo sob Seus pés de lótus em rendição. As dores de todos que começarem a servi-Lo serão removidas, e as necessidades de suas almas serão satisfeitas. Ele cuidará daqueles que se abrigarem Nele, e lhes dará proteção, bem como tudo que possam precisar. Este mundo é um lugar onde a mortalidade governa, onde experimentamos constantemente as mudanças indesejáveis de repetidos nascimentos e mortes, é uma área onde ninguém quer viver; mas virá um grande barco para nos resgatar e nos tirar desta situação tão desagradável. Caiamos aos pés dessa grande personalidade que vem para trazer o néctar mais sublime".

O Srimad Bhagavatam continua:

tyaktva su-dustyaja-surepsita-rajya-laksmim
dharmistha arya-vacasa yad agad aranyam
maya-mrgam dayitayepsitam anvadhavad
vande maha-purusa te caranaravindam

"Ó Senhor Supremo, Você renunciou à deusa da fortuna e à grande opulência dela, que é extremamente difícil de abandonar, e é almejada até mesmo pelos deuses. Foi para a floresta para honrar a maldição do brahmana, a fim de estabelecer os princípios da religião perfeitamente. Veio procurar as almas pecaminosas que perseguem prazeres ilusórios e lhes deu Seu serviço devocional para liberá-las. Ao mesmo tempo, está ocupado na busca de Si mesmo, na busca de Sri Krishna: Realidade, o Belo".

Srila Visvanatha Chakravarti Thakura explicou que embora esse verso aparentemente se refere ao Senhor Ramachandra, que deixou Seu reino e foi para a floresta com Sitadevi para executar os deveres designados por Seu pai, também se refere a Sri Chaitanya Mahaprabhu. Visvanatha Chakravarti Thakura extraiu o significado interno desse verso e o aplicou no caso de Chaitanya Mahaprabhu. tyaktva su-dustyaja-surepsita-rajya-laksmim significa que Ele renunciou à prosperidade real, que é difícil de se abandonar. Geralmente, encontramos esse fato no caso do Senhor Ramachandra, mas Visvanatha Chakravarti Thakura diz que surepsita-rajya-laksmim significa a valiosa companhia devocional de Vishnupriya-devi. Talvez isso possa não parecer algo excepcional materialmente, mas a dedicação que Vishnupriya tinha em Seu coração por Sriman Mahaprabhu é maior que qualquer padrão imperial. E Ele teve de abandonar isso. Tal padrão de sacrifício e serviço não é encontrado nem mesmo na maravilhosa sociedade dos deuses. Ele teve que ignorar essa atitude de serviço amoroso de Vishnupriya.

A Maldição do Brahmana

O verso menciona a maldição de um brahmana. Esse brahmana disse a Sriman Mahaprabhu: "Eu quero participar dos Seus kirtanas noturnos, nos quais Você saboreia krsna-lila, mas as portas estão sempre fechadas". Quando Sriman Mahaprabhu realizava kirtana e saboreava o vraja-lila de Krishna, fazia-o atrás de portas fechadas e em altas horas da noite. Mas esse brahmana se considerava muito religioso e qualificado, pois subsistia apenas por tomar leite sem mais nada, assim ele disse: "Eu preciso entrar nesse kirtana. Eu não como nada além de leite, por que não me permitem"? Sri Chaitanya Mahaprabhu respondeu: "Beber leite não é qualificação para entrar na consciência de Krishna". O brahmana replicou: "Então, eu O amaldiçôo a perder Sua vida familiar"! Mahaprabhu disse: "Está bem", e aceitou a maldição. Mais tarde Ele aceitou sannyasa e foi atrás das pessoas mal guiadas por Mayadevi a fim de salvá-las. Ao mesmo tempo, Ele aceitou o humor de Srimati Radharani, mesmo por ser Krishna. Foi por esses dois motivos que Ele abandonou Sua vida aparentemente mundana; Ele agiu para o bem-estar da sociedade, e após terminar esse trabalho, passou os próximos doze anos a saborear a aspiração mais íntima de Srimati Radharani e a procurar por Sua própria doçura interior. Foi isso que Ele veio mostrar ao mundo. O Srimad Bhagavatam proclamou o magnânimo aparecimento de Sri Chaitanya Mahaprabhu numa forma mística.

 

Capítulo 2

 

A

Encarnação

Misteriosa

 

Sri Chaitanya Mahaprabhu foi viver em Jagannatha Puri após aceitar sannyasa. Lá, Ele converteu o maior erudito da época, Sarvabhauma Bhattacharya. O grande erudito Sarvabhauma Bhattacharya questionou seu cunhado Gopinatha Acharya sobre o avatara da presente era de kali-yuga. Gopinatha viveu em Navadwip e era seguidor de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Sarvabhauma tinha começado a glorificar Sri Chaitanya Mahaprabhu do seu jeito, como se Ele fosse um belo homem e um grande erudito.

Ele disse: "Sinto uma atração muito forte por Ele. Mas não achei muito aconselhável que Ele tivesse aceitado sannyasa, a ordem de vida renunciada, tão jovem ainda. Ele tem uma vida muito longa pela frente, como será capaz de manter a dignidade da vida de sannyasi, uma vida de renúncia? Não posso cruzar os braços. Gosto muito desse rapaz. Vou tentar ajudá-Lo como um guardião, para que Ele não perca Seu prestígio ao abandonar sannyasa, atraído pelo encanto dos prazeres mundanos".

Gopinatha não pôde tolerar mais toda essa conversa de guardião. Ele disse a Sarvabhauma: "Esse jovem belíssimo e atraente que é muito erudito, atraiu sua atenção, e quer ser Seu guardião para manter a pureza da vida Dele. Acha que tem de ajudá-Lo? Que quer dizer com tudo isso? Não sabe que Ele é realmente a encarnação do Supremo para esta era? Ele é o avatara de kali-yuga; Ele inaugurou o yuga-dharma de nama-sankirtana em Navadwip, e Sua aparição é mencionada nas escrituras". Sarvabhauma replicou: "Não, não! Não está falando com uma pessoa comum. Não ache que pode dizer qualquer coisa que bem entende e eu vou aceitar. Sou uma casca de noz dura de quebrar. Que está dizendo? Não existe kali-yuga-avatara. Um dos nomes de Vishnu mencionado no visnu-sahasra-nama do Mahabharata é Triyuga, o Senhor que aparece em três eras apenas. Isso significa que o Senhor não tem encanação em kali-yuga exceto Kalki, que é uma encarnação de passatempo e não yugavatara, a encarnação da era". Gopinatha replicou: "Você se acha tão erudito, embora tenha estudado todas as escrituras, e é tão orgulhoso de seu conhecimento, ainda assim não tem conhecimento sobre o Mahabharata e Srimad Bhagavatam que são as escrituras principais dos seguidores dos princípios eternos da religião".

"Não Homem - Mas Deus"

Nisso, Gopinatha Acharya citou partes do Srimad Bhagavatam e Mahabharata (krsna-varnam tvisa'krsnam, suvarna varna hemango). Assim, confirmou seu ponto: "Encontramos aqui o avatara direto para a era de Kali. Ele apareceu para propagar nama-sankirtana. Ele não é um homem, mas o Senhor Supremo, Krishna em pessoa". Sarvabhauma disse: "Não, não, vá embora, cuide da sua vida. Nem pense em me instruir". E assim eles argumentaram.

Algum tempo depois, Sarvabhauma Bhattacharya disse a Sri Chaitanya Mahaprabhu: "Gostaria de Lhe ensinar filosofia Vedanta. para que possa manter o padrão de Sua renúncia. Vou Lhe ensinar que este mundo é nada e assim não sentirá nenhuma atração para entrar na vida mundana". Sri Chaitanya Mahaprabhu disse: "Sim, você é Meu guardião. Farei tudo que disser. Virei aprender filosofia Vedanta com você no horário que for conveniente".

Gopinatha Acharya disse a Sri Chaitanya Mahaprabhu: "Sarvabhauma fala assim pois não conhece Sua identidade verdadeira". Sriman Mahaprabhu respondeu: "Por que está contra ele? Ele é Meu guardião. Ele foi colega de escola do Meu pai e sente muito afeto por Mim. Ele se assume como Meu guardião e se preocupa com Meu bem-estar por afeto. Não vejo nenhum mal nisso".

Sete Dias de Silêncio

Poucos dias depois, Sri Chaitanya Mahaprabhu começou a ouvir o Vedanta de Sarvabhauma Bhattacharya. À medida que Sarvabhauma falava, Ele silenciava como um menino bem comportado, como se ouvisse numa atitude submissa. Mas após ensinar Sri Chaitanya Mahaprabhu por sete dias, Sarvabhauma ficou meio duvidoso. Ele pensou: "O que acontece? Sou tão erudito em Vedanta e lógica, dou o melhor de mim com toda minha inteligência, para apresentar a Ele o significado profundo do Vedanta, mas não obtenho nenhuma resposta. Ele fica quieto apenas a ouvir meu discurso como se fosse surdo-mudo. Não posso afirmar que Ele não entende, pois possui intelecto aguçado. Estou certo disso; ainda assim, Ele não manifestou nenhuma apreciação ou resposta até agora. Ele não faz nenhuma pergunta nem indica se entende ou não - nenhum sinal. Que estou fazendo então"? Ele não pôde agüentar mais, e perguntou diretamente ao Senhor: "Expliquei a Você o significado profundo do Vedanta por mais de sete dias. Muitos sannyasis vêm a mim para aprender sobre o Vedanta, mas Você não tem nenhuma pergunta sobre o que falei, sobre minha explicação? Mantém um silêncio estranho e maravilhoso. Qual é o motivo"?

Erudição Ateísta

Aí, Sri Chaitanya Mahaprabhu Se revelou. Ele disse: "Sarvabhauma, o que explica é baseado na filosofia de Shankara, mas Eu ouvi que Shankara escondeu o verdadeiro significado do Vedanta por ordem do Senhor. Seu autor, Vyasadeva, é uma pessoa plenamente teísta, que preparou o Vedanta, mas o que você diz é totalmente baseado em erudição ateísta".

Sarvabhauma era uma pessoa muito inteligente. Ele compreendeu: "Ele quer me dizer numa forma muito gentil, que tudo o que expliquei é falso. Trabalhei atenciosamente para explicar Vedanta ao máximo de minha capacidade nos últimos sete dias, e agora Ele mostra Sua verdadeira face e diz que o que expliquei é falso. Como Ele pôde dizer isso?" Mesmo assim, Sarvabhauma com alguma hesitação perguntou educadamente a Sriman Mahaprabhu: "Você disse que tudo o que expliquei nos últimos sete dias é sem substância e irreal. Se é assim, será que pode dar o significado adequado? Se é tudo impróprio e falso, então qual é o verdadeiro significado do Vedanta"? Sri Chaitanya Mahaprabhu respondeu humildemente: "Se Me ordena para explicar o Vedanta, tentarei. Os sutras ou códigos do Vedanta brilham por si próprios. Eles são auto-evidentes. Mesmo a própria leitura dos sutras conduz a Parabrahman, Krishna". Sri Chaitanya Mahaprabhu começou com essa introdução. Ele disse que o Srimad Bhagavatam é a verdadeira explicação e comentário sobre o Vedanta. O Garuda Purana diz:

artho'yam brahma sutranam
bharatartha-vinirnayah
gayatri bhasya rupo 'sau
vedarthah paribrimhitah

"O Srimad Bhagavatam representa o verdadeiro significado do Vedanta-sutra. O Mahabharata é um épico de cem mil versos, a grande História do mundo. É muito difícil extrair seu significado verdadeiro, apesar disso, o Srimad Bhagavatam veio para trazer seu significado verdadeiro. O Gayatri mantra é a mãe de todo conhecimento Védico. O Srimad Bhagavatam apresenta a essência do Gayatri numa forma plenamente madura. Também no Srimad Bhagavatam se encontram as verdades suplementares dos Vedas". Por isso, o Vedanta tem de ser explicado na linha da verdade expressa no Srimad Bhagavatam. O verdadeiro significado só pode ser entendido assim.

O Anseio das Almas Liberadas

Quando Sriman Mahaprabhu mencionou o Srimad Bhagavatam, Sarvabhauma, como um grande pandita, não pôde negar sua validade. Ele disse: "Sim, eu também gosto do Srimad Bhagavatam. Gosto de um belíssimo verso em especial". Então, Sarvabhauma para recuperar seu prestígio começou a explicar o verso atmarama do Srimad Bhagavatam (1.7.10):

atmaramas ca munayo
nirgrantha apy urukrame
kurvanty ahaitukim bhaktim
ittham-bhuta guno harih

"Até mesmo as almas liberadas totalmente satisfeitas no eu sentem uma atração irresistível pelas qualidades super-excelentes de Krishna e se rendem a Ele com devoção imaculada".

Sarvabhauma explicou o verso em nove maneiras diferentes enquanto Sri Chaitanya Mahaprabhu, como antes, ouviu silenciosamente. Sarvabhauma pensou que havia recuperado sua posição até certo ponto quando terminou sua explicação. Mas, por cortesia, perguntou a Sri Chaitanya Mahaprabhu: "Está satisfeito com essa explicação? Se pode dar alguma luz a mais para esse verso, ouvirei". Sri Chaitanya Mahaprabhu disse: "Se Me ordena, tentarei". Então, Ele deu dezoito explicações diferentes para o verso, sem contar com as nove dadas por Sarvabhauma.

Sarvabhauma, enquanto ouvia a explicação de Sri Chaitanya Mahaprabhu, percebeu que perdia terreno. Seu orgulho estava derrotado. Ele pensou abismado: "Esse jovem, esse rapazinho, não é uma pessoa comum. Nenhum intelecto comum pode refutar meus argumentos. Ele deu dezoito explicações maravilhosas sobre o verso, e deixou de lado todas as minhas tentativas de explicá-lo. O que é isso? Essas explicações consistentes, irresistíveis, devocionais e belas ultrapassaram todas que explanei com grande energia e esforço. Nenhum ser humano pode ultrapassar minhas explicações. Nenhum intelecto humano pode superar o meu. É outro tipo de explicação. Completamente abrangente. Mas vem desse rapazinho? O que está acontecendo"?

Revelação Mística

Ele perdia a autoconfiança gradualmente e ficou derrotado, Aí, lembrou-se de quando Gopinatha Acharya disse que Sri Chaitanya Mahaprabhu não era um ser humano e pensou: "Não é possível que um ser humano explique as coisas desse jeito. Isso é algo sobrenatural". Então Sri Chaitanya Mahaprabhu revelou a Sarvabhauma Sua posição espiritual como Narayana e Krishna combinados. Sarvabhauma viu tudo isso em transe e caiu aos pés do Senhor, quase que perdeu a consciência.

Quando despertou do transe, viu que o rapaz continuava sentado como um aluno com grande humildade. Então, Sri Chaitanya Mahaprabhu perguntou: "Posso ir por hoje"? Sarvabhauma disse: "'Sim, pode ir agora". O Senhor foi embora e Sarvabhauma permaneceu lá. Ele se recobrou após algum tempo e começou a pensar: "O que acabei de ver? Narayana de quatro braços e depois Krishna a tocar flauta! Não fui derrotado por um ser humano, esse é o meu consolo". Sarvabhauma se tornou um homem mudado e compôs dois versos:

vairagya-vidya-nija-bhakti-yogasiksartham
ekah purusah puranah
sri-krsna-caitanya-sarira-dhari
krpambudhir yas tam aham prapadye

"Eu me rendo aos pés de lótus de Sri Krishna Chaitanya Mahaprabhu, que é um oceano de misericórdia. Ele é a Personalidade de Deus Original, Krishna, e veio para nos ensinar o verdadeiro significado da renúncia e da devoção a Ele".

kalan nastam bhakti-yogam nijam yah
praduskartum krsna-caitanya-nama
avirbhutas tasya padaravinde
gadham gadham liyatam citta-bhrngah

"Que a abelha da minha mente mergulhe fundo nos pés de lótus de Sri Krishna Chaitanya Mahaprabhu, que é a Suprema Personalidade de Deus, Krishna em pessoa. Ele apareceu para reviver o caminho da devoção imaculada, que foi quase perdida devido à ação do tempo".

Um Sabor Supremo

Os dois versos foram compostos por Sarvabhauma Bhattacharya para indicar que Sri Chaitanya Mahaprabhu é o Senhor Supremo em pessoa. No dia seguinte, logo cedo na manhã, Sriman Mahaprabhu foi até a casa de Sarvabhauma com algum prasadam do templo de Jagannatha, enquanto ele ainda dormia. E gritou bem alto: "Sarvabhauma - que prasadam maravilhoso Eu tenho aqui! É um sabor extraordinário. Por favor, coma. Eu vim até aqui para trazer para você este prasadam". Sarvabhauma se levantou quando o Senhor lhe ofereceu o prasadam, e não pôde fazer nada além de comer sem nem mesmo ter lavado a boca. Um brahmana-pandita geralmente logo cedo faz primeiro a higiene bucal, toma banho, oferece várias preces e só depois é que vai comer prasadam. Mas o que Sarvabhauma podia fazer quando Sri Chaitanya Mahaprabhu veio pessoalmente lhe oferecer prasadam com Suas próprias mãos? Ele tinha que aceitar aquele prasadam. Sri Chaitanya Mahaprabhu disse: "Nós já experimentamos o sabor de tantas coisas antes, tal como ghi, arroz, doces e temperos. Nós já sabemos o sabor que têm, mas este é maravilhoso. Tocou os lábios de Krishna em pessoa. É extraordinariamente maravilhoso e saboroso". Sarvabhauma começou a comer o prasadam e pronunciou alguns mantras:

suskam paryusitam vapi
nitam va dura-desatah
prapti-matrena bhoktavyam
natra kala-vicarana

"Deve-se comer o mahaprasada de Sri Krishna tão logo é servido, sem consideração a tempo ou local, mesmo que esteja seco, passado, ou trazido de um país distante".

na desa-niyamas tatra
na kala-niyamas tatha
praptam annam drutam sistair
bhoktavyam harir abravit

"O prasadam de Sri Krishna deve ser comido por cavalheiros logo que servido, sem hesitação. Não existem princípios reguladores referentes a tempo e local. Essa é a ordem da Suprema Personalidade de Deus".

"Hoje, Eu Conquistei o Mundo"

Ele comeu o prasadam, e o Senhor e Seu servo se abraçaram e começaram a dançar em êxtase. Sintomas extáticos apareciam nos dois, à medida que dançavam. Eles transpiravam, tremiam e derramavam lágrimas. Sri Chaitanya Mahaprabhu disse, absorto em amor extático: "Hoje, Eu conquistei o mundo inteiro, converti um erudito como Sarvabhauma Bhattacharya. Agora ele tem tanta fé no mahaprasada, que comeu o prasadam mesmo sem ter executado rituais Védicos. Minha missão foi cumprida"!

Daquele dia em diante, Sarvabhauma Bhattacharya não conhecia nada além dos pés de lótus de Sri Chaitanya Mahaprabhu, e só conseguia explicar as escrituras com a conclusão da devoção. Gopinatha Acharya começou a dançar e aplaudir, ao ver que Sarvabhauma Bhattacharya tinha se tornado seguidor de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Ele disse: "Bem, Sarvabhauma, o que você acha agora"? Sarvabhauma respondeu: "Gopinatha, você é o meu verdadeiro amigo, foi por sua graça que recebi a misericórdia de Sri Chaitanya Mahaprabhu".

 

Capítulo 3

 

O

Amigo

dos Caídos

 

Embora seja obrigação da justiça procurar qualificações, a misericórdia não tem tais limites. A misericórdia divina não liga para nenhuma qualificação e está sempre pronta para compensar os fracos e desqualificados. Só existe um requisito: Nossa ansiedade sincera em receber tal misericórdia. O Sri Chaitanya Charitamrita (Madhya 8.70) diz:

krsna-bhakti-rasa-bhavita matih
kriyatam yadi kuto'pi labhyate
tatra laulyam api mulyam ekalam
janma-koti-sukrtair na labhyate

"Não se pode obter serviço devocional puro a Krishna mesmo se executar atividades piedosas por milhões de nascimentos. Ele só pode ser comprado por um único preço: Ansiedade intensa. Deve-se comprá-lo imediatamente onde quer que esteja disponível". Nenhuma qualificação da vida passada vai ajudar a obtenção da consciência de Krishna; somente avidez e fé são importantes.

E, qual é o efeito da consciência de Krishna?

bhidyate hrdaya-granthis
chidyante sarva-samsayah
ksiyante casya karmani
mayi drste'khilatmani

"Nossa aspiração interna por rasa, êxtase, está enterrada no coração, e o coração está preso e selado. Mas ouvir e cantar as glórias de Krishna quebra o selo do coração, o coração desperta e se abre para receber Krishna: O reservatório de prazer, êxtase em pessoa (raso vai sah, akhila rasamrta murtih)". (Bhag. 1.2.21)

O Coração Deseja Êxtase

A preocupação do nosso coração é com êxtase, graça e doçura. E isso é sentido pelo coração, não pelo cérebro, por isso, o coração é mais importante. O próximo efeito é sentido no plano do conhecimento. A suspeita some quando se obtém doçura divina (rasa-varjam raso'pi asya param drstva nivartate). Todas as dúvidas são dissipadas quando se sente o sabor do verdadeiro êxtase (rasa). O coração fica capturado pelo sabor da consciência de Krishna, e quando o coração está capturado, o êxtase de amor ao Supremo, prema, começa a fluir. O coração satisfeito diz: "É isso que eu sempre procurei"! O cérebro pensa em seguida: "Sim, não pode haver dúvida, esse é o objetivo mais elevado de nossas buscas. Dissolva todo o resto". O coração diz: "Obtive prema, amor divino - o que existe de mais sublime! Pare todos trabalhos de agora em diante". Então, o karma fechará todos seus escritórios. O primeiro resultado é que o coração desperta quando entra em contato com a consciência de Krishna. O cérebro aprova quando o coração está capturado, e nosso karma energizado em direção errada pára. Consciência de Krishna é a verdadeira riqueza do coração.

A característica da misericórdia divina é se expandir sem levar em conta nenhuma lei. A única consideração é nossa ânsia em aceitá-la. A misericórdia é oferecida assim: "Você quer"? Se simplesmente concordarmos: "Sim, é maravilhoso e muito saboroso", aí poderemos tê-la. Se nossa prece for genuína, não precisaremos de mais nada. É uma transação simples. Se queremos, obtemos. A consciência de Krishna é muito simples. Se a pessoa é qualificada ou desqualificada não é importante. Qualquer um que simplesmente a deseja, vai tê-la.

O que vai ser daqueles que não querem esta dádiva divina? Sri Chaitanya Mahaprabhu distribuiu misericórdia especial para eles através de Seu mais magnânimo propagandista. Sripada Nityananda Prabhu não permite que escapem nem mesmo os que querem evitar a consciência de Krishna. Se alguém diz: "Eu não quero isso", Nityananda Prabhu não vai permitir. Ele dirá: "Não! Você tem que querer. Eu lhe peço insistentemente - aceite! Use-a e será capaz de sentir o valor da consciência de Krishna".

Um comerciante hábil distribui amostras de seu produto aos clientes para conquistar o mercado, ele diz: "Pegue um grátis! Não precisa pagar, estou distribuindo. Experimente e aprecie - depois, compre"! E todos acabam por comprar mesmo.

"Por Favor, Aceite Gauranga!"

Nityananda Prabhu, de forma semelhante, viajou pela Bengala fazendo Seu humilde apelo. Nítyananda Prabhu batia à porta de Seus clientes, caia a seus pés e implorava: "Por favor, aceite! Não Me rejeite, não Me mande embora. Por favor, faça o que digo. Volte toda sua atenção para Gauranga que obterá beneficio muito além da expectativa". Ele derramava lágrimas, rolava no chão da porta, e dizia: "Está hesitante em aceitar, mas Eu imploro, aceite! Confie em Mim. Por favor, aceite Gauranga"! Nityananda Prabhu costumava vagar desse jeito pelas duas margens do Ganges, andava daqui para lá, e pregava sobre Sri Chaitanya Mahaprabhu.

Nityananda Prabhu só conhece Gauranga. Ele é representado no krsna-lila como Baladeva. Baladeva realizou o rasa-lila aparentemente, mas no coração Ele organizava o rasa-lila para Krishna. Os peritos da devoção vêem como Sua característica principal o fato de estar sempre dedicado a Krishna. Senão Ele não seria Baladeva. Ele não tem aspirações para desfrute pessoal, cada átomo de Seu corpo está sempre ansioso em fazer arranjos para o prazer de Krishna, Similarmente, cada átomo do corpo de Nityananda Prabhu é uma substância transcendental consciente. E o objetivo de cada átomo de Seu corpo é exclusivamente o serviço e satisfação de Sri Chaitanya Mahaprabhu.

"Desça do Trono"!

Certa vez, a mãe de Mahaprabhu, Shachidevi, sonhou que Krishna e Balarama estavam sentados num trono, e Nityananda Prabhu dizia a Baladeva: "Desça do Seu trono! Seus dias terminaram. Agora, Meu Senhor Gauranga será empossado". Baladeva recusou: "Não, Eu tenho o Meu Senhor - Krishna". Eles brigaram, mas Nityananda Prabhu era mais forte e tirou Baladeva do trono, dizendo: "Seu tempo acabou. Agora é a vez do Meu mestre, Gauranga. Você é um transgressor, um usurpador - tem que descer". Assim, Baladeva não pôde derrotar Nityananda, que O tirou do trono.

Essa é a natureza da relação de Nityananda Prabhu com Sri Chaitanya Mahaprabhu. Ele não tem nada pessoal, tudo para Ele é Sri Chaitanya Mahaprabhu. Nityananda Prabhu está para Sri Chaitanya Mahaprabhu assim como Baladeva está para Krishna. O objetivo do advento de Sriman Mahaprabhu é distribuir o serviço devocional de Vrindavana o mais generosamente possível.

Por outro lado, Nityananda Prabhu costumava cantar:

bhaja gauranga, kaha gauranga laha gauranger nama,
yei jana gauranga bhaje sei amara prana

"Adore Gauranga, fale sobre Gauranga, cante o nome de Gauranga. Quem quer que adore Sri Gauranga é Minha vida e alma".

Nityananda Prabhu deu o máximo de Si para fazer com que as pessoas em larga escala aceitassem Sri Chaitanya Mahaprabhu. O que dizia Ele? – "Venha direto para a campanha de Sri Chaitanya e seguramente alcançará Vrindavana".

É claro que Navadwip, a morada de Sri Chaitanya Mahaprabhu, não é menos valiosa do que Vrindavana, a morada de Krishna. O mesmo rasa encontrado em Vrindavana está presente em Navadwip numa outra forma. Alguns devotos têm uma atração especial por vrndavana-lila e outros, por navadvípa-lila, um terceiro grupo representa os dois campos, mas Navadwip é mais generosa. Os passatempos de Krishna em Vrindavana estão confinados a um círculo confidencial, mas em Navadwip, esses passatempos são distribuídos. Gaura-lila é mais generoso do que krsna-lila.

Krishnadasa Kaviraja Goswami explica sua concepção sobre a diferença entre krsna-lila e gaura-lila no Chaitanya-charitamrita (Madhya 25.271):

krsna-lila amrta-sara, tara sata sata dhara,
dasa-dike vahe yaha haite
se caitanya-lila haya, sarovara aksaya,
mano-hamsa caraha' tahate

"Não há dúvida de que o sabor mais nectáreo de rasa se encontra em krsna-lila. Mas o que é gaura-lila? O néctar de krsna-lila não fica confinado a um círculo restrito em gaura-lila, mas é distribuído por todos os lados. É como se centenas de córregos fluíssem dos dez lados do lago nectáreo de krsna-lila".

Nosso maior anseio deve ser alcançar o serviço a Srimati Radharani, mas, de início, devemos nos aproximar de Sri Nityananda Prabhu através de Sua representação manifesta, o Guru. Nityananda Prabhu consolida a base que nos fará progredir na devoção. Progresso rápido sem uma base sólida conduz à uma reação negativa, portanto, a misericórdia de Nityananda Prabhu é nossa necessidade primordial. Essa aproximação vai culminar no serviço à Srimati Radharani (nitaiyer-karuna habe braje radha-krsna pabe).

Filosofia Gaudiya Vaishnava significa reinstalar-se como servo do servo ao extremo. Nosso propósito não é nos tornarmos unos com Krishna - receber serviço - queremos prestar serviço. A parte predominada da Verdade Absoluta é potência negativa - a energia que serve - e a parte predominante recebe o serviço. Nosso melhor interesse será obtido quando alcançarmos nossa posição na linha dos servidores da parte negativa predominada, conforme nossa natureza constitucional, sem nos considerarmos unos com a parte positiva predominante.

Despertamos atração por Sri Gauranga pela graça de Nityananda Prabhu, quando recebemos a graça de Sri Gauranga, obtemos satisfação plena no mais alto estágio. Essa é a melhor forma de se aproximar de Radha-Govinda. Se tentarmos alcançar Radha-Govinda de alguma outra maneira, a tentativa será naturalmente artificial e defeituosa. Será extremamente difícil nos aproximarmos de Radha-Govinda diretamente, ao evitar Sri Gauranga.

Um Investimento em Navadwip

Por isso, devemos investir toda nossa energia no serviço a Gauranga. Aí, veremos nossa elevação automaticamente ao mais alto nível. Prabodhananda Sarasvati Thakura ora (Sri Chaitanya Chandramrita, 88):

yatha yatha gaura padaravinde
vindeta bhaktim krta punya rasih
tatha tathotsarpati hrdy akasmat
radha padambhoja sudhambhurasih

À medida que nos devotamos aos pés de lótus de Sri Gauranga, alcançamos automaticamente o serviço nectáreo à Srimati Radharani em Vrindavana. Um investimento em Navadwip Dhama leva a pessoa automaticamente para Vrindavana. Como irá até lá, será desconhecido para ela. Mas os afortunados investem tudo no serviço a Gauranga. Se fizerem isso, descobrirão que tudo foi oferecido automaticamente, aos pés divinos de Srimati Radharani. Ela os aceitará em Seu serviço confidencial e os ocupará, ao dizer: "Ó, você tem uma boa recomendação de Navadwip, vou designá-lo imediatamente para este serviço". Srimati Radharani está inclusa na forma de Gauranga junto com o elemento da magnanimidade. Não se pode considerar nenhum sensualismo egoísta nos passatempos de Sri Gauranga, pois Ele aparece como sannyasi e devoto.

É claro que se analisarmos Sri Chaitanya Mahaprabhu, veremos que é Krishna disfarçado de Radharani. Os filósofos impersonalistas afirmam que, quando o negativo se combina com o positivo, tornam-se uma unidade não-diferenciada, mas a filosofia Vaisnava diz que quando os aspectos positivo e negativo do Supremo são combinados, não há perda de personalidade. Ao contrário, o positivo com a aparência do negativo é convertido e começa a procurar por Si mesmo no humor do maior sondador. Quando o positivo e negativo combinam, de acordo com o Vaishnavismo, não entram em equilíbrio, muito pelo contrário, seu caráter dinâmico é mantido A combinação de Radha e Govinda é Sri Gauranga, e podemos nos atrair a Sri Gauranga pela graça de Nityananda Prabhu.

Misericórdia Plenamente Abrangente

A misericórdia de Nityananda Prabhu às vezes excede a misericórdia de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Mahaprabhu algumas vezes não pode aceitar certas almas caídas para não criar um mau precedente - Ele tem que considerar o status e outras coisas. A misericórdia do Senhor Nityananda não se preocupa com nenhuma circunstância desfavorável. Sua misericórdia é esbanjadora e quase cega. Ele não discrimina os diversos níveis de pecadores. Sua misericórdia é plenamente abrangente. Sri Chaitanya Mahaprabhu não pode desprezar uma recomendação Dele. Nityananda Prabhu abriga até mesmo os rejeitados por Sri Chaitanya Mahaprabhu, que gradualmente terá de aceitá-los. Portanto, a graça de Nityananda é maior tanto em magnitude quanto em circunferência, esse é o nosso consolo, pois mesmo as almas mais caídas podem obter a meta suprema por Sua misericórdia.

Sri Chaitanya Mahaprabhu disse certa vez a Seus seguidores: "Mesmo se encontrarem Nityananda Prabhu com uma garota do mais baixo nível, a beber vinho num bar, devem saber que ainda assim, Ele está acima de tudo isso. Aparentemente Ele pode estar ocupado em atividades baixas, mas nunca está implicado. Ele pode parecer estar ligado a tantas atividades inferiores, mas saibam que Ele é reverenciado pelo criador do universo, senhor Brahma, e outros devotos exaltados. A misericórdia de Nityananda Prabhu é tão poderosa, que quem usar um pedaço de Sua roupa interior respeitosamente, será salvo de todas perturbações dos sentidos". Portanto, oremos: "Que minha mente possa aderir em Seus pés sagrados para sempre; presto minhas reverências a Sri Nityananda Prabhu".

Engolido por Maya

Sri Chaitanya Mahaprabhu aceitou sannyasa para o beneficio das almas engolidas por maya, Ele correu atrás das almas caídas para livrá-las da ilusão, dando-lhes o santo nome de Krishna, e Nityananda Prabhu ia atrás Dele como se fosse Sua sombra onde quer que Ele fosse. Ele se rendeu completamente e se identificou com a causa de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Portanto, devemos nos prostrar a Nityananda Prabhu. Sri Chaitanya Mahaprabhu Se concentrou em saborear a doçura do lila de Radha-Govinda, ao mergulhar fundo nessa realidade, e, ao mesmo tempo, queria liberar todas almas cujos corações foram devorados pelas noções falsas de renúncia e exploração; Ele ordenou a Nityananda Prabhu: "Vá para a Bengala e tente liberá-los - dê-lhes o amor divino de Radha e Krishna".

Ordenou que Nityananda Prabhu distribuísse o amor divino de Radha-Govinda, mas em vez disso, Nityananda começou a pregar sobre Sri Gauranga. Ele pensou: "Será melhor se adorarem Gauranga, pois se livrarão das ofensas em suas posições atuais, e assim, alcançarão automaticamente um lugar no lila de Radha-Govinda". Recebeu ordem para pregar o nome de Krishna, mas em vez disso começou a pregar o nome de Gauranga. Portanto, prostremo-nos perante Nityananda Prabhu com toda humildade, para nosso próprio bem-estar.

Oremos: "Ó Nityananda Prabhu, Ó Gurudeva, por favor, dê-me uma gota de fé firme em Sri Gauranga, que é Radha-Govinda combinados, a saborear a doçura do néctar divino dos passatempos de Vrindavana. Dê-me uma gota de fé, para que algum dia eu alcance o amor divino e entre nesse reino".

Se negligenciarmos Nityananda Prabhu e Sri Chaitanya Mahaprabhu, nossa aspiração em servir Radha-Govinda será um sonho, uma abstração da imaginação sem realidade.

Nityananda Prabhu é o refúgio das almas caldas. Ele é o aspecto mais generoso de guru-tattva; devemos baixar nossas cabeças até o chão perante Ele, aceitar Seus pés de lótus e nos render a Ele.

Nityananda Prabhu é representado no reino espiritual de Vaikuntha como Sankarshana, o Senhor Supremo, que é considerado como a base fundamental de tudo o que existe. Toda existência possível é mantida por Sua energia. Nityananda Prabhu é o Baladeva original, a Personalidade de Deus. Portanto, devemos apreciar os passatempos de Nityananda Prabhu com plena consciência da Sua digníssima posição, embora Ele costumasse vagar a esmo, a rolar na poeira com lágrimas nos olhos, e dizia: "Aceite o nome de Gauranga, que estarei vendido a você". Deve ser considerado sob a luz de Sua verdadeira posição dignificada, mesmo que atue nessa posição inferiorizada. Devemos nos render a Ele com essa atitude.

Balarama é representado em vários aspectos em várias partes do mundo espiritual. Ele veio como Nityananda Prabhu junto com Sri Chaitanya Mahaprabhu. A verdade sobre Nityananda Prabhu foi explicada exaustivamente no Chaitanya Charitamrita e no Chaitanya Bhagavata. Ele é descrito como o desfrutador da Sua vida e aquele que saboreia Seus passatempos com Seu irmão mais novo. Devemos nos prostrar a esse Nityananda.

Sri Krishna-prema, amor divino, é uma substância inconcebível, muito agradável e extática. Grandes santos que obtêm um sabor dessa substância maravilhosa abandonam todas aspirações, inclusive a salvação, que é amplamente louvada nos Vedas. Portanto, embora Nityananda Prabhu seja igual a Baladeva, Ele é maior. Por quê? Ele distribui o amor divino.

O que é o amor divino? Ele é muito importante e valioso, está muito além de qualquer outro tipo de conquista, aquele que pode dar o amor divino é muito superior a quem pode dar dever, riqueza, prazer e até mesmo salvação (dharma, artha, kama, moksha). Se concebemos que Krishna é subordinado a Sri Chaitanya Mahaprabhu, então é óbvio que Balarama é subordinado a Nityananda Prabhu. Eles são iguais em todos os aspectos, mas quando adicionamos magnanimidade a Balarama, Ele Se torna Nityananda Prabhu.

Devemos estabelecer primeiramente a posição do amor divino: Os grandes santos descartam a salvação e outras coisas mais, após obterem um pequeno vestígio do amor divino. Após estabelecermos a posição do amor divino, podemos entender que a pessoa capaz de dá-lo deve ser necessariamente superior aos doadores de outras coisas.

Por conseguinte, Nityananda Balarama é superior a Karanodakashayi Vishnu, a Superalma dos universos coletivos; Garbhodakashayi Vishnu, a Superalma deste universo; e Kshirodakashayi Vishnu, a Superalma dos seres vivos. Esse Balarama apareceu aqui como Nityananda Prabhu - não com majestade, grandeza ou poder, mas numa forma humana - para distribuir amor divino. E Ele é aquele que dá Gauranga. Sua grandeza é provada por esse fato. Podemos ter uma melhor compreensão, ao examinar os vários aspectos da Sua vida passo a passo.

Nityananda Prabhu nasceu em Ekachakra, onde passou sua infância. Seus pais, amigos e vizinhos estavam irradiantes de alegria extática, graças a Seus doces passatempos infantis. Ele foi um prazer para a atmosfera de Ekachakra desde Seu nascimento, e passou Seus anos de infância nesse alegre ambiente.

Certa vez, ainda na infância, veio um sannyasi à casa de Nityananda e O pediu em caridade aos pais. O sannyasi viajava por vários lugares de peregrinação e rogou por Nityananda como esmola. Ele O levou como companhia, e Nityananda Prabhu viajou por quase todos os locais sagrados, como seguidor do sannyasi. É dito que esse sannyasi era Madhavendra Puri.

Nityananda Prabhu sentiu internamente o êxtase em Seu coração, e pôde entender certo dia que Sri Gauranga havia começado Seus passatempos de sankirtana em Navadwip. Ele veio à Navadwip Dhama com essa inspiração.

Um Sonho Extraordinário

Mahaprabhu disse a Seus seguidores naquele dia: "Sonhei que um homem extraordinário veio até Minha porta numa quadriga marcada com a bandeira da palmeira de Balarama, e disse: 'Onde é a casa de Nimai Pandita'? Duas, três, quatro - e várias vezes - Ele repetia: 'Onde é a casa de Nimai Pandita'? Essa grande personalidade deve ter chegado a Navadwip na noite passada. Tentem encontrá-Lo". Eles procuraram e procuraram mas não conseguiram achá-Lo em nenhum lugar.

Então Mahaprabhu lhes disse: "Deixem Eu tentar". E os levou diretamente à casa de Nandanacharya. Quando Sri Chaitanya Mahaprabhu e Seus seguidores chegaram lá, viram Nityananda Prabhu sentado na varanda. Quando Nityananda Prabhu viu Sri Chaitanya Mahaprabhu, fitou-O intensamente por algum tempo, absorveu-Se Nele e desmaiou. E assim, num único dia, Ele Se tornou o companheiro mais íntimo de Sriman Mahaprabhu. Quando Sri Chaitanya Mahaprabhu Lhe ordenou para dar a consciência de Krishna a todos, Ele começou a distribuir consciência de Gauranga, amor divino a Sri Gauranga. Esse Nityananda Prabhu é o salvador de todas almas caídas, sem nenhuma discriminação sobre o grau de queda. Portanto, prostremo-nos a Seus pés de lótus.

Certa vez, Sri Chaitanya Mahaprabhu teve uma conversa secreta com Nityananda Prabhu em Jagannatha Puri. Alguns dizem que quando Nityananda Prabhu foi para a Bengala e casou, foi porque Mahaprabhu Lhe pediu para casar. Nossa opinião é porque a assim chamada "classe alta" era muito vaidosa, e Nityananda Prabhu foi instruído para Se aproximar das massas. Foi necessário que casasse, pois Sua ordem era de Se aproximar do povo familiarmente para fins de pregação. Senão, haveria acusações sobre Seu padrão de renúncia devido à mistura com pessoas de família. Ele casou para cumprir esse propósito. Teve que adotar essa política e atitude. E pode ser que tenha sido aconselhado por Sri Chaitanya Mahaprabhu a agir assim, a decisão não foi Dele. É claro que casar ou não casar não significa nada para Ele.

O Bhakti-ratnakara descreve como Ele entrou em contato com Sua consorte eterna, Jahnavadevi. Parece que quando Ele pregava pela Bengala, pregou na casa do pai de Jahnavadevi, Suryadasa Pandita, o irmão de Gauridasa Pandita, que já era seguidor de Gaura-Nityananda. Suryadasa O ajudou intimamente no trabalho de propagação e sua casa era uma boa base. Suryadasa tinha duas filhas e ofereceu uma em casamento a Nityananda Prabhu. Se analisarmos finalmente, Srila Nityananda Prabhu e Srimati Jahnavadevi são companheiros eternos, apesar de que Seu casamento aparentemente aconteceu por necessidade, na realidade era tudo parte de Seu lila eterno.

Há alguns sannyasis que se aproveitam disso para abandonar seus votos de celibato e casar. Eles dão a desculpa do casamento de Nityananda. Mas nunca foi provado que Nityananda Prabhu foi sannyasi. Além do mais, "nityananda" é um nome de brahmachari. "Ananda" é um sufixo usado em nomes de brahmacharis. Há vários tipos de nomes de brahmacharis, Ananda, Svarupa, Prakasha e Chaitanya. O nome Ananda também é encontrado na ordem sannyasa, mas não encontramos nenhum título sannyasa mencionado para Nityananda Prabhu. Também não há menção em nenhum lugar sobre o sannyasa-guru de Nityananda Prabhu, embora saibamos que Seu diksa-guru é Madhavendra Puri, o guru de Adwaita Prabhu e Isvara Puri.

Nityananda Prabhu é conhecido como um avadhuta. Avadhuta não quer dizer sannyasi, mas sim alguém que não se preocupa com práticas externas e às vezes faz coisas que não devem ser feitas. Quando uma personalidade exaltada é vista a fazer alguma atividade inferior, deve ser considerada um avadhuta. Devemos entender que ela está além de tudo isso, mas suas ações são de natureza inferior. Ava significa inferior, e dhuta significa que tanto pode remover como purificar.

Nityananda Prabhu quebrou o bastão único de sannyasa (ekadanda) em três pedaços, indicando que quando se aceita sannyasa, a ordem de vida renunciada, não se deve aceitar apenas uma, mas três dandas, que simbolizam a dedicação do corpo, mente e palavras no serviço ao Senhor. Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura Prabhupada inspirado por esse ato de Nityananda Prabhu, deu tridandi-sannyasa a seus seguidores, em contraste com a ekadanda que era usada na Bengala naquela época. O sistema de tridandi-sannyasa era usado no Sul da Índia pelos Vaishnavas seguidores de Ramanujacharya, e Srila Bhaktisiddhanta o introduziu na era contemporânea.

"Conceito Falso - Ataque-o! Arrase-o"!

A aproximação de Nityananda Prabhu era bem peculiar. Sua estratégia era elevar os mais caídos. Nityananda Prabhu queria capturar os mais pecaminosos, como Napoleão, cuja política era atacar a posição mais forte do exército inimigo. É comum o pensamento de que um santo foge deste mundo de maya e vai para um lugar solitário onde possa entrar numa caverna e meditar. Os santos indianos geralmente pregam: "Abandone tudo, vá para um local solitário na floresta, encontre uma caverna e se ocupe plenamente em compreender Deus". Mas nosso Guru-maharaja era diferente. Ele queria atacar maya, como Mahaprabhu e Nityananda Prabhu, e, como um grande general, declarou guerra total contra a ilusão e até mesmo contra todos os outros conceitos de religião existentes. "Por que acontece esse engano e conceito falso"? Ele pensou: "Tudo pertence a Krishna: isavasyam idam sarvam. Isso é claro, simples e doce. Como podemos pensar: 'Isto é para mim, aquilo é para Ele'? Por que deixarmos esse conceito falso permanecer? Ataquem-no - e arrasem com tudo"!

Ele nos disse: "Kirtana significa pregar contra conceitos falsos. Devemos ir de porta em porta como soldados para pregar a consciência de Krishna - o interesse de Krishna - o conceito sobre Krishna. Se todos entenderem que tudo é para Krishna, serão salvos. Essa verdade é clara e simples. Por que eles não entendem então? Tentem capturá-los, para livrá-los do engano e do conceito falso deste mundo, onde sofrem reação".

Assim, não temeremos nada. Um sannyasi que gostava de vida solitária perguntou certa vez a Guru-maharaja: "Por que fica em Calcutá? Esta é a terra de Satã, onde a briga por interesses pessoais é tão acirrada. Deixe este lugar e vá para o dhama sagrado". Mas Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura tinha especialmente escolhido aquele lugar, e disse: "Prefiro representar o credo de Sri Chaitanya Mahaprabhu num lugar extremamente contaminado". Ele queria enviar homens ao Ocidente por esse motivo. Ele disse: "O Oriente está capturado pelo encanto da civilização Ocidental, por isso, a civilização Ocidental deve ser arrasada. Aí, seu fascínio será aniquilado e o mundo inteiro virá para se juntar à campanha do amor divino de Sri Chaitanya Mahaprabhu". Nityananda Prabhu resgatou as almas caídas deste mundo com esse mesmo espírito, na Sua tentativa de levá-las aos pés de lótus de Sri Chaitanya Mahaprabhu.

 

Capítulo 4

 

O

Louco

Nimai Pandita

 

Na época do advento de Sri Chaitanya Mahaprabhu, a Bengala estava bem afastada da consciência de Krishna. As pessoas tinham se degradado tanto que passavam o tempo e gastavam muito dinheiro em exibições de acasalamento de gatos. Elas adoravam a deusa-serpente, Vishahari, controladora dos demônios, Kali, e se desviaram completamente da adoração ao Senhor Supremo, Krishna. O nome de Krishna era raramente ouvido. Somente alguns poucos cavalheiros hindus costumavam cantar o nome de Govinda, Hari ou Krishna quando se banhavam no Ganges. O local do advento de Sri Chaitanya Mahaprabhu, Navadwip Dhama, era governado pelos islâmicos naquele tempo. O Kazi [magistrado, governador] estava no poder em Navadwip, e os sentimentos religiosos dos hindus eram abafados pela mão forte do governo islâmico.

Adwaita Acharya era um grande erudito e o seguidor sênior de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Ele apareceu em Navagrama em Sri Hatta, província oriental da Bengala, e residia em Shantipura. Sob o ponto de vista ontológico, Sri Adwaita Acharya é um avatara de Mahavishnu, criador do cosmo material através de Sua energia ilusória. Adwaita Acharya é o devoto que convidou intensamente Sri Chaitanya Mahaprabhu a descender como o yugavatara, para cuidar do bem-estar de todas almas. Ele adorou o Senhor com água do Ganges e folhas de Tulasi, e invocou Sua graça com a oração: "Ó Senhor, por favor, venha liberar essas pessoas, chegou a hora de liberá-las com a distribuição do doce nome de Krishna. Venha, Meu Senhor - elas sofrem tanto"! Assim, Adwaita Acharya atraiu Sri Chaitanya Mahaprabhu, em defesa da causa das almas caídas. É claro que já havia chegado a hora para o advento da encarnação desta era, o yugavatara, mesmo assim, foi Adwaita Acharya quem realizou a função de convidar e dar as boas vindas a Sri Chaitanya Mahaprabhu.

O Advento de Sri Chaitanya

Adwaita sentiu no coração o momento em que o Senhor Supremo ia aparecer: "Minha prece será satisfeita, Ele vem"! Finalmente, Ele detectou que Sri Chaitanya Mahaprabhu, a Suprema Personalidade de Deus, apareceu pessoalmente na casa de Sri Jagannatha Mishra e Shachidevi como seu filho recém-nascido, Nimai Visvambhara. Então, Adwaita Acharya foi prestar os devidos respeitos à criança e seus pais no dia do advento divino.

Depois que a criança cresceu um pouco, Sri Adwaita Acharya veio Se prostrar aos pés Dela, Nimai. A mãe de Nimai, Shachidevi, gritou: "O que faz Você? Você é um pandita sênior e erudito Védico. Se mostrar esse tipo de respeito ao meu garotinho, arruinará Seu futuro! O que está fazendo"?! É dito sempre que Adwaita Acharya prestava reverências a uma Deidade, a estátua se espatifava em pedaços se fosse falsa, se o Senhor não estivesse presente nela realmente. Mas quando Adwaita pôs Sua cabeça nos pés da criança, Nimai colocou Seu pé na cabeça de Adwaita Acharya. Todos ficaram espantados e abismados: "Que tipo de poder espiritual tem essa criança? Um devoto tão erudito e sênior como Adwaita Se prostrou à ela, e ela ainda pisou na cabeça de Adwaita e não foi afetada por nada! Quem é essa criança"?

Infância de Nimai

Quando Nimai era criança, às vezes Se disfarçava com uma coberta e entrava no bananal do vizinho. Ele costumava derrubar as bananeiras com cabeçadas. Os vizinhos pensavam: "Um touro deve ter entrado aqui, e destruiu nosso jardim"! O Senhor ensina Seus devotos através de Seus passatempos: "Eu derrubo as bananeiras que seriam usadas para algum outro propósito além do serviço a Mim. No sentido superior, vocês são Meus companheiros eternos, e posso fazer o que bem entender com suas propriedades para satisfazer Meus caprichos". Algumas vezes, Ele tirava a fruta da mão de Sridhara Pandita e dizia: "Ó, dê-Me esta banana. Não tenho nada para lhe pagar por ela". Sridhara Pandita dizia: "Por que faz isso? Você é um menino brahmana, não posso Lhe negar nada. Mas não deveria agir assim. Sou pobre. Se tira tudo que tenho de melhor, como poderei sobreviver"? - E assim, Nimai realizava Seus passatempos de roubar frutas.

À medida que Nimai Pandita crescia, nutria um grande respeito por Adwaita Acharya. Mas Adwaita Acharya não podia suportar isso. Ele disse: "Sei que não é uma pessoa comum. Você é uma personalidade sobrenatural e transcendental da mais alta classe. Mas apesar disso, é mais jovem do que Eu no sentido mundano e por isso deve Me respeitar, mas não posso suportar. É demais para Mim". Mas o que Adwaita podia fazer? Nimai mostrava Seu respeito formal por Adwaita sempre que Se encontravam. Adwaita então tramou para acabar com isso, e pensou: "'Verei o quanto é esperto".

Ele saiu de Navadwip e foi para Shantipura, onde começou a pregar contra a escola devocional. Chegaram notícias até Nimai Pandita de que Adwaita Acharya, depois de tanto tempo como devoto, pregava contra a escola devocional. Ele pregava que jñana, conhecimento, é mais importante do que devoção. Ele argumentava: "Devoção deixa o Senhor bem mais longe. O conhecimento tenta trazê-Lo bem mais perto. Através do conhecimento pensamos, 'ó Senhor, quero experimentá-Lo', e a devoção diz: 'Ele é adhokshaja, transcendental. Não pode ser percebido pelos sentidos'. Portanto, a devoção O deixa muito mais distante, 'só Sua boa vontade é que pode nos conectar'. Mas, conforme o caminho do conhecimento, a autoridade suprema está dentro de você mesmo. É claro que a escola devocional é secundária".

"Não mate esse Senhor idoso"!

Adwaita continuou a pregar desse jeito. Quando isso chegou aos ouvidos de Nimai Pandita, Ele foi com Nityananda punir Adwaita. Eles mergulharam no Ganges e nadaram até Shantipura, onde Se encontraram com Adwaita Acharya. Nimai O confrontou: "Que faz, Acharya? Por que Me convidou a vir aqui? Orou com folhas de Tulasi e água do Ganges para que Eu aparecesse e agora caçoa de Mim? Prega contra a devoção, contra Mim? Que acontece com Você"? E assim, Nimai Pandita puniu Adwaita. Ele começou a bater Nele. A esposa idosa de Adwaita Acharya começou a chorar: "Que está fazendo? Vai matar esse Senhor idoso"!

Nityananda Prabhu riu, e Haridasa Thakura que estava perto, perplexo, tentou entender: "Que está acontecendo"? Então, Adwaita Acharya ficou muito satisfeito, e disse: "Eu dei uma lição em Você - veio Me punir. Foi derrotado, Eu sou o vitorioso"! Adwaita Prabhu começou a dançar. "Hoje Eu derrotei Você, Meu Senhor! Teve que Me punir. Aonde foi todo aquele respeito formal que sempre Me mostrava"? Assim, Adwaita Acharya Se regozijou, e ofereceu a Mahaprabhu um grande banquete de shak (espinafre), Sua iguaria predileta.

O Senhor concedeu tanta graça a Adwaita Prabhu, que Lhe deu tapas, mesmo que Ele era um erudito e acharya idoso. Não é possível punir ou desonrar uma pessoa que respeitamos, só nossos amigos íntimos. Desrespeito e desonra só são possíveis quando há intimidade. Devotos puros desejam punição. Eles oram: "Puna-nos"! Mas punição das esferas superiores não é algo barato.

O Poema Místico de Adwaita

Alguns anos mais tarde, logo antes do início dos passatempos finais do êxtase divino de Sri Chaitanya Mahaprabhu, Adwaita Acharya escreveu algumas linhas de poesia, as quais enviou ao Senhor por Jagadananda Pandita:

baulake kahiha-loka haila baula
baulake kahiha-hate na vikaya caula
baulake hahiha-kaye nahika aula
baulake kahiha-iha kahiyache baula

"Diga a nosso Prabhu, que age como louco, todos perderam a sanidade, arroz tão caro, não tem mais valor. No amor de Deus, enlouquecida humanidade despreza o mundo e entes queridos; diga-Lhe: Um louco traz isso a Seus ouvidos".

Sri Chaitanya Mahaprabhu ficou com o humor muito sério quando leu o poema místico. Swarupa Damodara, que estava presente, disse: "Que está escrito aí"? Mahaprabhu respondeu: "Não sei o significado real, mas Adwaita Acharya é um grande 'adorador', e certos 'adoradores' estão acostumados a pensar que: 'Devemos convidar a Deidade, e devemos tentar mantê-La aqui e adorá-La por algum tempo. Finalmente, devemos dar adeus a Ela, quando nossa adoração terminar'".

"Talvez Adwaita pense que: 'Está na hora da Deidade partir'. Não sei o verdadeiro significado, mas talvez seja esse o Seu propósito". Swarupa Damodara pegou o poema, leu e ficou muito preocupado - "Ah! Adwaita Prabhu diz que os requisitos para a aparição de Sri Chaitanya Mahaprabhu foram preenchidos, e agora, Ele não precisa mais pregar o santo nome de Krishna como a encarnação desta era. O dever do avatara foi cumprido, e Ele pode partir".

Os últimos Doze Anos

Depois disso, Sri Chaitanya Mahaprabhu permaneceu neste mundo por doze anos, mas não como antes. Seu humor mudou muito. Daquele dia em diante, Ele sentiu uma enorme separação de Krishna, no humor de Radharani. A loucura divina se tornou proeminente Nele e Sua conexão social estava quase acabada. Ramananda Raya e Swarupa Damodara foram Seus acompanhantes nesse período. Ele não tinha mais nenhuma conexão social; o fogo queimava dentro Dele, o fogo da separação. Ele estava absorto na procura de Radharani por Sri Krishna, depois que Krishna partiu de Vrindavana. Ele passou doze anos fechado num quarto dentro da propriedade de Kashi Mishra nesse humor de loucura divina.

Às vezes à noite, Ele inconscientemente pulava o muro e ia Se encontrar com o Senhor Jagannatha. Aí, Swarupa Damodara e Seus outros acompanhantes notavam que não vinha nenhum som com o nome de Krishna de dentro do quarto e saíam à procura: "Mahaprabhu não está aqui, onde será que Ele está"? Às vezes, encontravam-No caído diante do portão principal do templo de Jagannatha, com Seus braços e pernas retraídos para dentro do corpo, como os membros de uma tartaruga dentro da carapaça. Uma suave fragrância emanava Dele, e as vacas vagavam por ali, a cheirar Seu corpo. Mahaprabhu experimentava internamente os passatempos de Radha e Govinda com as gopis em Govardhana enquanto estava deitado nesse transe. Swarupa Damodara e os outros tentavam ao máximo revivê-Lo do transe, por cantar o santo nome de Krishna.

Quando Mahaprabhu despertou, começou a reclamar: "Que fizeram vocês? Eu desfrutava uma experiência muito feliz, mas vocês Me arrastaram para cá com um grande alarido". O que causou o alarido? O cantar de Hare Krishna. E quem cantava o nome de Krishna? Swarupa Damodara e outros do mesmo calibre. A profundidade da experiência de Sri Chaitanya Mahaprabhu no Seu transe divino era tamanha, que considerou o cantar de Hare Krishna como barulho. Portanto, podemos cantar o nome de Krishna e fazer barulho apenas. Mas sob outro aspecto, conclui-se que krsna-nama é tão valioso, que foi preferido em vez da participação direta em krsna-lila. A orientação dada por nossos acharyas, preceptores espirituais da nossa linha, é que devemos considerar nosso canto pessoal como um mero barulho.

Certo dia, Sri Chaitanya Mahaprabhu passeava perto da praia. Uma jovem cantava fervorosamente uma prece ao Senhor Jagannatha. Sri Chaitanya Mahaprabhu começou a correr direto para aquele som. Ele atravessou perigosos arbustos espinhosos até que Seu servo Govinda conseguiu detê-Lo. Quando Ele voltou a Si, compreendeu o que acontecia e disse: "Oh! Era uma moça que cantava? Govinda salvou Minha vida".

Meio-Louco em Êxtase

Repentinamente, Ele sentia que Krishna brincava com as gopis no Yamuna. Então, pulava no oceano, e gritava, "Krishna"! Ele mergulhou e ficou inconsciente, enquanto as ondas O embalavam. Quando descobriram que Mahaprabhu havia sumido, os devotos ficaram preocupados - "Onde está Mahaprabhu"?, e começaram a procura, chefiados por Swarupa Damodara. A noite já se aproximava e eles ainda não O encontraram, até que apareceu um pescador a correr, meio-louco, e cantava: "Krishna, Krishna, Krishna"!

"Que aconteceu"? perguntou Swarupa Damodara. "Eu costumo pescar todas as noites e hoje joguei minha rede e pequei algo muito pesado. Puxei, e pensei que era um peixe bem grande, mas quando cheguei à praia, vi que era uma figura humana, e quando O tirei da rede, acabei por tocar em Seu corpo, e agora estou meio louco". Aí, Swarupa Damodara disse: "Deve ter visto nosso Sri Chaitanya Mahaprabhu"? O pescador respondeu: "Não, eu O vi antes, Ele é uma pessoa muito bela. Não era Ele. É algo diferente". Swarupa Damodara disse: "Por favor, mostre-nos mesmo assim".

Eles foram ao local e viram a longa imagem do Senhor, Suas juntas estavam deslocadas, deitado na areia, imóvel. Swarupa Damodara e os outros começaram a cantar os santos nomes de Krishna em Seu ouvido, até Ele voltar a Si. Então, Sri Chaitanya Mahaprabhu começou a descrever o lila de Krishna, onde foi lançado em Seu transe. E nesse modo, depois que o poema de Adwaita Acharya Lhe foi enviado, Sri Chaitanya Mahaprabhu viveu Seus últimos doze anos no humor de intensa separação que Srimati Radharani sentia por Krishna.

O Louco Nimai Pandita

Sri Chaitanya Mahaprabhu exibiu esse grau intenso de loucura divina nos Seus últimos dias na Terra. Mas antes em Navadwip, quando Mahaprabhu ainda era o estudante Nimai Pandita, todos pensaram que Ele tinha ficado louco, quando voltou de Gaya e começou a mostrar sinais de devoção a Krishna. As pessoas normais da época comentavam: "Nimai Pandita era um bom homem, um cavalheiro, mas depois que voltou de Gaya, mudou completamente, age de forma não desejada. Quer pregar tantas idéias novas. Que é isso? Ficou louco. Não Se preocupa com mais nenhum princípio ou regra, costumes sociais, e escrituras ancestrais - é só 'Krishna, Krishna, Krishna'. Antes Ele era normal, mas agora é anormal. É claro que Ele tem um intelecto poderoso. Quando era professor, não ligava nem mesmo para a erudição de grandes panditas. Ele derrotou facilmente o erudito campeão, Keshava Kashmiri, e muitos outros. Mas agora Ele está perdido. Está diferente. Não liga mais para os brahmanas e as escrituras que seguimos. Ele tem uma nova opinião, e a apresenta ao mundo. Seus caminhos são incompreensíveis". Os vizinhos reclamaram à Sua mãe, Shachidevi: "Shachidevi, que é isso? Nimai não é mais o mesmo, agora Ele não liga mais para nós. E nem sente mais atração pela esposa. No que será que Ele Se tornou? É filha de um cavalheiro, mas veja sua má sorte! Que fazer? O fato é, Shachi, seu único filho ficou louco. Deve providenciar tratamento médico para Ele". Então, Shachi chamou o kaviraja, o médico.

O médico veio e providenciou para que construíssem um pequeno tanque de tijolos para encher com óleo de Vishnu, que é um óleo refrigerante. Ele pediu que Nimai Pandita Se banhasse naquele tanque. Nimai fez isso, e repentinamente começou a nadar e mergulhar no óleo, e ria loucamente. Shrivasa Thakura chegou nesse momento e perguntou: "Como vai Nimai Pandita"? Shachidevi respondeu: "Vê minha desgraça! Nimai ficou completamente louco. Eu chamei um médico que trata Dele agora". Quando Shachi mostrou-lhe Nimai no tanque, ele disse: "Que é isso"? Shachi respondeu: "Meus vizinhos me aconselharam a fazer isso". Shrivasa disse: "É uma dama gentil, mas não sabe lidar com pessoas. Isso que Nimai tem, eu queria ter! Seu filho está com krsna-prema, e quero uma gota disso para mim. Se formos permitidos viver mais alguns poucos anos, teremos a oportunidade de ver muitos passatempos maravilhosos de Krishna".

Nimai recobrou os sentidos por alguns instantes e disse a Shrivasa: "'Se também tivesse dito que estou louco, Eu correria para o Ganges e acabaria com minha vida. Pelo menos você entendeu quem sou Eu; esse é Meu consolo. Shrivasa, se tivesse dito ao público: 'Ele está louco'!, Eu concluiria que não existe ninguém para aceitar o que vim trazer, e, por isso, vou mergulhar no rio e afundar sem hesitação".

Nimai Pandita era um grande erudito antes de ir a Gaya. Quando voltou de lá saturado de devoção, começou a explicar gramática novamente, mas mostrava Krishna na gramática. Ele interpretava as raízes da gramática sânscrita, e mostrava a relação entre sânscrito e Krishna. Explicou que o som é apenas uma vibração, e vibração significa potência de Krishna. A potência de Krishna torna tudo puro, faz tudo se mover. Se essa potência fosse excluída, tudo seria morto e passado. Assim, Nimai Pandita tentava explicar, gramática em termos de Krishna.

Seus alunos ficaram perturbados... "Que está acontecendo? Viemos aprender sânscrito com Nimai Pandita, mas agora não preencheremos mais os requisitos acadêmicos requeridos. Ainda assim, o treinamento que Ele nos deu não se encontra em nenhum outro lugar, por isso, não podemos abandoná-Lo. Como poderemos incrementar o padrão de Seus ensinamentos"? Eles procuraram o antigo professor de Nimai Pandita, Gangadasa Pandita. Ele tinha sido o professor de infância de Nimai. Gangadasa disse: "Vocês são muito afortunados de serem alunos de Nimai Pandita - Ele é um excelente professor. De que reclamam"? Os alunos responderam: "Estávamos muito satisfeitos, por aprender com Nimai Pandita. Mas agora, depois que voltou de Gaya, Ele explica tudo de um jeito bem diferente. Ele ensina sânscrito em termos do santo nome de Krishna. Ele compreende uma filosofia muito sublime, que não serve para fins de estudo de gramática. Certamente que é valiosa, mas não ajuda nossos estudos. Por favor, peça-Lhe que mude Seus modos. Ele o considera porque foi Seu professor. Somente você pode influenciá-Lo". Ele respondeu: "Está bem, peçam a Ele para vir me ver, amanhã".

Os alunos foram até Nimai Pandita e disseram: "Seu antigo professor O chamou. Ele quer vê-Lo". Nimai respondeu: "Sim, irei vê-lo". Mais tarde, naquele mesmo dia, Ele foi visitar Gangadasa Pandita, e lhe prestou reverências. Gangadasa disse: "Como vai, meu rapaz? Fiquei feliz ao saber que foi a Gaya e realizou os rituais para com Seus ancestrais. Isso é ótimo, mas o que acontece? Seus alunos vieram reclamar de Você. É verdade que não Se preocupa em lhes ensinar apropriadamente? Por que não Se empenha em ensinar como antes? Todos apreciavam Seu ensino, mas, depois que voltou de Gaya, adotou um estilo novo. Não faça isso. Ensine corretamente. Tenho ouvido comentários de que Se tornou devoto. Mas por acaso, Seus pais e ancestrais não eram devotos? É claro que virou um devoto extraordinário. Mas não extrapole. Tudo que diz sobre devoção parece desnecessário - isso não é gramática verdadeira. Pensa que dá uma nova luz com Seus significados? Pensa que todos os antigos professores são idiotas? Que tem a dizer"? Nimai ficou calado. "Tudo bem então. Não extrapole. Fique tranqüilo e siga os predecessores, ensine direito aos rapazes, assim não ouviremos mais reclamações sobre Você. Seus alunos não querem ir para outra escola, eles gostam muito de Você, por isso, ensine-lhes direito". Então, Nimai Pandita pegou a poeira dos pés de Seu professor e disse: "Sim, tentarei obedecer sua ordem, Ninguém é capaz de Me desafiar em erudição devido ao poder da poeira de seus pés. Não se preocupe. Vou ensinar direito".

"Por que devo adorar Krishna"?

Poucos dias depois, Nimai Pandita começou a cantar o nome "gopi, gopi" durante um transe de devoção. Alguns eruditos de alto nível social foram até Ele e disseram: "Nimai Pandita! Era um grande pandita, e agora é devoto. Isso não importa, mas por que canta o nome 'gopi, gopi'? Aceite o nome de Krishna, que terá algum beneficio, de acordo com as escrituras. Mas canta 'gopi, gopi', que beneficio obterá disso? Está louco". Nimai respondeu: "Quem é Krishna? Por que devo adorá-Lo? Ele é um bandido e caçador de mulheres"! Então, Nimai pegou um pedaço de pau e correu atrás deles.

Depois disso, começaram os comentários - "Nimai Pandita está completamente louco. Fomos Lhe dizer coisas boas e Ele veio com um pedaço de pau para nos matar! Não somos filhos de pessoas comuns - temos nossa alta posição social e dignidade familiar. Vamos mostrar a Ele!" Então, começaram uma trama para dar uma boa lição em Nimai Pandita, e Lhe dar uma boa surra.

Nesse momento, Nimai Pandita gritou: "Tomei todas as providências para liberar essas almas miseráveis, mas vejo que eles simplesmente geram mais pecado ainda, ao abusarem de Mim e conspirarem contra Mim. Por que Eu vim? O que será realmente efetivo para liberá-los? Terei de assumir o papel de um sannyasi. Senão eles vão pensar que sou igual a eles, um chefe de família. Mas se Eu Me tornar sannyasi, pregador - aí eles terão algum respeito. Eles dirão: "Somos chefes de família e Ele Se tornou sannyasi. Deve ser respeitado". Então, obterão algum beneficio através desse respeito. Senão, irão para o inferno, por pensarem que sou uma pessoa comum. Aceitarei o papel de sannyasi para gerar algum respeito e assim beneficiá-los". Ele revelou a Nityananda Prabhu e alguns outros: "Aceitarei sannyasa no último dia do primeiro mês deste ano".

 

Capítulo 5

 

Uma

Tragédia

de Separação

 

Nimai Pandita foi para Katwa aceitar sannyasa, ordem de vida renunciada, no dia de Makara-sankranti, uma conjunção auspiciosa de estrelas, conforme o cálculo solar. Depois disso, Ele ficou conhecido como Sri Chaitanya Mahaprabhu. Ele foi a nado pelo Ganges e correu até Katwa com as roupas molhadas. Ele disse a alguns de Seus amigos, Nityananda Prabhu, Gadadhara Pandita, Mukunda e outros: "Chegou a hora em que irei aceitar o hábito de sannyasi".

Um grupo de inimigos se levantou contra Nimai Pandita poucos dias antes disso. Os crentes no princípio de que a natureza material é superior e a consciência é um produto da matéria começaram a insultar Nimai Pandita. Ele pensou: "Vim salvar as pessoas mais baixas, mas se continuarem a Me ofender, não haverá esperanças de elevação para elas". Aí, Ele disse: "Eu trouxe o remédio que proporciona o maior alívio, mas vejo que a doença piora rapidamente e parece não ter mais cura. Ele seguirá seu curso em direção à perdição. Os pacientes cometem ofensas ao insultar seu médico. Eles se organizam para Me insultar. Pensam que sou um chefe de família - sobrinho deles - pensam que sou um deles. Eu trouxe o melhor remédio para a presente era degradada, mas vejo que agora tramam contra Mim. Eles estão perdidos. Pelo menos, devo mostrar a eles que não sou um deles. - Ele pensou: "Vou abandonar a família e aceitar sannyasa, irei de vila em vila, cidade em cidade, para pregar o santo nome de Krishna". Essa foi Sua decisão, poucos dias depois, foi para Katwa aceitar sannyasa de Keshava Bharati Maharaja.

Um dia antes de partir para aceitar sannyasa, do meio dia até à noite, houve um encontro espontâneo de devotos na casa de Nimai Pandita. Esse dia era celebrado todos os anos na Bengala como Lakshmi-puja - adoração à deusa da fortuna - e vários bolos especiais eram preparados e distribuídos. Nimai sabia que partiria de Navadwip na manhã seguinte para aceitar sannyasa, por isso atraiu Seus seguidores de tal forma que quase todos os devotos líderes vieram vê-Lo naquela noite.

O Maha-Mantra Hare Krishna

Eles trouxeram colares de flores e várias oferendas de presentes ao Senhor. Nimai aceitava os colares de flores e depois os colocava de volta no pescoço do devoto que tinha oferecido. Somente quatro de Seus devotos mais íntimos sabiam que Ele estava para partir, os devotos comuns não sabiam que essa seria Sua última noite em Navadwip. Ele punha colares de flores nos devotos com Suas próprias mãos e implorava: "Cante sempre o nome de Krishna. Não abandone krsna-nama em nenhuma circunstância. E não faça mais nada. Enquanto trabalhar, comer, dormir ou andar, dia e noite - em tudo que fizer - aceite o nome de Krishna continuamente. Fale sempre sobre Krishna - e nada mais. Se tem alguma verdadeira atração ou afeição por Mim, não faça nada sem cantar o nome de Krishna".

"Cultive a consciência de Krishna. Krishna é a origem de todos nós. Ele é nosso pai, viemos Dele. O filho que não tem gratidão ao pai, seguramente será punido nascimento após nascimento. Sempre cante esses nomes do Senhor":

Hare Krishna Hare Krishna Krishna Krishna Hare Hare
Hare Rama Hare Rama Rama Rama Hare Hare

"Não é necessário nenhum outro princípio religioso. Cante Hare Krishna. Esse mantra não é comum, é o maha-mantra, o maior de todos os grandes mantras, a essência de todos os mantras conhecidos neste mundo. Valha-se dele apenas, e sempre. Não siga nenhuma outra prescrição".

"Lembre-se de seu Senhor, de seu lar. Esta terra é estranha, não tem nenhuma aspiração aqui. Tente sempre voltar ao lar, de volta ao Supremo". Assim, Nimai Pandita falou, e todos Seus devotos vieram intuitivamente, pois era a última noite de Nimai Pandita em Navadwip.

O Senhor e o Vendedor de Frutas

Um devoto chamado Sridhara Kholavecha chegou tarde à noite. Ele comercializava frutas. Vendia fruta madura ou verde e também folhas grandes para fazer pratos, Nimai costumava pagar menos pelas frutas e às vezes, pegava as melhores sem pagar nada. Sridhara veio tarde na noite para Lhe oferecer uma abóbora especial. Nimai, pensou: "Passei quase que todo tempo a tirar tantas coisas dele, e agora nesta última noite, ele Me trouxe esta excelente abóbora. Não posso resistir". Ele pediu a Shachidevi: "Mãe, Sridhara Me deu esta abóbora. Por favor, pense num jeito de prepará-la". E aí, alguém trouxe leite na hora de dormir. Nimai disse: "Mãe, por favor, prepare arroz-doce com o leite e a abóbora". Assim, Shachidevi preparou arroz-doce com leite, arroz e açúcar cozidos com abóbora. Tarde da noite, lá pelas três horas da madrugada, Nimai partiu, e deixou Vishnupriya-devi que dormia. Sua mãe Shachidevi sentiu o que ia acontecer e ficou acordada a noite toda para vigiar a porta. Nimai prestou-lhe reverências e foi embora. A mãe Shachidevi permaneceu sentada no portão depois que Nimai partiu, imóvel como uma estátua. Ela não conseguia falar nada. Ficou muda com o choque.

Nimai nadou pelo Ganges logo após as três da manhã e foi direto para Katwa com Suas roupas molhadas, numa distância de quarenta quilômetros. Chegou lá entre nove e dez horas. Procurou Keshava Bharati para aceitar sannyasa.

A Tristeza da Mãe Shachi

Os devotos vieram na manhã seguinte para ver Nimai, e encontraram Shachidevi sentada na porta como uma estátua. A porta estava aberta. Tudo estava vazio. Eles perguntaram: "Que aconteceu Shachidevi"? Ela respondeu: "Oh, devotos! Esperava por vocês. Peguem tudo que houver na casa. Irei para outro lugar. Não posso mais entrar nesta casa. São devotos Dele, os verdadeiros herdeiros. Tomem posse". Eles começaram a se aglomerar ao redor dela e a consolá-la. "Vai partir? Que será da jovem esposa que Ele deixou? Ela só tem quatorze anos. Quem a protegerá? Não pode evitar a responsabilidade que lhe foi legada. Está nas suas costas agora". Eles a consolavam desse jeito e tentavam lhe incutir alguma esperança.

Repentinamente, os devotos ouviram que Nimai Pandita, Sri Gauranga, partira de Navadwip. Souberam que Ele foi para Katwa, ao ashrama de Keshava Bharati aceitar sannyasa, e Se despediu para sempre do povo de Navadwip.

Uma nuvem escura desceu. Muitos começaram a lamentar e chorar por Ele. Muitos correram para Katwa. Nimai Pandita era um erudito sem igual com características belíssimas - alto, belo e benevolente. Já tinha deixado as pessoas loucas com o santo nome de Krishna. Liberou os grandes pecadores Jagai e Madhai de suas vidas sórdidas. Coibiu o governador islâmico, o Kazi, que tinha quebrado um tambor mridanga. Derrotou muitos eruditos que vieram conquistar Navadwip, renomada por sua alta cultura e conhecimento, especialmente lógica, como um pandita famoso.

Lógica (nyaya), adoração à energia material (tantra) e hinduismo oficial (smriti) eram altamente cultivados em Navadwip naquela época. Navadwip tinha alta reputação devido à sua erudição. Um pandita não ficava famoso, se não fosse capaz de derrotar os eruditos de Navadwip. Keshava Kashmiri veio de muito longe, Caxemira, para Navadwip a fim de obter um certificado de pandita. E foi derrotado por Nimai Pandita. Keshava Kashmiri era um pandita tão elevado que havia rumores de que era o filho favorito de Sarasvati, a deusa do conhecimento. Ninguém podia enfrentá-lo. Mesmo assim., foi derrotado por Nimai Pandita.

Adeus para Sempre

Nimai Pandita partiu de Navadwip para sempre e aceitou sannyasa porque o povo de lá não O respeitava. Quando chegou em Katwa, bem na margem do Ganges, havia um sannyasi, Keshava Bharati. Nimai foi até ele, pedir sannyasa. Keshava Bharati percebeu subitamente que seu ashrama brilhava. Primeiro, pensou que o Sol nascia perante ele, mas aí viu que uma pessoa brilhante se aproximava. Ele se levantou e, com os olhos arregalados de espanto, aproximou-se admirado. Pensou: "Que é isso"?

Ele compreendeu que o grande devoto erudito Nimai Pandita havia chegado. Nimai veio perante ele e disse:

"Quero aceitar sannyasa de você". Mas Keshava Bharati não pôde aceitar o pedido de Nimai, e respondeu: "Fiquei atraído por Sua beleza e personalidade. Mas é tão jovem, só tem vinte e quatro anos. Que será da Sua mãe, da esposa e dos guardiões? Não posso me aventurar a Lhe dar o hábito da renúncia sem antes consultá-los".

Era Makara-sankranti, dia santo famoso, e nesse meio tempo, vieram muitas pessoas para se banhar no Ganges. Estavam todos reunidos lá, e os rumores começaram a se espalhar como fogo - "Nimai Pandita de Navadwip veio aceitar sannyasa". As pessoas chegavam, até formar uma grande multidão.

Oposição Afetuosa

Todos ficaram contra o sannyasa de Mahaprabhu. Alguns gritavam em protesto: "Você, Keshava Bharati! Não permitiremos que dê sannyasa a esse jovem. Ele tem família, mãe e esposa. Não permitiremos. Se você der sannyasa a esse jovem atraente e belo, quebraremos seu ashrama imediatamente. Não pode ser"!

Nimai Pandita continuou a insistir. Finalmente, Keshava Bharati perguntou: "Então, é o Nimai Pandita de quem tanto ouvimos falar? Muitos grandes eruditos vieram conquistar Navadwip, o famoso local de conhecimento, e derrotou todos. É esse Nimai Pandita"? Nimai respondeu: "Sim". Keshava Bharati disse: "Eu Lhe darei sannyasa somente se pedir permissão à Sua mãe - senão não posso fazer isso". Nimai começou a correr para Navadwip imediatamente para pedir permissão, mas Keshava Bharati pensou: "Ele tem uma personalidade tão forte que é capaz de fazer qualquer coisa".

Nimai foi chamado de volta e Keshava Bharati disse: "Pode fazer qualquer coisa com Sua personalidade extraordinária. Irá para lá, encantará Seus guardiões, obterá a permissão e voltará. Para Você, nada é impossível".

A multidão estava furiosa e dizia: "Swamiji, não podemos permitir, que dê sannyasa a esse jovem. É impossível! Se fizer isso, destruiremos seu ashrama". Sri Chaitanya Mahaprabhu começou um kirtana, com o canto de Hare Krishna e a dançar loucamente. A multidão furiosa crescia e de vez em quando causava problemas. Assim, o dia passou sem nenhuma decisão. A noite também passou em sankirtana. No dia seguinte, a vontade de Nimai predominou, embora ainda houvesse alguma oposição.

Lágrimas nos Olhos de Milhões

Nityananda Prabhu, Chandrashekhara, tio materno de Nimai, Mukunda Datta e Jagadananda Pandita chegaram gradualmente. A cerimônia de sannyasa começou à tarde. Chandrashekhara foi requisitado para executar a cerimônia em nome de Nimai Pandita, que começou a dançar e cantar, para o encanto da audiência.

laksa locanasru-varsa-harsa-kesa-kartanam
koti-kantha-krsna-kirtanadhya-danda-dharanam
nyasi-vesa-sarva-desa-ha-hutasya-kartaram
prema-dhama-devam eva naumi gaura-sundaram

"Enquanto lágrimas escorriam dos olhos de milhões, Ele se deleitava durante o corte de Seu belo cabelo. Milhões de vozes cantavam as glórias de Krishna, quando Sri Krishna Chaitanya aceitou o bastão da renúncia. Daquele dia em diante, onde quer que fosse, quem quer que O visse no hábito de sannyasi chorava de tristeza. Canto as glórias desse belo Deus Dourado, o doador do amor divino".
(Sri Prema Dhama Deva Stotram, 16)

Sannyasa de Mahaprabhu

O cenário foi Katwa. Sri Chaitanya Mahaprabhu aceitou sannyasa há quatrocentos e setenta e quatro anos [1510 d.C.]. Ele era jovem e belo, de aparência alta. Tinha apenas vinte e quatro anos e belos cabelos encaracolados. O barbeiro requisitado para raspar Sua cabeça desistiu. Ele não quis arriscar tocar no corpo de Nimai, e começou a chorar: "Como posso raspar um cabelo tão bonito de uma cabeça tão linda"?

Muitas pessoas também choravam alto: "Que coisa terrível acontece aqui! Quem criou o sannyasa? Quem é tão desumano a ponto de ter criado o sannyasa-ashrama, em que é preciso abandonar tudo que é intimo e querido, e ir de porta em porta a mendigar, depois de deixar os próprios amigos e parentes a chorar desesperados? Que é esta criação do Supremo? Será lógica? Será alegre? Não, é terrivelmente cruel"!

Nimai Pandita ria. O barbeiro acabou forçado de todo jeito a raspar a cabeça de Nimai. No inicio, ele não se aventurou a tocar em Seus cabelos, e disse: "Não posso tocá-Lo". Mas no fim, teve que fazer o serviço de raspar os belos cabelos encaracolados do lindo rosto do rapaz genial de vinte e quatro anos. Ele começou a raspar. Algumas pessoas não suportaram a cena. Alguns até enlouqueceram. Tudo foi feito no meio da multidão ameaçadora que chorava, lamentava e gritava.

Nimai permaneceu insensível. Quando estava meio raspado, levantou e começou a cantar e dançar um kirtana com alegria extática. O barbeiro terminou o serviço e prometeu: "Nunca mais rasparei ninguém com estas mãos! Vou viver da mendicância. Esse foi meu último serviço como barbeiro". Depois disso, ele começou a trabalhar como doceiro.

Nimai conseguiu acalmar a multidão, e o inevitável aconteceu um pouco antes do meio dia, a cerimônia de sannyasa foi realizada. O tio materno de Nimai Pandita, Chandrashekhara Acharya, foi nomeado para cuidar dos rituais da cerimônia de sannyasa. Quando chegou a hora de outorgar o mantra, Nimai perguntou a Keshava Bharati: "É esse o mantra que Me dará? Eu o ouvi num sonho". Ele murmurou o mantra no ouvido de Seu guru, que aceitou e disse: "Sim, esse é o mantra que ia Lhe dar". Assim, o mantra foi dado.

O nome de sannyasi também não foi dado normalmente. Keshava Bharati obteve um nome bem peculiar, "Krishna Chaitanya". Nimai não recebeu nenhum dos dez nomes geralmente usados para sannyasis e sim, "Krishna Chaitanya". A multidão começou a gritar: "Sri Krishna Chaitanya Mahaprabhu ki jaya"! - "Todas as glórias a Sri Krishna Chaitanya"!

O pai de Srinivasa Acharya foi colega de classe de Nimai Pandita. Ele ouviu sobre o sannyasa de Nimai Pandita quando ia para a casa do sogro, e correu para lá. Ao ver toda a cena, ficou meio louco. Depois disso, não saía nada de sua boca a não ser "Chaitanya". Após ouvir o nome "Krishna Chaitanya", sempre que alguém lhe dizia isso, ele só falava "Chaitanya". Enlouqueceu. Ele ficou conhecido como Chaitanya Dasa, depois disso. Seu nome anterior foi esquecido, e todos o chamavam de Chaitanya Dasa. Ele não suportou o sannyasa de Nimai Pandita.

Sri Chaitanya Mahaprabhu, vestido em Suas novas roupas vermelhas, abraçou Seu guru, e começaram a dançar e cantar o nome de Krishna. Pouco depois, Keshava Bharati explicou o significado do nome: "Sri Krishna Chaitanya significa que despertou a consciência de Krishna do mundo inteiro. Você descendeu para tornar as pessoas conscientes de Krishna. Portanto, o único nome adequado para Você é Sri Krishna Chaitanya.

O Mundo Nectáreo

Mahaprabhu ficou muito contente, e pensou: "Vou aliviar tantas almas da miséria e aflição eternas. Prometi salvar o mundo inteiro do oceano de miséria e levá-lo ao mundo nectáreo, agora, vou cumprir essa tarefa". Ele estava feliz, mas todos a Seu redor estavam mergulhados no oceano de desespero e pesar.

Alguns eruditos enfatizam o fato de que Chaitanya Mahaprabhu aceitou sannyasa de Keshava Bharati, que era mayavadi, impersonalista. Embora Keshava Bharati tenha se mostrado dessa forma externamente, parece que se tornou devoto ao entrar em contato com Mahaprabhu. Senão, podemos pensar que ele era um devoto que veio disfarçado como impersonalista para ajudar a pregação de Mahaprabhu, e realizar a formalidade social de Seu sannyasa. Os sannyasis mayavadis eram muito mais respeitados do que os sannyasis vaisnavas naquela época na Índia, e Keshava Bharati estava nessa posição. Mahaprabhu aceitou sannyasa dele de propósito, para ajudar Sua pregação. Esses fatos podem ser explicados de formas diferentes. De todo jeito, Keshava Bharati começou a cantar e dançar com Sri Chaitanya Mahaprabhu depois que Ele aceitou sannyasa. Aderiu ao sankirtana e foi convertido imediatamente.

Conceito de Krishna - União na Separação

E assim, realizou-se o sannyasa de Nimai Pandita. Qual o significado de Seu sannyasa? Redundante, auxiliar ou parte necessária de avanço espiritual? Desejável? Embora aparentemente não desejado, ainda assim tem sua necessidade. Há uma profunda correlação, no conceito teísta de Krishna, entre união com o Senhor e separação Dele. A união não pode ser profunda sem separação. A dor da separação tem muito mais capacidade de entrar no fundo do coração do que a alegria. A apreensão incrementa a satisfação. Quanto maior o desejo, maior a satisfação. Especialmente em casos amorosos. Algo tem valor conforme sua necessidade. Esse princípio é válido para tudo. Um copo de água é comum, mas seu valor aumenta conforme sua necessidade. Por isso, o grau de necessidade é muito importante. Necessidade significa separação. Necessidade independente da satisfação é separação, anseio.

A separação tem o papel mais importante tanto no lila de Navadwip quanto no de Vrindavana. Foram quantos anos de união entre Krishna e as gopis? Krishna ficou em Vrindavana dos sete aos doze anos: cinco anos. Depois, foi para Mathura. É claro que o Padma Purana afirma que em casos extraordinários ou peculiares, deve-se medir o crescimento, ao multiplicar a idade por um e meio. Assim, quando Krishna tinha oito anos, deve ser considerado como doze. Quando tinha doze, deve ser considerado como dezoito. Conforme o crescimento, Krishna permaneceu em Vrindavana dos doze aos dezoito anos, mas de acordo com os anos, dos sete aos doze.

A Profundidade do Amor Divino

Ele permaneceu em Dwaraka por muito tempo. Sua permanência total na Terra foi de cento e vinte e cinco anos. As gopis sentiram as dores da separação pelo resto da vida, após Ele partir de Vrindavana aos doze anos. A longa, longa separação tornou a devoção delas altamente digna; o teste da separação mostra se o amor é verdadeiro. A História nunca viu tão longa separação e tão grande teste; ainda assim, a profundidade do amor delas não diminuiu. Ao contrário, viu-se uma profundidade de amor divino inconcebível e sempre crescente.

O cenário é quase similar em Navadwip e Vrindavana. Mahaprabhu em Navadwip abandonou a vida familiar a fim de vencer Sua oposição. Em Vrindavana-lila é similar. A oposição no Vrindavana-lila veio de Mathura na forma de Agha, Baka, Putana, Trinavarta e outros demônios, enviados pelo rei Kamsa. Krishna teve de ir a Mathura para acabar com a oposição. Ao chegar lá, viu que a oposição tinha se espalhado amplamente. O sogro de Kamsa, Jarasanda, Kalayavana, Shishupala, Dantavakra e vários outros eram inimigos de Krishna. Krishna prometeu para as gopis que após acabar com Seus inimigos, voltaria a Vrindavana para brincar com elas pacificamente. Krishna teve que partir para erradicar a oposição. Ele disse às gopis em Kurukshetra: "Tenho alguns outros inimigos. Depois que acabar com eles, nos reuniremos novamente". Esse tipo de esperança foi dado às gopis em Kurukshetra.

Aqui também, Mahaprabhu teve que partir de Navadwip para conquistar a oposição. Após conquistar todos os eruditos da Índia e religiosos de vários credos e posições, depois de cinco anos, todos estavam mudados quando voltou a Navadwip. A multidão se aproximou Dele loucamente. É difícil conceber o grau de loucura da multidão ao se aproximar de Sri Chaitanya Deva, filho de sua própria vila.

O Ganges - Cheio de Cabeças Humanas

A multidão atravessava o Ganges. O Ganges inteiro estava cheio de cabeças humanas, até onde a visão alcançava. Eles corriam em direção a Ele de todas as direções de tal forma que as florestas eram limpas pelos pés humanos. Sri Chaitanya Mahaprabhu permaneceu alguns dias perto de Vidyanagara, e partiu para Vrindavana, a cantar o santo nome de Krishna. Milhares de devotos corriam atrás Dele, e cavavam a terra para pegar a poeira de Seus pés de lótus, assim surgiram grandes buracos.

Sri Chaitanya Mahaprabhu conduziu uma vida de erudito como Nimai Pandita por volta de dezoito anos. Depois disso, viajou por todo comprimento e extensão da Índia, inclusive Vrindavana, por seis anos aproximadamente. Permaneceu continuamente em Jagannatha Puri nos últimos dezoito anos de vida. Misturou-Se com o público nos seis primeiros anos de Seu sannyasa. Nos últimos doze anos, quase Se retirou de toda sociedade humana e Se ocupou profundamente em saborear união em separação de Radha-Govinda. Expressou muitos sintomas de êxtase extraordinários, que nunca tinham sido experimentados antes em nenhum lugar ou mesmo ouvido falar. Separação pode produzir efeitos maravilhosos no corpo e na mente.

Sri Gauranga-avatara

Sri Gauranga-avatara possui duas características: A razão aparente de Seu aparecimento é liberar as pessoas em geral do pecado, e dar-lhes o maior alcance da vida - levá-las a Vrindavana, vraja-lila, pela distribuição do santo nome de Krishna. Essa é a verdadeira função do yuga-avatara, encarnação do Supremo para esta era. O Senhor vem para distribuir o som divino e para mostrar como se alcança a posição mais elevada através do som divino. Mas também tem um outro propósito a satisfazer. Uma vez por dia de Brahma - numa kali-yuga especial - Krishna vem pessoalmente no humor de Radharani à procura de Si mesmo. Ele quer saborear o humor de Radharani, para compreender a natureza da profunda ânsia por Krishna que Ela sente, como Ela pode saborear a doçura de Krishna através do humor, e qual é a felicidade que Ela obtém.

Krishna queria experimentar por que Radharani é tão louca por Ele. Krishna pensou: "O que há em Mim, que A deixa incomensuravelmente louca por Mim? Que doçura Ela obtém de Mim? Não consigo descobrir". Ele queria Se adaptar ao humor de Sri Radhika e tentar experimentar Seu próprio Eu com esse temperamento. Assim, veio como Sri Chaitanya.

Quando concebeu essa encarnação, e apresentou a idéia a Srimati Radharani, nos disseram que Radharani respondeu: "Às vezes, rolará no chão loucamente, ao dizer Meu nome, mas não serei capaz de suportar. Cobrirei Seu corpo com minha forma dourada. Não permitirei que role no chão. Vou cobri-Lo com Meu abraço". Aqueles que conhecem o aspecto ontológico de Sri Chaitanyadeva dizem: "Ofereço meus respeitos a Sri Chaitanya Mahaprabhu, cujo humor e cor são de Radharani e cujo Eu interior é Krishna à procura de Si mesmo, a saborear a Si próprio, e que tenta entender por que Radharani é louca por saboreá-Lo e que tipo de doçura Ela encontra Nele". (radha bhava dyuti suvalitam naumi krsna svarupam).

Sri Chaitanya Mahaprabhu permaneceu neste mundo por 48 anos. Nos últimos 12 anos de Sua vida, ocupou-Se com profunda dedicação em Se auto-saborear. Assim como todos são loucos para saborear doçura, Krishna, a doçura personificada, também é louco para saborear a Si próprio.

Introspecção significa conhecer-se. Consciência pode conhecer consciência. Assim como se pode perceber o próprio corpo, ou a consciência pode se auto conceber, o êxtase também pode saborear êxtase. Swarupa Damodara Prabhu, secretário pessoal de Sri Chaitanya Mahaprabhu considerado como Lalita-shakhi, a companheira mais íntima de Srimati Radharani nos passatempos de Krishna, confirma essa afirmação. Ele disse o que é Sri Chaitanyadeva:

radha krsna-pranaya-vikrtir hladini saktir asmad
ekatmanav api bhuvi pura deva-bhedam gatau tau
caitanyakhyam prakatam adhuna tad dvayam caikyam aptam
radha-bhava-dyuti-suvalitam naumi krsna svarupam

"Adoro Sri Chaitanya Mahaprabhu, que é o próprio Krishna, enriquecido com as emoções e esplendor de Srimati Radharani. Radha e Krishna são eternamente unos com identidades individuais separadas, como duas partes, predominante e predominada. Agora, Eles Se uniram novamente como Sri Krishna Chaitanya. Essa transformação inconcebível da potência interna geradora de prazer de Krishna surgiu dos casos amorosos entre Radha e Krishna".

Swarupa Damodara afirma nesse verso que os passatempos de Radha-Krishna e de Sri Chaitanya Mahaprabhu são paralelos e eternos. É difícil dizer se o inverno vem antes do verão, ou é o verão que vem antes do inverno. Os passatempos eternos do Senhor são similares, o movimento roda como num circulo. Por isso, Swarupa Damodara diz: "É difícil afirmar se Chaitanya-avatara vem antes de Krishna-avatara, ou se Krishna-avatara vem antes de Chaitanya-avatara - ambos são eternos".

Quem é Sri Radha? Ela é o desenvolvimento da doçura que emana do próprio Krishna. A doçura emana de Krishna numa forma desenvolvida como Radha: Srimati Radharani é uma potência especial que vem de Krishna: hladini-shakti. Portanto, Radha e Krishna não podem ser concebidos como entidades separadas, os dois são unos e iguais. Ainda assim, foi dito que em tempos remotos foram divididos em dois, e novamente Se combinaram como Sri Chaitanya Mahaprabhu, cujo esplendor e humor são de Srimati Radharani, e cuja natureza e realidade interna são de Sri Krishna. Fogo e calor não existem separadamente; sol e luz não podem existir separadamente. Eles são unos. A Verdade Absoluta é uma substância absoluta (advaya-jñana), mas às vezes, Radha e Govinda Se mostram divididos e outra vez, unidos. Quando estão juntos, desfrutam um do outro, e às vezes experimentam separação dolorosa sem possibilidade de união. Essa é a natureza divina Deles.

Sri Rupa Goswami explica:

aher iva gatih premnah
svabhava-kutila bhavet
ato hetor ahetos ca
yunor mana udancati

Ele diz que do mesmo modo como uma serpente se move tortuosa naturalmente, num ziguezague, a característica do amor é naturalmente tortuosa. Não é certa. Assim, as partes envolvidas brigam, às vezes com motivo e outras sem motivo, e aí vem a separação. A separação é necessária nos passatempos transcendentais de Radha e Krishna.

As Dores da Separação

Há quatro tipos de separação: purva-raga, mana, prabasa e prema-vaicittya. Purva-raga quer dizer antes do encontro. Acontece quando Radha e Govinda não Se encontram realmente, mas um entrou em contato remoto com o outro, através do nome, retrato, ou algo desse tipo. Quando Radha ouve o nome de Krishna ou o som de Sua flauta, não aconteceu um encontro real, mas há uma conexão. O som da flauta de Krishna, um retrato de Krishna ou o nome de Krishna podem produzir purva-raga. Krishna pode experimentar algo similar, ao ouvir o som do nome de Srimati Radharani. Há dores de separação, mas não acontece o encontro real. O nome é tão doce que Ele não consegue Se conter; Ela não consegue Se conter.

Quando o santo nome de Krishna penetra nos ouvidos de Srimati Radharani, Ela fica perturbada, e pensa: "Haverá um nome mais doce que esse dentro deste mundo"? É a reação Dela, e também experimenta dor. Ela sente: "Não posso encontrá-Lo". Vem uma dor de separação em Seu coração. Isso é purva-raga: a dor de separação que vem antes do encontro.

Mana é outro tipo de separação. Mana quer dizer que durante um encontro, há algum desentendimento entre Eles devido a frivolidades. Essa é a natureza do amor. Por isso, Srila Rupa Goswami diz que o amor se move tortuoso como uma serpente. Não é defeito, é a própria natureza do caminho do amor. Às vezes, por algum motivo insignificante, ou sem motivo nenhum, vem um sentimento: "Ele Me negligenciou, Ele Me evitou". Assim, Srimati Radharani pensa: "Não quero Sua companhia". Embora haja cem por cento de apreciação, num momento qualquer, surgem sentimentos opostos ocultos: há um conflito nos sentimentos dos dois, e um quer deixar a companhia do outro.

Ciúme Transcendental

No prema-vaicittya, o ciúme cresce tanto que mesmo quando estão juntos, vem um tipo de pensamento interior, que Os faz achar que estão longe um do outro. Esses tipos de separação existem apenas no madhurya-rasa. Prema-vaicittya é uma condição que surge quando Krishna e Radharani estão pertos, mas quando Ela vê Sua própria sombra refletida no corpo de Krishna, fica tão enciumada, a ponto de pensar que é outra mulher. Aí, vêm fortes dores de separação, e Ela pensa: "Que é isso? Tem outra mulher ali"! Ela fica revoltada. Mas, Sua amiga Lalita avisa: "Que disse? É somente Sua imagem refletida. Não consegue ver"? Aí, Radharani volta a Si. Ela própria reconhece: "Oh, sim, é Minha sombra". Então, o sentimento se vai imediatamente. Esse é um exemplo de prema-vaicittya. Esses assuntos são extremamente elevados no plano transcendental, mesmo que não devam ser discutidos em detalhes, essa é a natureza do amor divino em união e separação. Ambos são interdependentes, pois um não permanece sem o outro, e cria-se separação pelo desejo de incrementar a união.

Prabhasa é outro tipo de separação. Há dois tipos de prabhasa: um é quando a separação é por tempo limitado, e o outro, quando alguém parte para um pais distante, como quando Krishna foi para Mathura, cumprir outras obrigações.

Esses são os quatro tipos de dores de separação entre amante e amada.

É claro que esses assuntos são muito elevados, não devemos discuti-los negligentemente, pois projetaremos características mundanas no plano superior e danificaremos nossa realização futura. Nossa experiência mundana tende a nos puxar para baixo, por isso, devemos prosseguir com cuidado. O que concebemos no presente não se encontra no plano dos passatempos de Krishna - plano de existência muito superior ao reino da nossa experiência. Nossa visão é adulterada. Temos apenas um conceito imperfeito do original. Devemos manter essa mentalidade e devemos lidar com esses assuntos com muito cuidado.

É mais seguro lidar com tópicos de separação entre Radha e Govinda do que Sua união. Claro que precisamos entender que a dor de separação experimentada por Radha e Govinda nada tem a ver com este plano. Assim, com essa cautela, podemos conversar um pouco sobre separação; mas é extremamente perigoso discutir ou pensar a respeito de quando Radha e Govinda estão juntos com Seus companheiros íntimos, no desfrute da companhia mútua, pois, se lidarmos com os passatempos de Radha e Krishna com algum conceito mundano, produziremos uma grande ofensa. Por isso, é mais perigoso conceber sobre a união entre Radha e Govinda do que cultivar sentimentos de separação, da mesma forma como Mahaprabhu mostrou com Seu exemplo pessoal.

Sri Chaitanya Mahaprabhu pensava, em separação de Krishna: "Não consigo suportar Minha própria vida sem Krishna! Não posso manter Minha existência indesejável sem Sua graça, sem Sua companhia". Esse tipo de humor nos ajuda, mesmo assim, não devemos imitá-Lo; ao contrário, devemos aceitá-Lo como nosso maior ideal. Isso ajudará a varrer de lado todos nossos maus hábitos imundos indesejados (anarthas). Se vierem algumas lágrimas, não devemos pensar que alcançamos o estágio mais elevado, tal mentalidade deve ser evitada. O próprio Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Não tenho uma única gota de amor divino dentro de Mim, senão, como poderia manter Minha vida mundana"?

Sri Chaitanya Mahaprabhu aceitou sannyasa para que os habitantes de Navadwip mergulhassem no estágio sublime de separação através da força da afeição. Sua velha mãe Shachidevi chorava desesperadamente. Sua jovem esposa Vishnupriya-devi vivia desamparada. Mahaprabhu aceitou sannyasa para criar excitação, ao perfurar o coração das pessoas com o amor divino que veio distribuir. Elas pensavam: "Quem era Nimai Pandita? Que grande benefício Ele veio nos trazer"? O fato de ter abandonado tudo, atraiu a simpatia deles. O Senhor foi aceitar sannyasa por todos esses motivos.

"Devo correr para Vrindavana"!

Sri Chaitanya Mahaprabhu ficou louco após a cerimônia de sannyasa, Ele pensou: "Devo correr para Vrindavana. Abandonei toda conexão com este mundo. Não tenho nenhuma atração por ele. Devo correr para Vrindavana a fim de Me ocupar exclusivamente no serviço a Krishna". Começou a cantar um verso do Srimad Bhagavatam em transe, onde Krishna descreve sannyasa para Uddhava. O verso foi dito por um tridandi-bhiksu, um mendicante. Mahaprabhu citou o verso, e pensou: "Aceitei o hábito de sannyasi por ser favorável à Minha vida espiritual. Agora, ninguém mais na sociedade pode reclamar de Mim, estou apto a Me devotar exclusivamente ao serviço de Krishna. Vou para Vrindavana sem nenhuma obrigação ou conexão pessoal". Ele começou a cantar e dançar em loucura extática. Keshava Bharati O abraçou, e discípulo e guru se uniram, a cantar e dançar. Foi aí que Mahaprabhu disse o verso do brahmana que aceitou tridandi-sannyasa nos últimos momentos da vida, e teve de tolerar a tortura da sociedade em várias formas. Ele disse:

etam sa asthaya paratma-nistham
adhyasitam purvatamair maharsibhih
aham tarisami duranta-param
tamo mukundanghri-nisevayaiva

"Os grandes sábios antigos aceitaram e mostraram o caminho de sannyasa. Acabei de aceitar essa forma de vida. Agora, devo correr para Vrindavana, e deixar tudo para trás. Lá, cruzarei o oceano da ignorância, por aceitar o nome de Mukunda, Krishna. Alcançarei Vrindavana e entrarei plenamente no serviço a Krishna, após atravessar esta maya".

A vestimenta de sannyasi se destina apenas a um ajuste externo, o propósito verdadeiro é servir a Mukunda. E assim, partiu repentinamente de Katwa para Vrindavana. Ele entrava na selva nas margens do Ganges, e pensava: "Agora, Meu objetivo é chegar a Vrindavana o mais rápido possível, e lá, num lugar solitário, vou Me sentar, e cantar e recitar o nome de Krishna".

Sri Chaitanya Mahaprabhu correu para Vrindavana e entrou na selva antes do anoitecer. Nityananda Prabhu. Chandrashekhara Acharya, Mukunda Datta, e Jagadananda perseguiram-No selva adentro. Às vezes durante a corrida, Ele caía no chão de repente e começava a gritar: "Krishna, Krishna"! Levantava-Se subitamente e começava a correr sem direção especifica, nem norte, leste, oeste ou sul.

A Vagar em Transe

Às vezes Ele corria tão rápido que os devotos não conseguiam acompanhá-Lo; geralmente O perdiam à noite, na escuridão. Aí, ficavam muito desapontados, e pensavam: "Sri Chaitanya Mahaprabhu, nosso Senhor e mestre, nos abandonou"! Mas inesperadamente, eles O ouviam de longe, a gritar: "Krishna, Krishna, Krishna"! num comovente tom lastimável. Eles corriam naquela direção e O viam caído no chão, a gritar:

kahan mora prana natha murali-vadana
kahan karon kahan pan vrajendra-nandana

"Onde está Meu amado Krishna? Não posso tolerar a separação Dele. Onde está o Senhor da Minha vida, que toca Sua flauta? Que devo fazer? Onde devo ir para encontrar o filho de Nanda Maharaja"? Ele chorava num tom comovente, de derreter o coração. E dizia, totalmente desnorteado, sem consciência de qualquer direção: "Quem é você? Vou para Vrindavana. Por que Me perturba"? Aí novamente, seguiam em direção oeste para Vrindavana, e cuidavam Dele.

Nityananda Prabhu aproveitou o transe de Mahaprabhu e conseguiu convencê-Lo a ir em direção a Shantipura. O Chaitanya Bhagavata menciona que partiram de Katwa em direção oeste até chegarem perto de Vakresvara, cerca de dez quilômetros a nordeste de Dubrarajpura - distrito de Birbhum. Há um lugar em Visramatala, no outro lado do rio Adjat, mencionado como o local de Sri Chaitanya. Foi lá que Sri Chaitanya Mahaprabhu voltou-Se do oeste para o leste, ou de Vrindavana para Shantipura.

Eles andaram por toda noite, e por mais um dia e uma noite. Até que na noite do terceiro dia finalmente voltaram de Kalna para Shantipura, através dos arranjos de Nityananda Prabhu, que apareceu como um renunciante com roupas vermelhas perante Mahaprabhu. Apesar de toda a familiaridade, Sri Chaitanya Mahaprabhu não reconheceu Nityananda. Viu um sannyasi à Sua frente e pensou: "Vou para Vrindavana, e há um sannyasi diante de Mim". Ele disse: "Ó Sripada sannyasi, aonde vai"?

"Irei a Vrindavana com você".

"Falta quanto para Vrindavana"?

Nityananda mostrou-Lhe o Ganges, perto de Kalna, e disse: "Veja só, lá está o Yamuna".

Mahaprabhu disse: "Oh, chegamos tão perto do Yamuna"! Aí, foi tomar banho no Yamuna, a cantar o verso:

cid-ananda-bhanoh sada nanda-sunoh
para-prema-patri drava-brahma-gatri
aghanam lavitri jagat-ksema-dhatri
pavitri-kiryan no vapur mitra-putri

"Ó filha do Sol, apareceu na forma de água, mas é muito querida pelo filho de Nanda, o Sol espiritual. Você dissipa os pecados de todos pecadores. Por favor, purifique este corpo mortal". (Kavi Karnapura, Chaitanya Chandrodaya-nataka, 5.13)

Nityananda Prabhu mandou Chandrashekhara Acharya chamar Adwaita Acharya antes de Sri Chaitanya Mahaprabhu chegar na margem do Ganges. Mahaprabhu perguntou: "É Você, Adwaita? Como sabia que Eu estava em Vrindavana"? Adwaita Acharya disse: "Deve ser algum tipo de brincadeira. Onde quer que esteja é Vrindavana. E para Minha grande alegria, veio aqui, perto do Ganges". "Oh, é o Ganges"?

"Sim".

Mahaprabhu recobrou a consciência externa e disse: "Oh, então é uma conspiração de Nityananda Prabhu. Ele Me trouxe para a margem do Ganges e disse que era o Yamuna. Ele Me pregou uma peça! Caí nessa peça"!

Adwaita Acharya argumentou: "Não, não! Nityananda Prabhu não disse nenhuma mentira. Tomou banho no Yamuna realmente. A confluência do Yamuna com o Ganges começa em Allahabad; o shastra menciona que o lado ocidental é o Yamuna e o oriental, o Ganges. Tomou banho no lado ocidental, portanto, tomou banho no Yamuna, de acordo com as escrituras. Nityananda Prabhu não Lhe disse nenhuma mentira. De qualquer forma, trouxe-Lhe roupas novas; deixe as molhadas e aceite estas novas. Também cozinhei para Você. Jejua há três dias, e hoje deve aceitar caridade em Minha casa como sannyasi, sou um homem pobre". Ele implorou com mãos postas: "Tem de vir". Eles O levaram de barco até Shantipura na casa de Adwaita Acharya. A mãe Shachidevi chegou na manhã seguinte, e Mahaprabhu passou dez ou doze dias em Shantipura, a realizar kirtana.

Que é Vrindavana?

Que é Vrindavana ao certo? É um estágio de consciência. Há diferentes realidades relativas em diferentes estágios de consciência. Tudo emana da força de vontade do Senhor. Ele é o sujeito. Sua potência e livre vontade são subjetivas. O Senhor diz: "Faça-se a luz", e a luz aparece. Ele diz: "Faça-se a água", e a água aparece. Ele diz: "Faça-se a terra", e a terra aparece. É como em hipnotismo, se o sujeito superior desejar que o sujeito inferior veja algo, ele não conseguirá ver nada além daquilo. Todos nós estamos no mundo imaginário subjetivo, mas existe o plano super subjetivo de realidade. Assim, Krishna Se revela àqueles que desenvolveram consciência pura, e no estágio de consciência pura pode-se perceber a verdadeira natureza da realidade subjetiva (sattvam visuddham vasudeva sabditam).

Mahaprabhu corria de lá para cá em êxtase, para nos mostrar que Vrindavana está em toda parte. Adwaita Prabhu disse, quando Se encontraram: "Deve ser brincadeira quando diz que vai para Vrindavana - onde quer que esteja, lá é Vrindavana. Temos essa experiência. O que diz é muito peculiar: 'Vou para Vrindavana'. Age assim apenas para nos ensinar o valor de Vrindavana".

A Terra do Amor

Vrindavana, o plano mais elevado de divindade, é um estado de consciência. Vrindavana, terra da simplicidade e amor divino, está acima do plano de respeito e reverência encontrado em Vaikuntha. A peculiaridade dos habitantes desse plano superior de consciência é que não sentem que estão em Vrindavana. É aprakrta, supramundano.

O conhecimento é classificado em cinco tipos. O inferior é conhecimento adquirido através da experiência dos sentidos, pratyaksa - o que experimentamos com nossos sentidos. Esse é o primeiro estágio. O próximo estágio superior é o conhecimento não adquirido através dos sentidos, mas sim pela experiência de outros (paroksa), os cientistas têm sua experiência, e obtemos algum conhecimento através de suas invenções e descobertas.

O terceiro estágio está acima da experiência humana (aparoksa). É algo parecido com sono profundo. Quando despertamos, dizemos: "Dormi muito bem, tive um sono muito gostoso". Mas no estado de sono profundo sem sonho, não nos conscientizamos dessa condição. Temos alguma consciência dessa experiência quando retornamos de um sono profundo sem sonho, mas é nebulosa. Aparoksa é um tipo de experiência nebulosa indistinta, onde sujeito e objeto material se unem, e o objeto material desaparece no sujeito. Shankaracharya, o grande proponente do impersonalismo, explica o desenvolvimento da consciência até esse ponto.

A Quarta Dimensão

Por outro lado, o grande devoto e erudito Ramanujacharya, bem como outros acharyas Vaishnavas, são da opinião de que existe um quarto estágio além desse. O plano é chamado adoksaja, transcendental, aquilo que está além do alcance dos sentidos, tanto grosseiros quanto sutis. Só podemos experimentar esse plano se ele descender a nosso plano de compreensão por sua livre e espontânea vontade. Se ele se retirar, estaremos perdidos, não poderemos encontrá-lo. Não podemos afirmar que a Verdade Absoluta está sob controle de nosso conhecimento. Não podemos medi-la. Ela é independente. Pode descender por sua livre vontade, e assim poderemos experimentar o reino superior, mas se estiver ausente, estaremos perdidos, não poderemos fazer nada. Podemos chorar ou orar, mas não podemos entrar lá à força pelo nosso próprio esforço. Esse é o quarto plano de consciência, é grandioso, todo-poderoso, e pleno de inspiração. Podemos ter alguma experiência desse plano conhecido como Vaikuntha, região espiritual ilimitada de reverência e poder, somente se ele se revelar para nós. Esse é o plano adhoksaja.

Assim, há pratyaksa - percepção direta através dos sentidos; paroksa - aprendizado através da experiência de outros; aparoksa - plano negativo de consciência indistinta; e a quarta dimensão: adhoksaja.

Estamos no subterrâneo. Verdadeiro conhecimento está acima, na superfície, além de nossa experiência. Se pudermos perfurar as camadas espessas da nossa experiência, poderemos entrar em contato com outro plano de consciência: ou seja, adhoksaja. Adhoksajam indriyanam jñanam: adhoksaja significa conhecimento superior que pode dominar nosso conhecimento da experiência deste mundo. O quarto estágio de conhecimento é o conhecimento transcendental, supramental. É um plano diferente em todos aspectos. Não é similar a este mundo.

Mas, aprendemos através do Srimad Bhagavatam e Sri Chaitanya Mahaprabhu, que há um quinto estágio de conhecimento muito similar a este mundo mundano, mas que não é mundano. É chamado aprakrta. É Goloka, a concepção teísta plena, só encontrada no reino de Krishna. O conhecimento central do Absoluto deve ter uma conexão até mesmo com o nível mais baixo da criação mundana; deve ser capaz de harmonizar a pior parte do mundo ilusório. Isso é aprakrta, supramundano. A entrada nesse reino mais elevado só é possível através do amor divino.

Tudo só pode ser compensado através do amor. Um ditado indiano diz que a mãe afetuosa pensa que seu filho cego tem belos olhos. Ela está cega de afeição. Por isso, o que é mau e inferior só pode ser compensado pelo amor que brilha maravilhosamente. É prema, amor divino. Um rei pode vir a brincar com um menino na rua por misericórdia, por pena, ou por graça. A afeição torna isso possível. A diferença entre superior e inferior desaparece em tal estágio.

A Encantadora Potência Espiritual

Os habitantes de Vrindavana se consideram pessoas comuns. Isso é jñana-sunya-bhakti, amor divino livre de qualquer cálculo, que não considera até mesmo a opulência e o poder do Senhor. Essa devoção está acima de Vaikuntha e funciona sob o encanto de Yogamaya, a potência encantadora espiritual.

A arte especial de Yogamaya faz com que os que estão situados na posição mais elevada se considerem bem insignificantes. O amor remove a diferença entre grande e pequeno, superior e inferior. Vrindavana é esse plano de existência. É onde se encontra a devoção livre de qualquer traço de avaliação (jñana-sunya-bhakti). Mesmo os habitantes de Vrindavana podem não saber sobre sua posição exaltada.

Adwaita Prabhu disse a Sri Chaitanya Mahaprabhu: "Onde quer que esteja, lá está Vrindavana". Narottama Dasa Thakura diz que onde quer que esteja um devoto de Krishna, lá está Vrindavana, (yata vaisnavagana sei sthana vrndavana, Prema-Bhakti-Chandrika). Podemos pensar serem eles aparentemente membros deste mundo ordinário, mas o objeto de toda sua conversa e comportamento é Vrindavana. Mas mesmo quando estão em Vrindavana, não se sentem lá.

Eles não têm consciência de sua posição exaltada. Quando um rei não tem muita consciência de seu poder, se considera uma pessoa comum. É algo assim. Um médico pode ser muito proeminente, mas pela afeição, pode servir como enfermeiro de seu paciente. Ele pode se rebaixar para fazer tal serviço, por amor e afeição pelo paciente, mas mesmo assim, ele é grandioso. Essa é a bela natureza da vida em Vrindavana. É grande sem a atitude, os ares de grandeza. Embora sejam realmente grandiosos, aparentam simplicidade. O poder revestido em afeição e amor, expresso em humildade - isso é Vrindavana. E isso também é Navadwip.

O Srimad Bhagavatam e o Sri Chaitanya Charitamrita dizem que esse é o local mais louvável de se viver. O Senhor Supremo vive lá com as gopis na floresta. Lá não vemos ostentação ou grandes edifícios, mas, se possuirmos verdadeira visão de grandeza, veremos isso em Vrindavana. É uma posição muito elevada se julgarmos os fatos imparcialmente, mas aparenta estar no nosso nível devido à humildade. Encontramos em Vrindavana um estilo de vida doce e belo. Mahaprabhu veio nos mostrar isso, através do Srimad Bhagavatam. Krishna é o Senhor dessa terra, e as vacas, colinas, florestas e o rio Yamuna criam uma atmosfera agradável.

Assim, Mahaprabhu aceitou sannyasa para nos ensinar, para nos elevar e nos tornar habitantes permanentes desse lugar. Ele diz que, na verdade, nosso verdadeiro eu pertence a esse plano, mas infelizmente, nossa consciência se voltou para o exterior. Agora, estamos capturados pelo aspecto mundano da criação e pensamos que sofremos, mas é tudo ilusão! Precisamos nos aliviar dessa mania. Mania significa loucura, e agora estamos possuídos por alguma mania. Do mesmo jeito como um louco saí de casa e vai pelas ruas a catar pedaços de papel ou pano, estamos iludidos neste mundo, mas, quando a loucura passar, acordaremos no nosso lar verdadeiro.

Um Grande Drama

Precisamos voltar ao lar, de volta ao Supremo. Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Seu lar é uma bela terra. Deve se esforçar por isso. Por que está sempre transtornado com os horrores de guerras, epidemias, terremotos, doenças indesejadas, roubos, assaltos, e brigas com tantos vizinhos? Fundamentando tudo isso, existe o fato de que se identifica com o mundo material e com o corpo de carne e ossos. Tem de retomar o caminho certo e ir para o seu lar". Só isso é necessário. Nossa terra natal é um lugar muito belo, encantador e divino. Sri Chaitanya Mahaprabhu aceitou sannyasa tão só por nós, com o propósito de nos levar de volta ao lar, onde teremos o conforto do lar... lar doce lar. Se tivermos algum vestígio de consciência de lar, aprovaremos essa proposta: Lar doce lar.

O sannyasa de Sri Chaitanya Mahaprabhu foi aparentemente muito cruel para Seus devotos e membros familiares, mas destinou-se apenas a nos levar de volta ao lar. Foi preciso que Sri Chaitanya Mahaprabhu mostrasse a separação a Seus devotos e parentes, para experimentar o êxtase de união. Separação e união são ambos mutuamente benéficos. O sannyasa de Mahaprabhu, Sua renúncia, é um grande drama de separação.

 

Parte 2

 

Shikshastakam

 

Os Ensinamentos de Sri Chaitanya Mahaprabhu

 

sri-svarupa-raya-sanga-gambhirantya-lilanam
dvadasabda-banhi-garba-vipralambha-silanam
radhikahirudha-bhava-kanti-krsna-kunjaram
prema-dhama-devam-eva-naumi-gaura-sundaram

"Ao mergulhar fundo na realidade de Sua própria beleza e doçura, Krishna roubou o humor de Radharani e, depois de Se vestir com o esplendor do brilho Dela, apareceu como Sri Chaitanya Mahaprabhu. Nos últimos doze anos de Seus passatempos manifestos, Ele Se absorveu profundamente no humor de união e separação, e compartilhou os sentimentos íntimos de Seu coração com Seus devotos mais confidenciais. Na agonia da separação de Krishna, erupções vulcânicas fluíam de Seu coração, e Seus ensinamentos, conhecidos como Shikshastakam, apareceram em Seus lábios como torrentes de lava dourada".
Prema Dhama Strotram (verso 54).

 

1

O

Santo Nome

de

Krishna

 

ceto-darpana-marjanam bhava-maha-davagni-nirvapanam
sreyah-kairava-candrika-vitaranam vidya-vadhu-jivanam
anandambudhi-vardhanam prati-padam purnamrtasvadanam
sarvatma snapanam param vijayate sri-krsna-sankirtanam

Tradução

"O santo nome de Krishna limpa o espelho do coração e extingue o fogo da miséria na floresta de nascimento e morte.

Como o lótus noturno floresce nos raios refrescantes do luar, o coração começa a florir no néctar do nome.

Por fim a alma desperta ao seu tesouro interno real - uma vida de amor com Krishna.

Repetidamente a saborear néctar, a alma mergulha e vem à tona no oceano sempre crescente de felicidade extática.

Todas as fases do ser que podemos conceber estão plenamente satisfeitas e purificadas, finalmente conquistadas pela todo-auspiciosa influência do santo nome de Krishna".

Iluminação

Sri Chaitanya Mahaprabhu é o pioneiro de Sri Krishna Sankirtana. Ele disse: "Vim para inaugurar o cantar do santo nome de Krishna, e o nome alcançará cada rincão e canto do universo (prthivita ache yata nagaradi-grama sarvatra pracara haibe mora nama)".

O que significa sankirtana? Samyak quer dizer "cheio" e kirtana, "canto". As duas palavras juntas formam sankirtana que geralmente significa: "canto coletivo do santo nome de Krishna". Samyak significa cheio não apenas em quantidade mas também em qualidade. Cheio em quantidade quer dizer extensivo em número, coletivo. Cheio em qualidade significa oração plena. Oração plena só pode significar glorificação a Krishna, e a nenhum outro deus.

Assim, sankirtana significa kirtana completo, uma canção em louvor ao todo completo, à Verdade Absoluta; qualquer coisa além disso é uma representação parcial sujeita, até certo ponto, a defeitos. Portanto, Krishna deve ser louvado. Suas glórias devem ser cantadas, porque Ele é tudo. Ele é o mestre, o distribuidor tanto do bem quanto do mal, o Controlador Absoluto de tudo. Tudo existe devido a Ele. O propósito da vida é satisfeito somente Nele. Do mesmo modo como um cavalo pode ter seus movimentos controlados por uma rédea, e correrá livremente se for solto, a prece que não é obstruída por nenhum propósito mundano, correrá direto à Suprema Causa, Krishna.

A palavra sri significa Lakshmidevi, a potência de Krishna. Isso quer dizer que no sankirtana, Krishna é adorado junto com Sua potência, pois a potência de Krishna está incluída Nele.

Sri Chaitanya Mahaprabhu diz que sri-krsna-sankirtana florescerá por todo o mundo; será vitorioso sem nenhum empecilho (param vijayate sri-krsna-sankirtanam). Deve ser espontâneo, sem restrições e fluir naturalmente. Deve ser exclusivo, independente e sem reservas. A prece a Krishna deve ser cantada conjuntamente, é uma vibração benéfica para o mundo inteiro. Só se pode realizar sri-krsna-sankirtana pela rendição e devoção pura.

Limpeza do Espelho da Mente

Quais são os diferentes estágios pelos quais passaremos ao cantar o santo nome de Krishna? O primeiro estágio é a limpeza do espelho da mente. Se o espelho do sistema mental estiver coberto de poeira, não veremos as coisas claramente, e não refletiremos corretamente o conselho das escrituras. Quais são os diferentes tipos de cobertura de poeira no espelho da mente? Nossos desejos infinitos, fugazes e organizados são considerados poeira, e nossos corações e mentes estão cobertos com várias camadas dessa poeira. Assim, não podemos ver as coisas devidamente, pois não refletirão adequadamente em nossa mente, coberta com infinitos desejos ordinários desta vida mundana (bhukti-mukti-siddhikami-sakali 'asanta').

Portanto, o primeiro efeito de sri-krsna-sankirtana é a limpeza da mente. O sistema social védico (varnashrama-dharma) foi formado com esse objetivo. Se executarmos nossos deveres sociais perfeitamente, sem nenhuma atração pelas conseqüências, obteremos purificação da consciência - mas o primeiro estágio de nama-sankirtana nos concede o resultado final de varnashrama-dharma: a purificação do coração e da mente. Assim entenderemos corretamente o conselho védico.

O próximo efeito do cantar do santo nome é que extingue o fogo da existência material na floresta de repetidos nascimentos e mortes. Somos forçados à criação e, novamente, à morte. A onda mundana pega a alma, que se mistura com sua vibração em diferentes estágios. O segundo efeito de sri-krsna-sankirtana interrompe isso, e nos tornaremos liberados.

No primeiro passo a inteligência é purificada. No segundo passo, o santo nome causa a liberação da grande conflagração das três misérias. As três misérias são adhyatmika: misérias da mente e do corpo, como doenças e ansiedade mental; adhibhautika: misérias causadas por vizinhos: humanos, animais, insetos e tantas outras criaturas; e adhidaivika: catástrofes naturais como fome, enchentes e terremotos. Temos de sofrer esses três tipos de misérias que queimam no coração como fogo. Mas tudo isso é extinto para sempre através do segundo passo de nama-sankirtana que nos concede alívio.

O Objetivo Supremo da Vida

O próximo estágio é sreyah kairava candrikavitaranam: o santo nome nos concede o objetivo supremo da vida. Após nos livrarmos dessas duas ocupações negativas, começa a ocupação positiva que nos levará finalmente à realidade, à verdade real, que é eterna, auspiciosa e bela. Ele nos leva à essa situação auspiciosa que está além deste mundo de dificuldade, e de um modo geral, alcançamos o objetivo supremo, sublimemente auspicioso, o melhor benefício através do cantar do santo nome de Krishna. Se analisarmos esse estágio minuciosamente, veremos que o santo nome nos conduz a uma relação pessoal íntima com Krishna, que compreende neutralidade, servidão, amizade e afeição paternal (santa, dasya, sakhya e vatsalya rasa). Sreyah abriga a graça de Nityananda Prabhu, pois é pela graça Dele que podemos obter permissão para adorar Radha e Krishna em Vrindavana (nitaiyer karuna habe braje radha krsna pabe).

O próximo estágio é vidya-vadhu-jivanam. O santo nome nos prepara para a rendição indiscriminada a Krishna, encontrada no amor conjugal (madhurya-rasa), onde os devotos se rendem infinitamente à disposição de Krishna.

O estágio seguinte é anandambudhi-vardhanam. Quando alcançamos o nível adequado durante o cantar do nome de Krishna, encontramos o oceano transcendental, que está além de qualquer tipo de experiência. O nome vem para se afirmar sobre nós, conforme o grau de nossa rendição, e quando a rendição for total, sentiremos um novo tipo de alegria extática; experimentaremos um oceano infinito de felicidade que não é estática, mas sempre dinâmica. Lá, encontraremos vida nova e um novo tipo de bem-aventurança. Nunca se tornará sem graça ou estática, mas vamos saborear a cada momento o sabor do oceano infinito de êxtase.

Auto-Purificação Total

O último efeito é que nossa existência é plenamente purificada. Esse tipo de desfrute não polui - purifica. Desfrute quer dizer exploração. Desfrute mundano gera reação e a poluição atrai o desfrutador, mas aqui, como Krishna é o agressor, o resultado é purificação. Todo desfrute que vem do centro, do desejo autocrático de Krishna, purifica-nos plenamente.

As palavras sarvatma-snapanam nesse verso significam que todas as diversas fases do eu, que podem ser concebidas, são totalmente satisfeitas e purificadas imediatamente pelo cantar do santo nome de Krishna. Há um outro significado para sarvatma-snapanam. Se orarmos a Krishna coletivamente, seremos purificados conforme nossa capacidade. Qualquer um que entrar em contato com o som transcendental será purificado, tanto o cantor quanto a audiência. Snapanam significa "purificação". Essa vibração purifica tudo e todos que entrarem em contato com ela.

Assim, Mahaprabhu diz: "Continuem com o sankirtana, o canto coletivo do santo nome de Krishna". É claro que sankirtana tem de ser genuíno, por isso é necessária a associação dos santos. Não é uma tentativa empírica. Tentamos uma conexão com o reino sublime e incondicional que pode descender aqui para nos ajudar. Precisamos dessa conexão fundamental com a realidade superior. O nome de Krishna não é um som meramente físico, não é superficial, é algo imenso e elevado (nama aksara bahiraya bate tabu name kabhu naya). Estamos no plano de existência marginal, portanto, precisamos de alguma conexão superior para que a onda desça do reino superior, venha a nós e propague sua influência externamente também.

O sankirtana do santo nome de Krishna produzirá esses sete resultados onde quer que esteja. Esse é o significado do primeiro verso de Mahaprabhu. O primeiro efeito é que o santo nome limpa a alma, atacada pela sujeira dos desejos mundanos. O segundo efeito concede mukti, liberação, independência perfeita das forças materiais. O terceiro efeito traz a verdadeira fortuna: a abertura do tesouro da alma. As riquezas naturais da alma despertam gradualmente através do santo nome de Krishna. Sri Chaitanya Mahaprabhu inclui aqui as outras formas de relacionamento com a Personalidade Absoluta. Ele assume o humor de devoção conjugal para descrever o próximo passo, onde se está totalmente à disposição para o desfrute de Krishna, com a rendição incondicional de tudo para Seu máximo prazer.

Eu Precisaria de Milhões de Bocas

O passo seguinte é saborear Sua companhia extática. Quem pode cantar o santo nome de Krishna propriamente em Vrindavana, o reino de Krishna, vai se expressar com um tipo de ego peculiar:

tunde tandavini ratim vitanute tundavali-labdhaye
karna-kroda-kadambini ghatayate karnarbudebhyah sprham
ceta-prangana-sangini vijayate sarvendriyanam krtim
no jane janita kiyadbhir amrtaih krsneti varna-dvayi

"Quando o santo nome aparece nos lábios de um devoto, este começa a dançar loucamente. Aí, o nome domina e assume o controle sobre ele, como se perdesse o controle de seus próprios lábios, e o devoto diz: 'Como posso capturar o êxtase do santo nome com uma boca só? Preciso de milhões de bocas para saborear sua doçura ilimitada. Nunca ficarei satisfeito apenas por cantar com uma única boca'".

Quando o som "Krishna" entra nos ouvidos, ele sente que o som transcendental desperta em seu coração. Ele pensa: "Por que só dois ouvidos? Isso é uma grande injustiça do criador - preciso de milhões de ouvidos! Assim, meu coração poderia ficar um pouco satisfeito quando ouvisse o doce nome de Krishna. Quero milhões e milhões de ouvidos para ouvir o doce nome de Krishna". Esse é o temperamento do devoto quando sua atenção está dirigida ao santo nome. Aí, ele desmaia, perde os sentidos, ao mergulhar num oceano de êxtase e felicidade. E diz muito desapontado: "Falhei em compreender a qualidade e quantidade de substância do nome de Krishna. Estou perplexo. Que tipo de mel doce está contido no nome"? E assim, o cantor do nome fica maravilhado.

A Mística Música da Flauta de Krishna

Foi Sri Chaitanya Mahaprabhu quem nos ensinou isso, Ele disse: "Cantem corretamente o santo nome, a representação sonora da doçura absoluta". Essa doçura também se encontra na música da flauta do Senhor. O som da flauta de Krishna tem o grande poder místico de capturar e satisfazer a todos e tudo. A corrente do Yamuna ficou paralisada quando ouviu o som da flauta de Krishna. O doce som da flauta de Krishna atrai as árvores, os pássaros e os animais. Tudo que entra em contato com a doce vibração da flauta de Krishna fica atônito.

A vibração sonora pode fazer milagres, o som possui a mais elevada potência de captura. O som pode criar ou destruir. Pode fazer qualquer coisa, e tem uma grande capacidade intrínseca. Vem do plano mais sutil, além do éter. O som universal é doçura e bondade absolutas. Quão poderoso é ele - como pode nos capturar! Poderemos ser levados como uma folha de grama na corrente desse doce som, a ponto de não reconhecermos nossa própria personalidade. Podemos nos perder lá, mas não morreremos; a alma é eterna. Somos levados pela corrente do som divino, a mergulhar e emergir. Somos menos qualificados do que uma folha de grama, e o som de Krishna é tão grande e tão doce que pode nos levar do jeito que bem entender. Não podemos começar a conceber quanto poder existe no nome, o som que é idêntico à bondade e doçura absolutas.

Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Não negligenciem o som que é uno e idêntico a Krishna". Doçura e bondade absolutas - tudo está dentro do santo nome. E o santo nome se apresenta a nós, numa forma muita barata, não é necessário nada para adquiri-lo - nem dinheiro, nem esforço físico. Tudo isso é desnecessário. O que é preciso? Sinceridade.

Quem quer que simples e sinceramente aceite o som divino, ficará tão enriquecido, que ninguém será capaz de conceber tanta bondade e desenvolvimento. Qualquer um pode conseguir isso facilmente, mas tem de cantar sinceramente, do fundo do coração. É claro que sinceridade de todo coração pressupõe ir a um agente adequado, um santo, e obter o santo nome Dele.

Sri krsna sankirtana é exaltado por Sri Chaitanya Mahaprabhu, inaugurador do movimento sankirtana, que veio como Radha-Govinda combinados. Seu conselho é extremamente valioso e necessário para nos dizer que devemos aderir com espírito sincero ao sri krsna sankirtana, o som transcendental mais purificante, que causa liberação, satisfaz plenamente, e nos concede tamanho alcance positivo, que faz com que nos percamos no oceano de felicidade e doçura inconcebíveis.

Essa é a graça de Sriman Mahaprabhu, e Ele proclama: "Que sri krsna sankirtana se expanda neste mundo mortal, porque beneficiará todo mundo infinitamente. É plenamente compreensivo. Alivia todos os tipos de problemas, por nos situar na posição de alcance mais exaltada".

Somente nama-sankirtana pode nos ajudar nesta presente e degradada era de Kali. Claro que nama-sankirtana é benéfico em qualquer era, mas é especialmente recomendado para kali-yuga, pois nesta era todas as outras tentativas sofrerão oposição de muitas forças. Nama-sankirtana não pode ser impedido pelos problemas e ondas deste mundo material, por isso, é preciso adotá-lo. Obteremos a realização mais sublime da vida se nos dedicarmos exclusivamente a isso. Não é preciso nenhum outro tipo de campanha, pois todas serão defeituosas e parciais. O que existe de mais universal, cativante e benéfico é nama-sankirtana, que nos leva ao objetivo supremo. Ele, exclusivamente, pode satisfazer a todos.

Todas as almas que estão desconectadas de Krishna podem ser ajudadas dessa forma. Não é necessário nenhum outro movimento. Sri Chaitanya Mahaprabhu nos diz: "Devote-se exclusivamente a isso. É plenamente abrangente e gratificante. Pode obtê-lo com o mínimo de esforço e energia. Que floresça em kali-yuga - que floresça para o bem-estar de todo o universo, para restabelecer todas as almas em suas posições normais".

A conclusão do Srimad Bhagavatam está em seu último verso:

nama sankirtanam yasya
sarva papa pranasanam
pranamo duhkasamanas
namami harim param

Papa quer dizer todas as anomalias, tudo que não é desejado, o pecado. Desfrute material e liberação também estão incluídos nas anomalias, atividades pecaminosas. Por que a liberação é considerada pecado? Porque é uma condição anormal. Nossa função natural é servir a Krishna, e não se faz isso na salvação. Mera salvação não inclui serviço a Krishna, por isso é uma posição anormal e, portanto, também é pecado. Ignorar nosso dever natural e permanecer alienado só pode ser pecado.

O Presente Espiritual de Vyasa

O verso de conclusão do Srimad Bhagavatam diz: "O santo nome de Krishna pode nos livrar de toda pecabilidade indesejada, de todas as características poluídas, e de todas as misérias. Prostremo-nos a Ele". O Srimad Bhagavatam pára após pronunciar esse verso; essa grande obra silencia. A última palavra do Srimad Bhagavatam é nama-sankirtana. O Bhagavatam deu enorme importância ao cantar do santo nome de Krishna, e Sri Chaitanya Mahaprabhu o desenvolveu a partir daí. A última publicação do compilador das literaturas Védicas, Srila Vyasadeva, levou o teísmo a esse estágio, e o concedeu ao público, com o anúncio: "Cante o nome de Krishna! Faça isso: nada mais é necessário. Aceite isso"! Essa é a conclusão final do Srimad Bhagavatam, o grandioso presente espiritual de Vyasadeva: "Cante o santo nome de Krishna e nesta era de escuridão, comece sua vida com a mais generosa e vasta concepção teísta".

Néctar do Nectáreo

Podemos nos considerar afortunados de alcançar os arredores desse pensamento mais generoso e útil, de termos chegado perto o suficiente para tocá-lo, para aceitá-lo e flutuar em suas ondas conforme nossa capacidade.

Após passarmos por tantas concepções e pelo encanto de diversos prospectos, deixamos todos de lado e chegamos à margem do oceano de nama-sankirtana. Agora podemos atirar nossos corpos nesse oceano e começar a nadar nas ondas de nama-sankirtana, o néctar do nectáreo, pela graça do guru e pela misericórdia dos Vaishnavas.

Eles são os proprietários, e nós somos seus escravos. Temos tal audácia de atirarmos nosso corpo nesse oceano de nama-sankirtana e nadarmos nesse oceano nectáreo! A concepção mais elevada de alcance espiritual que é nadar em Radha-kunda, também se encontra em nama-sankirtana. Esse verso representa o lado positivo do oceano ilimitado de sri krsna sankirtana. O verso seguinte explica as possibilidades negativas.

Bhaktivinoda Thakura elaborou um comentário do Shikshastakam em sânscrito, e também uma tradução em bengali. Sua apresentação é a mais original. Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura Prabhupada também nos deu seu comentário sobre Shikshastakam. Eles devem ser estudados cuidadosamente a fim de compreendermos esses pontos totalmente. Entretanto, nestas conversas, apenas deixo sair o que sinto no coração. Expresso qualquer coisa a respeito desses versos que me venha à cabeça, e isso resulta do que lembro de Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura, Bhaktivinoda Thakura, Rupa Goswami, Sanatana Goswami, Sri Chaitanya Mahaprabhu e todos os acharyas predecessores. Pela graça Deles, isso está arquivado no meu depósito, e tento transmitir a essência de tudo isso.

O Conceito Krishna Conquista Tudo

Quando aceitamos o caminho da devoção, começa uma transformação global em nosso sistema interno, e a atração pelo mundo externo é aniquilada gradualmente. Acontece uma guerra interior, e quando o conceito Krishna entra no coração do devoto, todos os outros pensamentos e idéias têm de se retirar gradualmente. Isso é explicado no Srimad Bhagavatam (2.8.5):

pravistah karna-randhrena
svanam bhava-saroruham
dhunoti samalam krsnah
salilasya yatha sarat

Quando o outono chega, a lama da água desaparece. Da mesma forma, quando o conceito Krishna entra no coração, todos os outros pensamentos e aspirações têm de se retirar gradualmente, para deixar Krishna tomar posse de tudo. Ao entrar uma gota de verdadeira consciência de Krishna no coração, todas as forças oponentes terão de sair, e Krishna conquistará e tomará posse de tudo.

Essa é a natureza da consciência de Krishna: nada pode competir com ela, nem mesmo a assim chamada devoção por semideus ou fé em credos como Cristianismo, Islamismo, e outros. Todas as outras concepções de teísmo têm de se retirar, e deixar o campo para a concepção Krishna. Nenhum agressor pode enfrentar a luta com a consciência de Krishna, o belo e doce absoluto.

Beleza, doçura e encanto podem capturar e derrotar o poder. Na verdade, aspiramos por beleza e doçura, misericórdia, afeição, amor divino (prema). Auto-abnegação - para compensar outros com a própria energia e generosidade - finalmente conquista todos. É mais recompensador dar do que tomar. Amor divino significa morrer para viver: não viver para si mesmo, mas viver para os outros. A forma de vida mais generosa - auto-esquecimento ao extremo - é encontrada na consciência de Krishna.

A consciência de Krishna é tão bela que aquele que a desenvolve, perde sua própria identidade e existência também. Ele fica completamente esquecido de si mesmo. Tal é o encanto. Quem vai enfrentar Krishna numa luta? Todos que vêm lutar com Ele são desarmados. E se por acaso Krishna entrar no coração, não haverá nenhuma outra conseqüência além Dele tomar posse de tudo. Krishna é uma personalidade benevolente, generosa e doce: a realidade, o belo.

 

2

Os

Ilimitados

Nomes de Deus

 

namanyakari bahudha nija-sarvasaktis
tatrarpita niyamita smarane na kalah
etadrsi tava krpa bhagavan mamapi
durdaivam idrsam ihajani nanuragah

Tradução

"Ó meu Senhor, Seu santo nome
a todos concede boa ventura.
E possui ilimitados nomes
como Krishna e Govinda,
pelos quais Se revela.

Em Seus vários santos nomes
bondosamente investiu
toda Sua potência transcendental.
Para cantar esses nomes,
não há regras estritas
sobre tempo ou local.

Por Sua misericórdia sem causa
descendeu
na forma do divino som,
mas minha imensa má sorte
é não ter amor
por Seu santo nome".

Iluminação

Foi dito aqui: "Ó meu Senhor, revelou o cantar de Seu santo nome, e investiu todo Seu poder nesses nomes". Tanto o santo nome de Krishna quanto Sua potência são eternos. Todas as potências e energias se encontram dentro do santo nome de Krishna. E não existe tempo ou local em particular, fixados para cantar o nome. Não é necessário que se cante apenas pela manhã, ou só depois de tomar banho, ou quando se for a um local sagrado - essas condições não existem. Pode-se cantar o santo nome de Krishna a qualquer hora, em qualquer lugar, e sob qualquer circunstância.

Sri Chaitanya Mahaprabhu diz nesse verso: "Ó Krishna, deu a oportunidade mais sublime a todos. É tão infinitamente gracioso que nos concedeu o serviço a Seu santo nome (nama-bhajana). Mesmo assim, minha má sorte é a pior. Não encontro nenhum desejo intenso dentro de mim para aceitar o nome. Não vejo nenhuma ânsia natural para cantar o nome. O que posso fazer"?

Esse é o segundo dos oito preceitos de Sriman Mahaprabhu. Ele diz: "Ó Senhor, fez de tudo para me elevar deste mundo de relatividade. Sua tentativa em me libertar é tão magnânima, tudo que me pede é um pouco de cooperação em aceitar Sua graça, mas minha audição ensurdece ao Seu chamado magnânimo. Ó Senhor, estou perdido".

Sri Chaitanya Mahaprabhu nos deu muita esperança no primeiro verso de Seu Shikshastakam ou oito preceitos. Ele explica que o cantar do santo nome de Krishna, quando empreendido corretamente, progride passo a passo, e revela sete conseqüências. O primeiro efeito é limpeza da consciência; o segundo é liberação da relatividade mundana. A bondade positiva desperta em nosso coração como terceiro efeito e nos leva a Vrindavana. Aí, sob a guia de swarupa-shakti - yogamaya, a energia interna do Senhor - alcançamos o conceito vadhu: somos potência, somos destinados a servir a Krishna, incondicionalmente. Vadhu quer dizer o rasa que concede conexão plena com Krishna (madhurya-rasa).

Oceano Extático de Felicidade

Quais as outras conseqüências que advêm, após alcançar esse estágio? A pessoa se torna uma partícula no oceano de felicidade, e essa felicidade não é insípida ou estática, mas sempre nova e dinâmica; é purificante ao extremo. Apesar de termos permissão para manter nosso conceito individual, quando aceitamos o nome, sentimos que todas as partes de nossa existência se purificam ao máximo. Isso não afeta apenas a pessoa, mas todos que se conectarem com nama-sankirtana. Todos experimentarão conversão em massa, a purificação máxima. Esses são os sete resultados de cantar o santo nome.

Após mencionar essa tese em Seu primeiro verso, Mahaprabhu dá a antítese no segundo verso. Se há uma esperança tão grande no santo nome, por que temos tantos problemas? Qual é a dificuldade? Por que não realizamos a vantagem da magnânima aprovação da divindade encontrada no santo nome? Provém uma graça inestimável da parte de Krishna. Ele nos deu tantas oportunidades, e exigiu o mínimo de nós. Precisamos ter algum gosto, alguma ânsia para aceitar o santo nome; aí está a dificuldade - não temos nada disso. Qual a nossa esperança então? Como conseguiremos isso? Podemos nos aproximar do santo nome formalmente, e, não, do fundo do coração; por qual processo então poderemos obter benefício e progredir? O terceiro verso responde a essa pergunta.

Mesmo que a pessoa sinta não possuir o depósito mínimo necessário para receber o benefício, ainda assim, não é um caso perdido. A própria natureza dessa realização a leva à concepção de humildade. Quando alguém começa a praticar devoção ao Senhor infinito, só pode se sentir sem nenhum valor em relação ao infinito. E pensa: "Não tenho nada para retribuir; até o requisito mínimo para receber a graça do Senhor inexiste em mim". Isso o leva ao conceito de que: "Não sou qualificado. Sou completamente vazio".

O devoto sente de coração que não é apenas indigno mas, também, desprezível para o serviço ao Senhor. Krishnadasa Kaviraja Goswami diz: "Sou inferior a um verme no excremento e mais pecaminoso do que Jagai e Madhai (jagai madhai haite muni se papistha purisera kita haite muni se laghistha)". Não devemos ficar desencorajados quando pensamos que não temos nem mesmo o mínimo de mérito necessário para o serviço ao santo nome de Krishna, pois esse tipo de consciência é natural para um devoto.

Ao mesmo tempo, temos que nos prevenir contra uma concepção insincera de nossa própria devoção; esse é o nosso inimigo. Está tudo bem pensar que: "Não tenho um mínimo de atração ou gosto pelo Senhor". Mas é perigoso pensar: "Tenho algum gosto, alguma ânsia, alguma devoção pelo Senhor".

O Mundo Egoísta

Se desejamos ter uma conexão com o infinito, devemos estar totalmente vazios; nossa auto-abnegação deve ser completa. A realização mundana é algo negativo, livremo-nos disso completamente. Devemos pensar: "Não sou nada; não tenho qualidades para ser aceito ou usado no serviço ao Senhor. Sou completamente inepto". Devemos retirar-nos completamente do mundo egoísta e permitir que yogamaya, a energia interna do Senhor, nos capture. Um escravo não tem posição; toda posição é do mestre; tudo é Dele. Nossa verdadeira qualificação será vivenciarmos isso. Quando acharmos que temos alguma qualificação, começam as dificuldades. Por isso, o próprio Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Não vejo nenhum vestígio de amor por Krishna em Meu coração (na prema gandho 'sti darapi me harau)". Esse é o padrão de humildade. Deve ser um sentimento sincero; não pode ser imitação. Sejamos cuidadosos. Não nos aventuremos a imitar devotos elevados. A única qualificação para cantar o santo nome de Krishna é o sentir autêntico, o conceber que não possuímos nada, e que tudo é Dele.

 

3

Mais Humilde

do que uma Folha

de Grama

 

trnad api sunicena
taror api sahisnuna
amanina manadena
kirtaniyah sada harih

Tradução

"Aquele que é mais humilde
do que uma folha de grama,
mais paciente do que uma árvore,
que honra devidamente os outros
sem desejar tal honra para si,
é qualificado para cantar sempre
o santo nome de Krishna".

Iluminação

Deveríamos nos estabelecer principalmente no seguinte humor: de nos considerarmos como o pior dos piores. Srila Bhaktivinoda Thakur deu sua análise sobre o significado desse verso como se segue: até uma folha de grama tem seu valor, mas nós não temos nem mesmo o valor de uma folha de grama. Não temos valor positivo. Uma coisa é o homem não ser educado, mas um louco é pior do que um mal educado. Ele pode pensar - mas só anormalmente. Por isso, Srila Bhaktivinoda Thakur diz: "Tenho alguma consciência, alguma inteligência, mas estão mal orientadas. Uma folha de grama não sofre de má orientação. Quando é pisada, não tende a se mover em direção oposta. A folha de grama pode ser soprada de cá para lá por uma tempestade, ou pelo ambiente externo, enquanto eu sempre reluto em ir numa direção em particular. Se as ondas do meio ambiente tentam me levar numa certa direção, eu tento me opor. Se realmente considerar meu verdadeiro valor, concluirá que minha posição é inferior à de uma folha de grama, porque tendo a me opor".

Quando desejamos nos conduzir a uma relação mais íntima com a bondade infinita, devemos pensar que: "Não tenho valor. Ou melhor, meu valor é negativo. Minha tendência é de oposição à graça do Senhor. Se Krishna tenta me agraciar, tento resistir. Sou constituído de tal elemento que cometo suicídio espiritual. Krishna vem me agraciar, mas eu me oponho: a energia que há dentro de mim tenta o suicídio. Essa é minha situação, mas a folha de grama não se opõe a ninguém. Minha situação é assim tão sórdida". Devemos vivenciar estarmos nesse predicamento. Podemos aceitar a bondade da Verdade Absoluta na forma de Seu santo nome com esse cuidado.

Não devemos achar que o caminho será tranqüilo; podem vir muitos problemas externos. Quando os devotos vão cantar Hare Krishna nas ruas, muitas pessoas gritam: "Ei, seus macacos! Macacos cara-vermelha"! Virão muitas formas de impedimentos e oposição que tentarão nos afetar e nos dissuadir desse caminho, mas temos que praticar tolerância como a de uma árvore. Por que a árvore foi citada como exemplo? Analisou-se assim: se ninguém regar a árvore, ela não protesta - "Oh! Dê-me água"! Se alguém vem perturbar a árvore, arranca suas folhas, corta seus galhos, ou até mesmo a põe abaixo com machadadas, ela permanece silenciosa; não faz nenhuma oposição. Devemos ver que o insulto, a pobreza, a punição, ou outras ações desfavoráveis são necessárias para nos purificar, e seremos liberados da existência material com um pouquinho de punição.

Através da consciência de Krishna, conectamo-nos ao objeto supremo da vida, a maior satisfação da vida - quanto estamos prontos a pagar por isso? É inconcebível. Devemos aceitar com um sorriso qualquer pequena demanda que nos for exigida, ao considerar o objetivo supremo. Se estamos realmente confiantes, se temos fé em nosso brilhante futuro, então devemos pagar alegremente.

"Krishna - Vou Lhe Dar uma Lição"!

Certa vez, Srila Gaurakishora Dasa Babaji Maharaja, mestre espiritual de Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura, mendigava um pouco de arroz pela cidade de Navadwip, em várias casas. Os habitantes das aldeias às vezes atacam ou insultam os devotos e nem mesmo poupavam uma alma tão elevada quando chegava a suas residências. Alguns garotos jogavam pedras e atiravam barro nele, quando ele pensou: "Krishna, é muito cruel comigo! Vou reclamar de Você para Sua mãe Yasoda". Esse era seu ponto de vista, e assim ele harmonizava tudo. Devemos aprender a ver Krishna em tudo que venha a nos perturbar ou atacar. Na avaliação filosófica é claro que nada pode acontecer sem o desejo de Deus. Mas, numa forma concreta, o devoto vê: "Oh, Krishna! Apóia essas crianças, para me perturbar, e vou Lhe dar uma lição. Sei como lidar com Você. Vou reclamar à Sua mãe Yasoda, e ela vai castigá-Lo".

Devotos avançados são fixos na consciência de que Krishna está por trás de tudo, e aceitam tudo dessa forma. Essa atitude é nosso farol de orientação, pois nos conduzirá a superar as coisas que são aparentemente desfavoráveis para nós. Encontramos um doce ajuste aqui, e assim, somos aconselhados a sermos mais tolerantes do que uma árvore. Podemos ficar sem fazer nenhuma oposição; ainda assim, a oposição virá nos perturbar. E temos de perdoar.

E temos de respeitar os outros. Prestígio é o maior e mais sutil inimigo de um devoto de Krishna. Orgulho é o pior inimigo de um devoto de Krishna. E orgulho nos leva finalmente à conclusão dos mayavadis, os monistas. Eles dizem: so 'ham - "Eu sou"! Não: daso 'ham, "Eu sou subordinado"! Mas dizem: "Eu sou o Elemento Supremo; eu sou Isso; eu sou Ele", assim eliminam de suas considerações o fato de que somos insignificantes e sofremos na miséria. Os mayavadis, impersonalistas, ignoram todas as coisas práticas, mas posição, ou ego (pratistha), é nosso pior inimigo. Somos aconselhados nesse verso a lidar com prestígio e posição numa forma especial.

A Área de Escravidão de Krishna

Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Não deve desejar respeito de ninguém ou mesmo do próprio meio ambiente; ao mesmo tempo, deve prestigiar todos e tudo no meio ambiente conforme a posição. Respeite, mas sem desejar nenhum respeito externo". Devemos ser muito meticulosos a esse respeito, pois o orgulho é nosso inimigo oculto, nosso pior inimigo. Se de alguma forma pudermos evitar ou conquistar esse inimigo, estaremos aptos para entrar na área de escravidão de Krishna e nos juntarmos àqueles que entregam suas vidas completamente em sacrifício a Ele. O significado geral desse verso é: "Nunca procure posição ou prestígio de nenhuma parte. Ao mesmo tempo, honre todos e tudo conforme seu entendimento".

Um Grande Insulto

Quando nosso mestre espiritual, Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura, foi para Vrindavana no início dos anos 30, ele andava num automóvel. Até aquela época, nunca se viu tal coisa, em relação a um santo. Certo dia, um sacerdote insultou nosso guru, e censurou a posição de Srila Raghunatha Dasa Goswami, preceptor da nossa mais elevada concepção de alcance espiritual. Ele se vangloriou: "Não somos apenas residentes da terra sagrada, mas membros da casta de sacerdotes exaltados (brahmanas). Portanto, podemos oferecer nossas bênçãos a Dasa Goswami. Ele nasceu numa família de classe baixa, e ele próprio nos pediu tal bendição".

Dasa Goswami orou certa vez, com grande humildade:

gurau gosthe gosthalayisu sujana bhusuragane
svamantre sri-namni vraja-nava-yuva-dvandva-sarane
sada dambham hitva kuru ratim apurvam atitara
maye svantarbhratas catubhir abhiyace dhrta-padah

"Ó mente - minha irmã! Caio a seus pés e imploro: Abandone todo orgulho e sempre saboreie amor extático enquanto se lembra do guia divino, da morada sagrada de Vrindavana, dos pastores de vacas e leiteiras de Vraja, dos devotos amorosos do Senhor Supremo Sri Krishna, dos deuses na terra ou dos brahmanas, do Gayatri mantra, dos santos nomes de Sri Krishna, e do jovem casal divino de Vraja, Sri Sri Radha-Govindasundara".

O sacerdote observou: "Somos residentes da morada sagrada de Vrindavana, e brahmanas também, portanto, estamos em posição para dar benções a Raghunatha Dasa Goswami". Quando nosso guru maharaja, que estava em Radha-kunda na ocasião, ouviu essas palavras, começou a jejuar. Ele comentou: "Tenho de ouvir isso? Esse sujeito está sob o controle da luxúria, da ira e da cobiça, e diz que pode dar sua graça a Dasa Goswami, o preceptor mais respeitado em nossa linha! E tenho de ouvir isso"? Ele decidiu jejuar, sem retaliar seu comentário.

Nós também paramos de comer, e todo o acampamento começou a jejuar. Então, quando os cavalheiros locais souberam que todo o acampamento estava em jejum, procuraram pelo sacerdote blasfemador e o trouxeram perante nosso guru maharaja. O sacerdote implorou para ser perdoado. Nosso guru maharaja ficou satisfeito e quebrou o jejum, após mostrar-lhe algum respeito. Alguém disse a nosso guru maharaja na ocasião: "Eles são tolos ignorantes. Por que devemos ficar tão afetados com suas palavras? Devia ignorá-las". Nosso guru maharaja disse: "Se eu fosse um babaji comum e ouvisse tal comentário, poderia simplesmente tapar os ouvidos e ir embora. Mas atuo como acharya, aquele que ensina pelo próprio exemplo. Qual a justificativa para eu andar num automóvel, se não me oponho a tais comentários contra meu gurudeva"?

Ele costumava usar essa expressão muitas vezes: "Por que ando de automóvel aqui em Vrindavana"? Ele disse: "Se eu fosse um niskincana babaji, santo que vive em reclusão e veste apenas um pedaço de pano, não me oporia a esse homem. Simplesmente, deixaria o local e iria embora. Mas porque ando num grande automóvel na posição de acharya, professor, preciso defender a dignidade de grandes devotos. Aceitei essa missão e não posso evitar as circunstâncias. Tenho de enfrentar e fazer todo o possível para que tais coisas não continuem sem denúncia ou oposição".

A humildade deve ser ajustada ou modificada na aplicação prática. Certa vez, quando um templo Hare Krishna foi atacado, os devotos usaram uma arma para defender o templo. Mais tarde, houve reclamações das pessoas da região. Eles diziam: "Oh, eles são humildes? Eles são tolerantes? Por que não seguiram o conselho de Sri Chaitanya Mahaprabhu para serem mais humildes do que uma folha de grama e mais tolerantes do que uma árvore? Eles não podem ser devotos"! Chegavam muitas reclamações até mim, mas os defendi e disse: "Não, eles agiram corretamente. A instrução para ser mais humilde que a folha de grama quer dizer que se deve ser humilde com um devoto, não com um louco".

As pessoa comuns são ignorantes; são loucas. Não sabem o que é bom ou mau, portanto, suas considerações não têm valor. Quem é qualificado para julgar se um devoto respeita todos sem esperar respeito para si próprio? Quem vai julgar se ele á realmente humilde e tolerante? Loucos? Pessoas ignorantes? Será que eles têm algum bom senso para julgar quem é humilde, quem é tolerante, e quem é respeitoso com os outros? Deve haver um padrão para julgar a humildade. Interessa-nos o critério de pensadores elevados, e não a consideração das massas ignorantes.

Padrão de Humildade

Claro que qualquer um pode enganar o povo com humildade superficial. Só que "show" de humildade não é humildade verdadeira, que tem de provir do coração, e ter um propósito real. Tudo - humildade, tolerância e modéstia - deve ser considerado através do julgamento de uma pessoa padrão, normal, e não pelos ignorantes que são como elefantes, tigres, e chacais. Deveriam poder julgar o que é humildade, audácia e impertinência? Claro que não. Deveria um devoto pensar: "A Deidade no templo está para ser perturbada, mas devo ficar quieto e não fazer nada. Devo ser humilde e tolerante. Um cachorro entra no templo; preciso respeitá-lo"? Não. Isso não é verdadeira humildade.

Precisamos de uma concepção normal da realidade. Não podemos permitir a continuação dessas anomalias em nome de respeito aos outros. Não devemos pensar que podemos permitir que alguém prejudique os devotos ou perturbe o templo, e, desse modo, seremos humildes e tolerantes e respeitamos os outros. Não nos interessa apenas o significado físico das escrituras, mas o significado real.

Ser humilde significa que sou escravo do escravo de um Vaishnava. Devemos prosseguir com essa consciência. Se alguém vem perturbar meu mestre, devo me sacrificar primeiro, e pensar: "Meu sacrifício não será nenhuma perda, pois sou da menor importância; devo me sacrificar para manter a dignidade do meu guru, dos devotos e do meu Senhor e de Sua família".

Devemos sempre compreender o que é que deve ser honrado. Nós respeitamos a Verdade Suprema, o Senhor dos Senhores; nossas atitudes devem acontecer em harmonia com isso. Se mantivermos constantemente o conceito supremo de relatividade dentro de nós, veremos que somos os mais baixos. Devemos nos sacrificar, se nossos guardiões estiverem em perigo. Tudo isso deve ser levado em consideração quando se tenta entender o significado de humildade, não é imitação física - mas humildade genuína; é uma questão de realização prática. Fama e honra devem ser destinadas ao Senhor e Seus devotos, a mais ninguém.

Claro que nos estágios superiores a humildade tem de ser ajustada de outra forma para os paramahamsa-babajis, devotos mais elevados que são como cisnes e abandonaram toda conexão com este mundo material. Mas no estágio de pregação, o devoto de segunda classe deve aceitar as coisas diferentemente. Como nosso guru maharaja disse: "Se eu atuasse como babaji, santo recluso e pacífico, teria saído do local sem fazer nenhuma oposição. Mas quando estamos na pregação e assumimos a responsabilidade de conduzir tantas almas ao reino do Senhor, nosso ajuste deve ser de acordo". Geralmente, devemos ser indiferentes com os inamistosos, mas quando pregamos em nome do Senhor de forma organizada, nosso dever muda: não podemos ser indiferentes com antagonistas.

As escrituras mencionam, através de Jiva Goswami, que se devem considerar esses tópicos conforme o padrão de cada um em particular, antes de tomar as ações necessárias. Sua decisão é que se o devoto estiver numa posição de poder, se for um rei, e se alguém blasfemar um Vaishnava autêntico, ou santo, o rei deve aplicar punição corporal, com a extradição do ofensor ou por cortar a língua dele (vaishnava nindaka jihva hata). Isso não é dever para pessoas comuns, pois haverá distúrbio se agirem assim. Nunca devemos desejar infligir punição física a ninguém.

Hanuman é um Vaishnava, mas vimos que destruiu tantas vidas. O mesmo vale para Arjuna e tantos outros devotos. Até mesmo Krishna e Ramachandra mataram tantos demônios em batalhas. O verdadeiro significado de humildade não é meramente uma representação física de brandura. Sempre que houver um insulto ao guru ou aos Vaishnavas, o devoto vai se opor aos blasfemadores de acordo com seu poder.

Bhaktivinoda Thakura diz em uma de suas canções que não devemos apenas tolerar as más ações de outros e perturbações do meio ambiente, como também temos de fazer bem àqueles que nos torturam. O exemplo citado é a árvore. Mesmo quem corta a árvore obtém sombra e conforto dela enquanto a põe abaixo. Em conclusão, ele diz que humildade, misericórdia, respeito aos outros e renúncia a nome e fama são as quatro qualificações para cantar o santo nome de Krishna.

Somos o mais baixo dos inferiores. Devemos estar sempre conscientes de que somos mendigos. Devemos pensar que: "Embora eu seja um mendigo, vim mendigar a coisa suprema; que nenhuma perturbação me faça dissuadir dessa tentativa". Ao mesmo tempo, nossa atitude para com o meio ambiente deve ser de respeito.

Assim, ao se tornar educado na concepção Krishna de divindade, cada um deve ser respeitado conforme sua posição. A orientação na adoração ao santo nome (nama-bhajana) é que devemos adotar a posição de escravo do escravo de um escravo do Senhor. Se deseja cantar o santo nome de Krishna, então não perca sua energia com as frivolidades deste mundo. Não permita que sua atenção seja perturbada por aquisições insignificantes, como prestígio ou ganho relativo a dinheiro ou conforto físico. Lembre-se, está na tentativa pela maior coisa, e todas as outras coisas são muito pequenas em comparação à consciência de Krishna. Portanto, não perca sua energia e tempo valioso. Seja econômico. Tenha a chance de alcançar o objetivo supremo da vida.

 

4

Devoção

Pura

 

na dhanam na janam na sundarim
kavitam va jagad-isa kamaye
mama janmani janmanisvare
bhavatad bhaktir ahaituki tvayi

Tradução

"Ó Senhor, não desejo
acumular riqueza, seguidores,
belas mulheres, ou salvação.
Minha única súplica é por
Seu serviço devocional sem causa,
Nascimento após nascimento".

Iluminação

Temos de tentar nos mover nessa direção. Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Não quero nenhum dinheiro (na dhanam), não quero a companhia de belas mulheres (na sundarim). Não quero um bom nome, ou a fama de um poeta (kavitam va)". Esse é o significado geral desse verso, mas foi profundamente analisado nos comentários de Bhaktisiddhanta Sarasvati e Srila Bhaktivinoda Thakura.

Nosso guru maharaja comentou que riqueza, seguidores, mulheres e erudição representam nesse verso dever, riqueza, prazer sensual e salvação (dharma, artha, kama e moksha). Srila Bhaktivinoda Thakura explicou, nesse contexto, que "riqueza" significa a riqueza que vem em conseqüência ao cumprimento dos deveres prescritos. Também pode significar artha, desenvolvimento econômico. Ele diz que "seguidores" quer dizer relações físicas para conforto: esposa, filhos e assim por diante. A palavra sundarim significa kama, a companhia de belas mulheres. E kavitam, poesia, representa moksha, liberação. Aparentemente, a liberação tem um valor alto, mas na realidade, trata-se apenas de palavra floreada como na poesia. A liberação é imaginária, pois seu resultado final é a extinção da existência do indivíduo.

Capitalistas do Serviço

Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Ó Senhor do universo, oro somente por devoção espontânea a Você, imotivada por qualquer recompensa. Desejo uma atitude de servidão natural". Prema significa afeição, amor. Prema quer dizer que: "Tenho de Lhe servir, e em troca tem de me conceder mais tendência a Lhe servir - mais energia e mais anseio em Lhe servir. Meu afeto por Você vai incrementar e os juros vão virar capital, como nos negócios financeiros". Dessa forma, o devoto ora a Krishna que: "Eu Lhe sirvo, e se quiser me pagar com alguma coisa, então, dê-me mais capital a fim de incrementar minha tendência serviçal, para que essa seja aumentada".

"Meu Senhor, seja qual for minha situação de nascimento, conforme meu karma, desejo somente Lhe servir, e oro por serviço desmotivado, sem nada em troca".

Há quatro tipos de tentações comuns que nos rodeiam pelas quatro direções: dinheiro, seguidores, mulheres e liberação, e isso significa dharma, artha, kama e moksha. A gradação dos diferentes objetivos da vida foi representada cientificamente dessa forma.

Mas Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Meu Senhor, não tenho atração por nenhuma dessas coisas, somente por Você. Nem mesmo desejo liberação. Não vou pedir: 'Dê-Me liberação, pois serei capaz de Lhe servir melhor por estar liberado'". Não se deve impor tal tipo de condição à divindade. A prece mais pura é: "Posso ser pássaro ou animal, aqui ou ali, até mesmo no inferno, conforme meu karma - não importa. Todo meu anseio é de me concentrar numa única coisa: suplico para que minha atração por Você nunca seja perdida. Suplico para que possa ser sempre aumentada".

Bhakti, devoção, é ahaituki, sem causa. É bem natural e não possui outro anseio. Alguém pode dizer: "Nunca desfrutarei do lucro, se os juros forem reinvestidos como capital", mas estaremos interessados no desfrute através da auto-entrega. "Que outros desfrutem às minhas custas" - essa é a base do desfrute supremo. O devoto pensa: "Que Krishna desfrute com outros - serei o bode expiatório".

Bhaktivinoda Thakura diz que, quando uma criança não possui conhecimento, não pode se defender ao ser atacada por um inimigo ou doença. Do mesmo modo, quando a realização do santo nome está num estágio infantil, no começo, podem prevalecer crimes e ofensas contra o nome. As ofensas não se aproximam quando a realização cresce, mas muitas ofensas podem vir e atacar o principiante.

Esquadrão Suicida

Bhaktivinoda Thakura diz: "O santo nome é tão belo, gracioso e atraente que desejo morrer junto a todas as ofensas a ele, para que outros possam desfrutar do seu néctar"! Ele queria se sacrificar como na guerra, quando o esquadrão suicida pulava na chaminé de um navio com bombas nas axilas. O esquadrão suicida começou na campanha do Japão contra os Britânicos, e quando Hitler ouviu falar sobre a coragem deles, disse: "Temos algo a aprender do Japão". Assim, Bhaktivinoda Thakura ora: "Quero acabar comigo junto com todas as ofensas contra o nome, para que outros possam desfrutar do néctar do santo nome".

Vasudeva Datta também orou: "Dê-me todos os pecados de todas as almas, e atire-me no inferno eterno, para que elas sejam beneficiadas. Dê-lhes amor por Krishna". Ele não morre devido a esse sentimento altamente generoso. É dito: "Morrer para viver". Encontraremos um alcance vivo da vida superior quando tivermos tanta apreciação pelo Senhor a ponto de sentir esse tipo de sentimento. Esse é o desfrute que desejamos.

O último verso do Shikshastakam de Sri Chaitanya Mahaprabhu explica esse sentimento. Encontramos um outro exemplo a esse respeito quando o grande sábio Narada veio até as gopis e lhes pediu a poeira de seus pés de lótus para tratar da dor de cabeça de Krishna. Encontramos o mais alto nível de abnegação nesse episódio, e esse é o sentido da devoção. A vida do devoto á baseada em sacrifício. Quanto maior o sacrifício, maior o benefício. Sacrifício significa: "Morrer para viver". Esse é meu ditado favorito. São palavras de Hegel: "Morrer para viver". Krishna é o consumidor supremo conhecido neste mundo. Não devemos hesitar em nos entregarmos a Ele.

 

5

Rei

da Terra

do Amor

 

ayi nanda-tanuja kinkaram
patitam mam visame bhavambudhau
krpaya tava pada-pankajasthita-
dhuli-sadrsam vicintaya

Tradução

"Ó filho de Nanda Maharaja,
sou Seu servo eterno,
mas devido a meu próprio karma,
caí neste terrível oceano
de nascimento e morte.
Aceite esta alma caída
e considere-me
uma partícula de poeira
sob Seus sagrados pés de lótus".

Iluminação

Sri Chaitanya Mahaprabhu ora aqui: "Ó Senhor, por favor, leve-me em consideração; quero entrar no reino de Seu olhar misericordioso. Não sei cuidar de mim mesmo corretamente, por isso, solicito Seu cuidado. Por favor, aceite-me e deixe-me ingressar. É o meu guardião. Quero viver sob Sua proteção".

Mas quem é Ele? Ouvimos diferentes conceitos sobre Deus, mas aqui chegamos a um belo conceito sobre Deus-Krishna, o filho de Nanda Maharaja. Isso só se encontra em Vrindavana.

Um grande erudito espiritualista chamado Raghupati Upadhyaya encontrou-se certa vez com Sri Chaitanya Mahaprabhu perto de Mathura. Eles tiveram uma discussão e Mahaprabhu lhe perguntou: "Quem desejamos ter como nosso mestre? Quem é o objetivo final de nossas vidas"? Raghupati Upadhyaya respondeu:

srutim apare smrtim itare
bharatam anye bhajantu bhava-bhitah
aham iha nandam vande
yasyalinde param brahma

"Aqueles que temem o renascimento neste mundo devem seguir o conselho das escrituras Védicas, os outros podem seguir o Mahabharata; mas quanto a mim, sigo Nanda Maharaja, em cujo quintal a Suprema Verdade Absoluta brinca como uma criança".

As pessoas geralmente estão sob a guia do smriti, a lei Védica no sistema de varnashrama-dharma, ou deveres sociais Védicos. Ocupam-se dessa forma em deveres corpóreos com um tom de religiosidade. Entretanto, aqueles que estão livres das demandas físicas, e tentam transcender esta vida de desfrute e exploração, geralmente orientam-se pelos Upanishads, por encontrarem Neles instruções mais elevadas.

Raghupati Upadhyaya diz: "Não me importo com tudo isso, mas sinto necessidade de seguir a guia do meu coração. Não estou muito preocupado com o cérebro; considero que a verdadeira paz se relaciona ao coração. E meu coração está sempre atraído ao pai de Krishna, Nanda. As autoridades afirmam que Krishna é a Suprema Verdade Absoluta, e esse absoluto engatinha no quintal de Nanda Maharaja, assim, vejo realidade concreta lá".

Como foi que Nanda atraiu a Suprema Verdade Absoluta? O devotado rei Parikshit Maharaja pergunta ao menino santo Shukadeva Goswami, no Srimad Bhagavatam (10.8.46):

nanda kim akarod brahman
sreya evam mahodayam
yasoda ca maha-bhaga
papau yasyah stanam harih

"Ó conhecedor do Brahman, está sempre absorto no mundo exclusivamente consciente. Não se encontra nenhum vestígio de referência objetiva mundana em você, pois está sempre ocupado no mundo subjetivo do espírito. Sua consciência nunca volta a este nosso mundo objetivo. E diz que Krishna é a Verdade Absoluta Suprema. Meu mestre, faço uma pergunta: Que dever Nanda executou, que tipo de realização Nanda teve para que a Verdade Absoluta lhe fosse tão íntima a ponto de aparecer como seu filho e engatinhar em seu quintal? Parece que Ele está sob o controle de Nanda. O que é isso? É a coisa mais espantosa. Como é possível"?

A Essência Suprema Mamou em Seus Seios

"Os yogis, os rishis, os maiores eruditos e penitentes dizem que às vezes têm um raro vislumbre de seus objetos de aspiração e realização, mas depois retornam subitamente. Não conseguem manter a atenção nesse plano por longos períodos de tempo. Como é possível que a Substância Suprema sente no colo de Yashoda e mame em seus seios? Se tais coisas são reais, se tudo isso é possível, por que eu não deveria estar atraído pelo método que me pode conceder tanta intimidade com a entidade suprema"?

Raghupati Upadhyaya expressa um ego similar. Ele diz: "Não quero me envolver na discussão e análise sutis das escrituras; só quero me render a Nanda e a seu grupo. Quero pôr meu nome na lista onde Nanda é o guia mestre".

Podemos obter um bom destino pelo exercício da energia (karma); se não tivermos fé nas conquistas do karma, poderemos tentar a salvação através da elevação da consciência. Mas se inquirirmos sobre a solução da vida com a ajuda de peritos desse reino espiritual superior, como Narada e seu grupo, poderemos ingressar na terra de amor e dedicação.

Minha fé e meu bom senso sobre religião me dizem que se eu vir essa Verdade Absoluta Suprema, que é tão rara de se ver , e percebê-La real, concreta e íntima, a encantar diretamente meu coração, por que deveria então me ocupar numa busca pelo impossível? Vou apelar diretamente ao objeto da minha busca. Se alguém me disser que um falcão arrancou minha orelha, será que devo ir atrás do falcão sem primeiro tocar minha orelha para ver se ainda está lá? Por que devo correr daqui para lá se posso ter a Verdade Absoluta tão intimamente? Se a Verdade Absoluta veio tão gentil com todo Seu encanto, e Seu encanto não é um segredo, e muitos estão atraídos por Ela, por que devo correr atrás da fantasmagoria dos meditadores, abstratores e renunciadores? Nunca. É questão de bom senso. A correta compreensão que é dada pelas autoridades é que Krishna, o filho de Nanda, é o Supremo. Podemos perguntar, quando chegamos a esse padrão: "Ó filho de Nanda, Krishna, rei da terra do amor: suplico por Seu afeto. Sou Seu servo. Sinto interiormente que tenho alguma conexão com Você. Sou subordinado a Você, entretanto, estou em circunstâncias adversas. Sinto haver tantos inimigos dentro de mim que tentam me distanciar de Você para que não possa fixar minha atenção o tempo todo em Você. Sinto ao mesmo tempo no fundo de meu coração que é o meu mestre, é tudo para mim. Meu coração não se satisfará sem Sua companhia. Por isso é que apelo a Você: estou em circunstâncias desfavoráveis; sofro, e sem Sua graça, não vejo meios para alívio da presente posição de aprisionamento".

A Alma é Como um Raio de Sol

Foi dito: "Sinto que não estou eternamente conectado a Você; se fosse assim, essa separação seria impossível. Não sou Sua porção plenária como um avatara". Outras encarnações do Senhor Supremo são Suas expansões plenárias (swamsa), mas o jiva é uma representação parcial de Sua potência (vibhinamsa). Krishna diz no Bhagavad-gita que os seres vivos são Suas partes, parcelas. A alma vem da potência marginal (krsnera tatastha-sakti, bhedabheda prakasa). A alma é uma parte fragmentada atômica da potência do Senhor assim como um raio do Sol. Aqui o devoto ora: "Não sou parte, parcela de Seu próprio corpo, não sou nem mesmo um raio, mas a minha imagem se aproxima de uma partícula de areia, uma partícula de poeira - nem mesmo uma partícula de raio que vem do brilho de Seu corpo". Sriman Mahaprabhu representa dessa forma em nosso benefício para que nossa petição seja desse tipo: "Não posso me permitir o pensamento de que possuo tamanha sorte de ser considerado uma parte inseparável de Você. Sou uma parte separável, mas também quero Sua graça. Por favor, seja bondoso comigo; invoco Sua misericórdia por um privilégio especial. Aceite-me em qualquer posição conectada a Você - mesmo a posição mais baixa. Aprove ao menos isso. Considere-me como uma partícula de poeira sob Seus pés. Essa é minha súplica".

 

6

Anseio

por

Perfeição

 

nayanam galad-asru-dharaya
vadanam gadgada-ruddhaya gira
pulakair nicitam vapuh kada
tava nama-grahane bhavisyati

Tradução

"Ó Senhor, quando como ondas
lágrimas fluirão de meus olhos,
E minha voz tremerá de êxtase?
Quando os cabelos de meu corpo
se arrepiarão enquanto eu cantar
Seu santo nome"?

Iluminação

A súplica do devoto foi atendida nesse verso e ele obteve uma posição no reino de Krishna. Agora, sua ambição não tem fim. Ele ora novamente por mais promoção embora tenha sido colocado em situação segura. Primeiro ansiou somente por uma posição insignificante como poeira sob as solas dos pés divinos de Krishna. Aí veio o privilégio. O toque dos pés sagrados de Krishna vieram até a poeira e a poeira se transformou como se fosse mágica de uma vara de condão. Agora surgiu automaticamente uma demanda maior, superior.

O devoto pensa: "O que é isso? Orei somente para me tornar a poeira nas solas de Seus pés, mas o que sinto interiormente agora? Sou a poeira da terra, e é a Verdade Absoluta Suprema. Mas a poeira foi convertida numa substância grandiosa e inconcebível ao toque de Seus pés de lótus. Eu me admiro, 'Como foi que me transformei'? Agora vejo que minha demanda é por maior intimidade. Primeiro ansiei por servidão mas, agora, pela pedra filosofal de Seus pés de lótus, e esse anseio foi convertido em atração espontânea (raga-marga)".

O Rei do Afeto

Atração espontânea só pode significar Krishna, não Narayana ou Ramachandra. Krishna quer dizer: "Aquele que é adorado pelo amor e afeição divinos". Ele é o rei da afeição, o centro da afeição e do amor. Todo o conceito de devoção do devoto muda simplesmente ao toque dos pés de lótus de Krishna, e ele é agraciado com a demanda por mais intimidade; amor e afeição maiores vieram para agraciar esse servidor.

Sua prece muda quando se eleva a tal plano de dedicação. Ele pensa: "O que está acontecendo? Não posso parar minhas lágrimas. Elas vêm incessantemente, e sinto que perco o controle quando tento cantar Seus nomes, meu Senhor. Alguma interferência de outra região me move para perturbar meu pensamento e aspirações normais. Sinto-me em meio a um outro plano. Estou em lugar nenhum. Perdi o controle; tornei-me um boneco nas mãos de algum outro poder".

Pés de Lótus - Varinha de Condão

"Meu anseio me conduz rumo a outra coisa. Agora, não desejo apenas minha conexão com Você como servo distante, mas, entrar em contato com a varinha de condão de Seus pés de lótus; meu anseio mudou. Vejo que tantos devotos estão ocupados em Lhe servir e em cantar Seus nomes, e minhas esperanças aumentaram ao ver isso. "Quero ser elevado a essa posição. Posso visualizar essa posição de longe, mas minha súplica agora é para que eu seja elevado a esse nível. A conexão com Você me deu tanta sede. Quero ser controlado por Você. Brinque comigo como desejar, do Seu próprio jeito; meu coração anseia por tal relação com Você. Percebo que meu conceito prévio mudou e minha nova ânsia é pelo padrão de amor espontâneo quando canto Seu santo nome com esse sentimento. Suplico para que me eleve a esse plano de Sua afeição e amor divinos".

 

7

Com Você

para

Sempre

 

yugayitam nimesena
caksusa pravrsayitam
sunyaitam jagat sarvam
govinda-virahena me

Tradução

"Ó Govinda!
O mundo está vazio sem Você.
Lágrimas inundam meus olhos
como torrentes de chuva,
e um momento
parece eterno".

Iluminação

Esse verso algumas vezes é traduzido: "Ó Govinda, sem Você, um momento parece como doze anos ou mais". A palavra yuga é traduzida algumas vezes como "doze anos". Alguns devotos dizem que isso se deve pelo fato de Mahaprabhu ter experimentado a mais intensa separação de Krishna no humor de Radharani, por doze anos. O dicionário sânscrito afirma que uma yuga quer dizer doze anos. Esse é um conceito. Outro significado é "milênio" ou "era". Uma yuga também pode significar uma quantidade ilimitada de tempo.

Sri Chaitanya Mahaprabhu diz: "Um momento parece ser um período de tempo ilimitado. E meus olhos derramam lágrimas como se fosse chuva. A estação das chuvas causa tantas enchentes, e agora parece que Meus olhos estão inundados. O visível fica invisível para Mim. Estou tão alienado do presente ambiente que não vejo mais nada. Minha mente sente interiormente tanta atração pelo centro do infinito que não vejo nada onde quer que direcione Meu olhar. Tudo parece vazio, porque sinto como se Govinda tivesse Se afastado de Mim".

Sri Krishna - Realidade, o Belo

"Tal sentimento peculiar está dentro de Mim - não tenho interesse em mais nada. Todo meu interesse está direcionado a Govinda, e com tamanha intensidade que Me sinto um estranho em Meu atual meio ambiente. Não tenho nada: nenhuma consciência. Ela foi para algum outro lugar - em direção ao infinito. Todos os rios e lagos secam quando advém a seca. A água é direcionada ao reino gasoso. Não se vê uma gota de água em nenhum lugar. É algo assim. Toda atração é retirada tão extensivamente que tudo fica vazio. Meus sentidos, mente, e tudo mais, foram absorvidos, atraídos pela toda atraente, toda encantadora, toda doce Personalidade de Deus, Sri Krishna, a Realidade, o Belo".

Às vezes, o vão entre união e separação parece ser de muitos milênios. O devoto pensa: "Faz muito, muito tempo que perdi a consciência do encontro com Krishna". Ele tem uma vaga lembrança: "Tive alguma união com Krishna, mas a deixei tanto tempo atrás, tão distante, que parece ser um espaço de tempo ilimitado. Tive uma vaga recordação certa vez, mas agora se foi, talvez para sempre". Ele sente esse alto nível de desapontamento e desespero.

Esse é o padrão do mundo infinito. O temperamento transcendental se mede aqui do mesmo modo como se mede a distância entre planetas e estrelas através de anos luz. Quanta audácia a nossa de lidarmos com coisas tão grandiosas e além de nossa jurisdição!

Primeiro o devoto pensava: "Meu coração ficará satisfeito se eu for elevado a esse padrão de serviço. Minha sede será satisfeita, e sentirei algum alívio e satisfação dentro de mim". Mas o desenvolvimento de sua devoção o levou a um plano de vida inesperado. A natureza do amor divino faz com que um paciente ansioso pense que está curado ao tomar uma gota desse remédio, mas acaba levado a uma situação perigosa.

Ele pensa: "Fiquei encantado ao ver os devotos a derramar lágrimas incessantemente, com os cabelos do corpo arrepiados, e suas vozes embargadas enquanto cantam o nome de Krishna. Esses sintomas me atraíram e achei que sentiria verdadeira satisfação se os conseguisse, mas o que encontrei quando alcancei esse plano? Justo o oposto".

Ele se sente desesperado ao entrar em contato real com o infinito. Ele pensa: "Não há limite para o progresso. Ao contrário, quanto mais eu entro em contato íntimo com o infinito, mais eu sinto desespero". Aumentamos a percepção de como é ilimitado quanto mais avançamos, e ao perceber o ilimitado ficamos desesperados sem poder voltar atrás. Não há possibilidade de voltar atrás; só podemos ir adiante. Esse é o espírito do devoto genuíno.

Não podemos sair - ficamos desesperados ao perceber a característica infinita de nossa expectativa, e pensamos: "O tipo de néctar supremo está bem diante de mim, mas não consigo saboreá-lo - sou incapaz de tocá-lo ou pegá-lo em minhas mãos. Mesmo assim, seu encanto é tão grande que não posso evitar seu envolvimento. E sem ele, um pequeno espaço de tempo parece ser milhões de anos".

Rios de Lágrimas

O devoto pensa: "Oh! Passaram-se muitas e muitas eras; ainda assim estou carente! Tento a satisfação, mas não consigo, e o tempo passa. O tempo também é infinito. Tantos rios de lágrimas nascem de meus olhos; lágrimas escorrem profusamente de meus olhos para o corpo, mas não vejo, em meu alcance, a posição de sucesso. Minha mente está totalmente vazia. Não detecto nenhum vestígio do meu futuro. Não me encanto mais e nem sinto atração por nada mais que possa consolar este corpo doente".

"Não vejo possibilidade de alívio de nenhuma outra parte. Todas as alternativas foram eliminadas. Estou totalmente preso nas garras da consciência de Krishna e no amor por Krishna. Se existir alguém que possa me consolar, ajude-me! Estou perdido. Estou desamparado. Se existir alguém que possa me ajudar, por favor, venha me salvar".

Chaitanya Mahaprabhu diz que, quando estamos profundamente situados em amor por Krishna, não podemos abandoná-Lo, mas nossa sede aumenta e não sentimos satisfação. Estamos em meio a tal situação aparentemente horrível.

O anseio por Krishna que desperta na mente toma essa direção. Quando o devoto entra realmente em contato com Krishna, sua posição será todo-eliminante e todo-exclusiva. Sua concentração plena será em Krishna.

Sri Chaitanya Mahaprabhu descreve nesse verso como o devoto avança, desperta um conceito superior de Krishna, e então, sente esse tipo de separação ao ver Krishna diante de si sem poder obtê-Lo. Quanto mais avança, mais se sente nessa posição de desespero. O conselho principal de Sri Chaitanya Mahaprabhu nos ajuda a nos adaptarmos a esse humor intenso de separação. Ele nos diz: "Irá se perder na consciência de Krishna. E qual será sua situação? É uma gota e será atirado no oceano de amor divino".

 

8

União

na

Separação

 

aslisya va pada-ratam pinastu mam
adarsanam marma-hatam karotu va
yatha tatha va vidadhatu lampato
mat-prana-nathas tu sa eva naparah

Tradução

"Krishna pode me abraçar com amor
ou me esmagar sob Seus pés.
Ele pode partir meu coração
ao Se esconder de mim.
Que esse sedutor faça o que quiser,
mas será sempre o único
Senhor da minha vida".

Iluminação

Esse é o melhor remédio para os devotos. Chegamos ao ponto de medir o incomensurável, mas sempre temos de abraçar esse princípio. Devemos lembrar que Ele é infinito ao tentarmos a conexão com o infinito Senhor de amor e beleza. Ele é único para nós, mas há tantos devotos como nós com quem tem de lidar. Ele pode nos abraçar com afeição e adoração, mas temos de estar preparados para o oposto. Podemos nos agarrar a Seus pés, e Ele pode cruelmente pisar em cima de nós. Agarramo-nos a Seus pés de lótus com muita esperança, com todo o coração; ainda assim, vemos que Ele pisa em nós e nem liga para todo nosso esforço e afeto.

Pode ser que nos esforçamos ao máximo e descobrimos que nossa oferenda foi desonrada cruelmente. Ele pode nos abraçar, mas ao mesmo tempo, temos de estar preparados, pois Suas ações podem ser extremamente cruéis. Ele pode esmagar todas as nossas oferendas com Seus pés. Temos de estar preparados tanto para Sua adoração como para Sua negligência cruel. Temos de nos preparar para todas as circunstâncias adversas.

Krishna pode ser indiferente; pode nem ligar. Está perto quando nos pune, mas Sua indiferença é mais intolerável do que punição. O devoto pensa que: "Krishna me ignora e negligencia tanto que não gosta de manter qualquer conexão comigo. Será que Ele me conhece? Será que sou um estranho, um desconhecido para Ele"? Podemos aceitar punição como benefício, mas indiferença é muito mais penosa.

A dor de separação sentida por um devoto pode subir mais um degrau ainda. Krishna pode abraçar outro afetuosamente bem na nossa frente, cara a cara, sem ligar a mínima para nós. Podemos pensar: "Isso é meu clamor, meu direito", mas pode dar a outro bem na nossa cara. Isso nos causará mais problema.

A lei do afeto é assim. A lei do amor não tolera indiferença. É demais para tolerar, mas temos de estar preparados para isso. Precisamos nos preparar desde o início, pois esse é o significado de krsna-prema, o amor divino por Krishna - porque Ele é um autocrata, Ele é amor. Amor divino quer dizer misericórdia, e, não justiça. Não possui leis. E escolhemos amor divino como nossa fortuna máxima, temos de estar preparados para sermos tratados injustamente. Não há justiça no amor divino; este é livre. Pode fluir onde quer que deseje. Assim é a natureza do amor divino, não podemos reclamar - não temos direitos.

Assim é a natureza da coisa suprema, e é extremamente rara. Apego a esse princípio sem hesitação é fundamental para nós. É o amor verdadeiro, e deve estar preparado para ele. A natureza verdadeira de krsna-prema é o morrer para viver em todas as circunstâncias adversas. Se puder conciliar todos os diferentes estágios - bom ou mau - poderá entrar nesse plano exaltado.

Amor Acima da Lei

Justiça está dentro da lei; misericórdia está acima da lei. Prema, amor divino, também está acima da lei, mas possui sua própria lei. Srila Rupa Goswami Prabhupada concedeu-nos outro verso cujo significado corre em paralelo a esse:

viracaya mayi dandam dinabandho dayam va
gatir iha na bhavatah kacid anya mamasti
nipatatu sata-koti nirbharam va navambhas
tad api kila payodah stuyate catakena

Existe um tipo de pássaro pequeno chamado chataka que só bebe água da chuva. Ele nunca bebe água da terra, mesmo de rios, fontes ou lagos. Naturalmente, ele fica com o bico para cima, e anseia pela água da chuva. Srila Rupa Goswami Prabhupada dá esse exemplo para mostrar como o devoto deve agir sempre na expectativa da "água de chuva" do amor de Krishna, e de nenhum outro amor.

O devoto ora ao Senhor: "É o amigo dos caídos, por isso ainda tenho alguma esperança. Pode me conceder Sua graça, ou me punir severamente - em ambos os casos, não tenho alternativa senão me render plenamente a Seus pés de lótus".

Nossa atitude de entrega deve ser como a do pássaro chataka, que está sempre com os olhos para cima, a suplicar por água de chuva. A água da chuva pode vir profusamente - não só o suficiente para encher seu pequeno estômago, mas o bastante para afogar todo o seu corpo. Poderão surgir trovões; poderá cair um raio do céu e acabar com seu pequeno corpo, e mandá-lo à região de inexistência, mesmo assim, a natureza do pássaro faz com que suplique exclusivamente pela água da chuva. Ele não tomará água de nenhum outro lugar em nenhuma circunstância. Nossa atitude com Krishna deve ser assim: se Ele estender ou não Sua mão graciosa para nós, nosso dever é de nos rendermos a Ele.

Veio-me à memória um verso a esse respeito. Quando Sri Krishna se encontrou com Srimati Radharani e as gopis em Kurukshetra, após uma longa separação de talvez cem anos, sentiu que havia cometido um grande crime por Se separar delas. Ao Se aproximar das gopis, especialmente Srimati Radharani, e ao lembrar Suas qualidades de amor e rendição, sentiu-Se o maior dos criminosos, ao ponto de Se curvar para tocar os pés de lótus de Radharani.

Um poeta representou a cena dessa forma, e o poema foi coletado por Rupa Goswami em seu Padyavali. Krishna era o rei supremo da Índia naquela época. Mas quando entrou em contato com as gopis e a atmosfera de Vrindavana, sentiu-Se como um criminoso, e Se prostrou para tocar os pés de lótus de Radharani, quando Radharani, recuou e disse: "Que está fazendo? Por que quer tocar nos Meus pés? É espantoso. Será que perdeu a cabeça?

"Eu sou a Verdadeira Criminosa"

"É o mestre de tudo. Ninguém pode questioná-Lo. É swami. É Meu esposo e mestre, e sou Sua serva. É certo que estava ocupado em alguma outra parte, mas qual é o problema? Qual foi a falta que cometeu? Isso não importa, pois as escrituras e a sociedade Lhe concedem esse direito. Não foi nenhum crime e nenhum pecado de Sua parte. Não fez nada de errado".

"Eu sou a verdadeira criminosa. A maldade é Minha, o defeito é todo Meu. Não é responsável por Nossa separação, então porque Se considera culpado, ou como que cometeu algum erro? A prova positiva de que Eu sou a verdadeira criminosa é que, mantenho Minha vida, não morri por causa das dores da Sua saudade".

"Mostro Minha face ao mundo, mas não sou fiel a Você. Não consegui Me aproximar do padrão de fé que deveria ter mantido para o Seu amor, por isso a criminosa sou Eu, não Você. Está escrito nas escrituras dos santos que a esposa deve ser grata e exclusivamente devotada ao marido. As escrituras nos dão essa ordem. Uma mulher deve se devotar exclusivamente ao esposo, seu senhor. Portanto, devo cair a Seus pés neste encontro e implorar por Seu perdão, por Sua clemência, pois não tenho verdadeiro amor por Você. Mantenho este corpo, e apareço para a sociedade; não sou uma parceira digna de Você, por isso, por favor, perdoe-Me. Pede meu perdão? É o oposto de como as coisas deveriam acontecer. O que é isso? Por favor, não faça isso".

Nosso ideal de afeição por Krishna deve ser assim. Nós, o finito, devemos ter essa atitude para com o infinito. Ele pode nos dar um pouco de atenção a qualquer momento, mas devemos estar sempre totalmente atentos a Ele. Não há outra alternativa. Sri Chaitanya Mahaprabhu nos aconselha a nos devotarmos exclusivamente a Krishna, e porque somos insignificantes, nossa atitude tem de ser desse tipo.

Se queremos algo tão grandioso, não é nenhuma injustiça sermos tratados tão hostilmente. Nosso prospecto, compreensão, e adaptação devem ser de auto-sacrifício e auto-esquecimento, do mesmo modo quando alguém vai lutar por seu país na guerra, não há lugar para luxo ou desejos supérfluos.

Tenho uma lembrança a esse respeito de quando Gandhi reuniu seu exército de não-violência, um dos soldados voluntários perguntou: "Por favor nos consiga chá". Gandhi disse a ele: "Podemos lhe dar a água do rio, mas nenhum chá. Se está pronto para isso então siga em frente". Se queremos nos conectar com Vrindavana-lila de Krishna, não podemos impor nenhuma condição. Aí sim compreenderemos o método recomendado por Sriman Mahaprabhu: humildade maior do que a da folha de grama. Somente assim não haverá reclamação de nossa parte. Qualquer reclamação nossa, não somente na posição externa da presente vida, mas mesmo na vida eterna, deve ser examinada cuidadosamente e devemos aceitar plenamente os caminhos do Senhor. Krishna pode nos aceitar ou nos rejeitar; temos de correr esse risco. Só assim progrediremos.

Se de alguma forma pudermos entrar no grupo dos servos de Krishna, veremos que cada um tem a natureza de se consolarem mutuamente, quando estão reunidos em seus grupos respectivos. Existem diferentes relações de serviço e várias seções de servos de natureza similar, e eles se consolam mutuamente com conversas sobre Krishna (krsna-katha).

Krishna diz no Bhagavad-gita (10.9 e 12):

mac-citta mad-gata prana
bodhayantah parasparam
kathayantas ca mam nityam
tusyanti ca ramanti ca

"Meus devotos se reúnem, falam de Mim, e compartilham seus pensamentos que consolam seus corações. E eles vivem como se essa conversa sobre Mim fosse seu alimento. Ela lhes dá um tipo elevado de prazer, e descobrem que, quando falam de Mim entre si, sentem como se desfrutassem da Minha presença".

tesam evanukampartham
aham ajnana-jam tamah
nasayamy atma-bhavastho
jnana-dipena bhasvata

"Às vezes, quando o sentimento de saudades de Mim é muito intenso em Meus devotos, apareço de repente perante eles e sacio sua sede por Minha companhia".

Doçura com Dor

Sri Chaitanya Mahaprabhu deu um outro tipo elevado de consolo ultra refinado no último verso do Seu Shikshastakam. Este foi confirmado por Krishnadasa Kaviraja Goswami, que escreveu:

bahye visa-jvala haya bhitare anandamaya
krsna-premara adbhuta carita

"Não tema. Pode sentir uma dor horrível de saudade externamente, mas, internamente, sentirá um tipo de rasa sem igual, o mais agradável sentimento de paz, alegria ou êxtase".

Externamente, há muitas dores de separação, mas internamente, a maior satisfação.

As escrituras nos aconselham desse modo, e nossa experiência prática confirma nossa fé nesse particular. O poeta inglês Shelley escreveu:

"Nosso riso sincero
É fértil de alguma dor;
Nossas canções mais doces são aquelas
Que contam o mais triste do amor".

Quando lemos um épico em que há uma separação cruel do herói e da heroína, isso é tão doce que não conseguimos largar o livro, mesmo com derramamento de lágrimas. É muito doloroso quando ouvimos a respeito do sofrimento de Sita-devi, de como Ela foi banida por Ramachandra e abandonada na floresta mesmo quando era criança. Derramamos lágrimas, mas continuamos a ler. Existe doçura na dor. Isso é possível.

A separação de Krishna é assim. Essa é a característica especial de krsna-prema: sentimos externamente dor extrema como fogo da lava, mas nosso coração é saturado com uma extraordinária alegria extática. Foi isso que Sri Chaitanya Mahaprabhu nos deu. Estaremos preparados para esse tipo de vida, na medida em que capturarmos o significado de Suas instruções. Essa é a tarifa que se paga para ir a Vrindavana, e, quando formos apresentados a tantos outros como nós, nossa alegria não terá limite. Obtemos consolo quando nos encontramos com outros de mesma natureza e mentalidade. Não precisamos temer. Devemos pensar convictamente que aquele é nosso lar e, apesar de tudo, devemos desejar voltar ao lar, de volta ao Supremo.

Lá não somos estrangeiros. Somos estrangeiros aqui: cada pessoa me trata do jeito que quiser. Mas Vrindavana é altamente auspiciosa e plena do mais elevado prospecto. É o lugar da satisfação interna. Ansiamos por isso; não podemos deixar de ansiar por nosso verdadeiro lar. Qual é a verdadeira alegria e êxtase? Não temos ciência disso. Esse é nosso problema atual. Mesmo assim, vamos nos conscientizar sobre um sentimento prático de verdadeira alegria e êxtase, beleza e encanto, à medida que progredimos na consciência de Krishna, e, dessa forma, iremos nos encorajar cada vez mais.

Yamunacharya diz:

yad-avadhi mama cetah krsna padaravinde
nava-nava-rasa-dhamany udyatam rantum asit
tad-avadhi bata nari-sangame smaryamane
bhavati mukha-vikarah susthu nisthivanam ca

"O prazer mundano era o mais importante para mim antes de entrar em contato com o amor de Krishna em Vrindavana; mas agora, se vier algum sabor mundano em minha memória, minha face se desfigura, e cuspo no meu pensamento".

Se obtivermos um mínimo de gosto por esse êxtase, concluiremos imediatamente que não pode haver comparação entre ele e qualquer paz ou prazer aqui deste mundo mundano. Ao mesmo tempo, quando nos estabelecemos nessa atmosfera, nenhuma dor poderá nos perturbar ou afetar de jeito nenhum.

Existe um outro lado também: apesar de recebermos o conselho de nos prepararmos para a separação dolorosa, o fato não é assim tão cruel na realidade. Krishna diz, mayi te tesu capy aham: "Estou sempre com Meus devotos". Onde quer que haja um devoto exclusivo, Krishna está lá como sua sombra, sempre a Se mover invisível atrás dele. Assim é a natureza do Senhor:

aham bhakta-parardhino
hy asvatantra iva dvija
sadhubhir grasta-hrdayo
bhaktair bhakta-jana-priyah

O Senhor disse a Durvasa: "Sou escravo de Meus devotos; não tenho liberdade separada do desejo deles. Meu coração é controlado por eles, e moro sempre em seus corações, porque são completamente puros e devotados a Mim. Não dependo apenas de Meus devotos, mas até dos servos de Meus devotos. Mesmo os servos de Meus devotos são queridos por Mim".

Krishna não é um Doce

Devemos estar preparados para qualquer circunstância desfavorável, mas não devemos nos desencorajar. Krishna é muito afetuoso; Sua preocupação conosco é a mais intensa e sincera. Sua afeição por nós não tem rival. Mesmo assim, Sriman Mahaprabhu nos deu um aviso nesse verso: "Começou a busca de Krishna? Krishna não é um doce que se compra no mercado e se consome facilmente. Ao tentar obter o mais elevado do Supremo, deve estar preparado para tudo".

Ao mesmo tempo, os devotos virão e dirão: "Não tenha medo. Somos como você. Vamos caminhar juntos numa linha reta. Não tema - estamos aqui". Disseram-nos que os devotos de Krishna são mais complacentes do que o próprio Krishna. O consolo de nossas vidas e nossa fortuna são Seus devotos, e Krishna diz: mad bhaktanam ca ye bhakta: "Aquele que é servo do Meu servo é Meu verdadeiro servo". Sadhu-sanga, associação com santos, é o que há de mais importante e valioso para nós. Nossa associação é nossa guia para avançar e progredir em direção ao infinito; é o mais importante. Devemos nos agarrar ao infinito; é o mais importante. Devemos nos agarrar a essa conclusão:

'sadhu sanga', 'sadhu sanga', - sarva sastre kaya
lava-matra sadhu-sange sarva-siddhi haya

As escrituras concluem que toda perfeição pode ser alcançada com a ajuda dos santos. Nossa maior riqueza para alcançar o objetivo supremo é a boa associação.

 

Parte 3

 

Epílogo

 

Uma Gota de Amor Divino

Somente Sri Chaitanya Mahaprabhu pode dar o conceito de teísmo pleno. É Sua graça, Sua doce vontade. É Sua própria riqueza, não é propriedade de muitos. Krishna é um autocrata. Ele é o supremo. Quem quer que Ele escolha para receber Sua própria riqueza vai recebê-la. Ninguém pode levantar a questão de que: "Não há cobrança de impostos sem representação" - não há lugar para tal tipo de propaganda aqui.

Bhaktivinoda Thakur se põe na posição de uma alma caída, a fim de nos ensinar, e diz: "Minha posição é de servo de Krishna, mas sou desprovido de Krishna. O que sou eu? Sou um escravo de Krishna, um escravo do Senhor, mas estou privado do meu Senhor? Que situação irônica". Pode se lamentar, sentir muito, condoer-se, mas todos os direitos pertencem a Ele. Obterá essa riqueza quando despertar para esse estágio elevado de auto-entrega. Ainda assim, temos de nos conscientizar de que Krishna está acima da lei.

Ao analisar as bases fundamentais da rendição, devemos perguntar onde começa a entrega? Não existem direitos na rendição total. A rendição será desnecessária sempre que se estabelecer qualquer direito. Não devemos pensar que: "É preciso lutar por nossos direitos naturais". Neste mundo e até certo ponto, podemos lutar por nossos direitos, mas não há lugar para essa mentalidade nos passatempos de Krishna.

"Todos Direitos Reservados"

Nem mesmo a deusa da fortuna, Lakshmidevi, pode entrar lá, o que dizer de outros. É inconcebível. Krishna não está sujeito a nenhuma lei, nem está sob o controle de ninguém. "Todos os direitos reservados". Tudo é Sua doce vontade. Mas Ele é absolutamente bom, esse é nosso consolo.

Não podemos entrar em Seu domínio como se fosse um direito. Mesmo o senhor Brahma, o Senhor Shiva e Lakshmidevi não podem entrar lá. Ainda assim, se seguirmos o caminho trilhado por Sri Chaitanya Mahaprabhu, poderemos entrar e alcançar uma posição lá.

Isso é tão querido, tão raro, tão valioso e desejável. Devemos procurar pela magnanimidade de Sri Chaitanya Mahaprabhu, desejada pelo senhor Brahma e pelo Senhor Shiva. Eles oram por uma gota de Sua misericórdia, mas Sri Chaitanya Mahaprabhu trouxe uma enchente e inundou todos com esse néctar, cuja uma única gota apenas é raramente obtida ou até mesmo pensada. Temos de nos aproximar de Sua misericórdia com essa atitude de anseio e expectativa. Quem pode compreender Sua misericórdia? Sua dádiva é tão grande e magnânima!

Ele nos leva direto ao lugar mais elevado, e elimina tantas coisas externas, com dois versos do Srimad Bhagavatam, um da boca do próprio Krishna, e o seguinte da boca de Uddhava. Krishna diz:

na tatha me priyatama
atma-yonir na sankarah
na ca sankarsano na srir
naivatma ca yatha bhavan

"Ó Uddhava! Nem Brahma, nem Shiva, nem Baladeva, ou Lakshmi - nem Eu próprio - são tão queridos por Mim como você".

E Uddhava diz:

asam aho carana-renu-jusam aham syam
vrndavane kim api gulma-latausadhinam
ya dustyajam svajanam arya-patham ca hitva
bhejur mukunda-padavim srutibhir vimrgyam

"As gopis de Vrindavana deixaram a companhia de seus maridos, filhos e outros membros familiares, muito difíceis de renunciar, e sacrificaram até mesmo os princípios religiosos para se abrigarem aos pés de lótus de Krishna, que são procurados até pelos Vedas. Oh! Conceda-me a grande sorte de nascer como uma folha de grama em Vrindavana, para que eu possa tomar a poeira dessas grandes almas em minha cabeça".

A Marcha Progressiva para a Divindade

A gradação do teísmo pode ser traçada desde o senhor Brahma, criador do universo, até Uddhava, o amigo íntimo de Krishna em Dwaraka. E Uddhava nos conduz diretamente a Vrindavana para revelar a devoção mais elevada, assim elimina vários planos em nossa marcha progressiva em direção à divindade. Temos de continuar a marcha. E o caminho é o da entrega, da devoção amorosa, e não mera devoção formal.

vaikuntaj janito vara madhu-puri tatrapi rasotsavad
vrndaranyam udara-pani-ramanat tatrapi govardhanah
radha-kundam ihap gokula-pateh premamrtaplavanat
kuryad asya virajato giri-tate sevam viveki na kah

"Mathura, onde Sri Krishna aparece primeiro, é superior ao reino espiritual de Vaikuntha. A floresta de Vrindavana onde Krishna desfruta da dança rasa é superior a Mathura. Melhor ainda é a colina de Govardhana, local de passatempos de amor mais confidenciais. Mas o melhor de todos é Radha-kunda, situado aos pés da colina de Govardhana, que mantém a posição suprema porque é inundado com o néctar de qualidade suprema do amor divino. Quem, familiarizado com a ciência da devoção, não aspira pelo serviço divino à Srimati Radharani no Radha-kunda"?

O Coração de Krishna

Devemos aplicar nossa fé nesses tópicos sutis. Só podemos ser conduzidos a esse local supremo através da fé de melhor qualidade. A concepção mais elevada está no coração de Krishna, não em qualquer outro lugar.

Embora os passatempos conjugais de Krishna com as gopis (madhurya-lila) sejam supremos, eles não podem permanecer sozinhos: Há muitas outras coisas presentes em Seus passatempos. Os passatempos de Krishna com Seus amigos e parentes são essenciais como suporte a Seus passatempos amorosos conjugais. É claro que o amor conjugal é o principal, mas mesmo assim, depende da outra parafernália dos passatempos de Krishna. Tem de haver a família de Krishna e Seus amigos, e todos os diversos grupos de servos. Mesmo o próprio ambiente de Vrindavana tem sua valiosa participação.

E o que é Vrindavana? A areia do rio Yamuna, a selva, os pássaros, pavões, e veados, as vacas, os meninos pastores de vacas, as cavernas da colina de Govardhana, os parentes maternos - tudo lá está, e é bem feito e muito adequado aos passatempos de Sri Krishna.

Vrindavana é necessária para os passatempos de Radha e Govinda. Quando Radharani se encontra com Krishna em Kurukshetra, Sua mente corre para Vrindavana. Ela pensa: "Krishna está aqui, e Eu também", mas Sua mente corre para Vrindavana. Srimati Radharani em Kurukshetra anseia pelo ambiente de Vrindavana; Ela quer ter a companhia de Sri Krishna lá. Todos os associados divinos e parafernália de Krishna têm seu valor único, e não podem ser eliminados.

Radha-Govinda não podem ser retirados de Vrindavana tanto quanto Sri Chaitanya Mahaprabhu não pode ser retirado de Navadwip. A coisa toda é um sistema. Uma parte não pode ser desconectada das outras partes. Todos os devotos têm um papel necessário a fim de criar a harmonia dos passatempos de Krishna. Se não fosse assim, não seria vida, mas morte, artificial, inútil. E isso não se pode nem imaginar. Krishna-lila é um todo orgânico.

Srimati Radharani diz: "Minha mente corre direto para Vrindavana. Tenho o objeto principal de prazer, Krishna em pessoa, mas isso é inútil sem a parafernália favorável de Vrindavana". Assim, a dor de separação de Radharani alcança o ponto máximo em Kurukshetra, onde Ela alcança o objeto de Sua união após uma longa separação. Krishna está bem perto ali, mas Ela não pode aproveitar realmente a união sem estar rodeada pela parafernália favorável de Vrindavana. Desse modo, Bhaktivinoda Thakura explicou o humor de Srimati Radharani em Kurukshetra.

Um Guru Revolucionário

Certa vez, Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura revelou a importância de Kurukshetra de forma singular. As palavras de nosso guru maharaja na maioria das vezes eram muito revolucionárias. Quando eu era iniciante com apenas dois anos no Gaudiya Math, era encarregado do templo de Kurukshetra. Certa vez, cheguei no Math de Calcutá, situado numa casa alugada em Ulta Danga para o festival de pregação anual. Após o festival, voltava a Kurukshetra. Srila Prabhupada pensava em abrir uma "Exibição Teísta" em Kurukshetra, com exibições de dioramas (esculturas em barro cru e decoradas), como Krishna e Seus amigos vieram de Dwaraka, e as gopis vieram de Vrindavana.

O Srimad Bhagavatam menciona que durante o eclipse solar, todos eles vieram se banhar no Brahma-kunda, um lago sagrado em Kurukshetra. Srila Prabhupada queria mostrar esse passatempo com um diorama, e, assim, a exibição foi feita. Ele ordenou a impressão de vinte mil panfletos e que esses fossem distribuídos na área, a fim de convidar as pessoas para a exibição.

Vrindavana é para Pensadores Superficiais?

Ele nos disse a esse respeito: "Saibam todos que somente as pessoas falsas e sem valor, e homens de pensamento superficial gostam de Vrindavana". Fiquei muito perplexo ao ouvir isso. Sempre ouvi que Vrindavana é o lugar mais elevado de perfeição espiritual. Ouvi que quem não controlou os sentidos não pode entrar em Vrindavana. Tão só as almas liberadas podem entrar em Vrindavana e têm a oportunidade de discutir krsna-lila. Vrindavana é para as almas liberadas. Quem não se libertou das demandas dos sentidos pode viver em Navadwip, mas as almas liberadas podem viver em Vrindavana. Agora, Prabhupada dizia que pensadores superficiais apreciam Vrindavana, mas pessoas de verdadeiro bhajana, genuína aspiração divina, almejam viver em Kurukshetra.

Senti como se tivesse caído de cima de uma árvore quando ouvi isso. "O que é isso"? - pensei. Sou um ouvinte muito apurado, por isso, fiquei muito atento para compreender o significado de suas palavras. O próximo pensamento que nos deu, foi que Bhaktivinoda Thakura, após visitar muitos locais de peregrinação, afirmou: "Gostaria de passar os últimos dias de minha vida em Kurukshetra. Construirei uma cabana perto do Brahma-kunda e passarei o resto da minha vida lá. Kurukshetra é o verdadeiro local de bhajana".

Comerciantes Astutos

Por quê? O serviço é mais valioso conforme a intensidade da sua necessidade. Comerciantes astutos procuram um mercado em época de guerra porque nessa situação perigosa, o dinheiro é gasto como água, sem preocupação com seu valor. Eles podem ganhar mais dinheiro em época de guerra. Do mesmo modo, quando a necessidade de Srimati Radharani alcança seu auge, o serviço a Ela se torna extremamente valioso. O serviço é avaliado conforme sua necessidade. Srimati Radharani está na mais alta necessidade em Kurukshetra, porque Krishna está tão perto, mas Sua lila de Vrindavana é impossível. Se a bola num jogo de futebol estiver próxima do gol, e recuar em seguida, isso é considerado uma grande perda. Igualmente, Krishna está lá em Kurukshetra, após uma longa separação; assim, o anseio por união que Seus devotos sentem deve chegar ao ponto máximo, mas não podem se unir intimamente, porque Krishna age como rei. As circunstâncias não permitem que aconteça o Vrindavana lila. Nesse momento, Srimati Radharani necessita do serviço mais elevado do Seu grupo, as shakhis.

Bhaktivinoda Thakura diz que, nessa situação, uma gota de serviço concederá a maior quantidade de prema, amor divino. Existem dois aspectos nos passatempos de Radha-Govinda: sambhoga, união divina, e vipralambha, separação divina. Quando Radha e Krishna estão muito pertos um do outro, mas não podem Se unir intimamente, o serviço nesse momento pode conceder o maior ganho aos servos. Portanto, Srila Bhaktivinoda Thakura diz: "Construirei uma cabana na margem do Brahma-kunda em Kurukshetra e aspirarei prestar serviço ao Casal Divino. Aí, não haverá possibilidade de voltar a este plano mundano em nenhum momento, se eu puder alcançar esse padrão onde o prospecto de serviço é tão elevado".

A Quinta Nota

Srimati Radharani disse, ao chegar em Kurukshetra:

pryah so'yam krsnah sahacari kuru-ksetra-militas
tathaham sa radha tad idam ubhayoh sangama-sukham
tathapy antah-khelan-madhura-murali-pancama-juse
mano me kalindi-pulina-vipinaya sprhayati

"Queridas amigas, por fim, agora estou reunida com Meu mais querido Krishna em Kurukshetra. Sou a mesma Radharani, e Ele é o mesmo Krishna. Desfrutamos de Nosso encontro, mas, ainda assim, desejo voltar à margem do Kalindi onde podia ouvir a doce melodia de Sua flauta que soava a quinta nota embaixo das árvores da floresta de Vrindavana" (Padyavali).

Vrindavana é necessária, onde quer que Radharani e Krishna estejam. E Vrindavana significa a parafernália favorável. Assim, Vrindavana é inigualável.

Quando Krishna, após sua longa separação, encontrou-se com os habitantes de Vrindavana em Kurukshetra, primeiro veio ao acampamento de Nanda e Yashoda para lhes mostrar respeito paternal. Eles sentiram, em meio a seu grande desapontamento, que: "Oh! Finalmente nosso filho veio nos ver". Era como se a vida tivesse retornado aos mortos. Krishna cuidou para se encontrar com as gopis, privadamente, após lhes conceder alguma cortesia, e apareceu de súbito no acampamento delas. Krishna era externamente o líder de tantos reis na Índia. E as gopis vieram de um lugar desconhecido, onde viviam na selva, na sociedade dos leiteiros. Elas não tinham nenhuma posição externa, e Krishna tinha a posição mais exaltada na sociedade política e real. Ele era a figura central, como a menina dos olhos de todos. E elas estavam numa situação desamparada, pobre e negligenciada. As gopis apelaram a Krishna e disseram:

ahus ca te nalina-nabha padaravindam
yogesvarair hrdi vicintyam agadha-bodhaih
samsara-kupa-patitottaranavalambam
geham jusam api manasy udiyat sada nah

O grupo das gopis disse a Krishna: "Ó Você que tem umbigo de lótus, sabemos que os grandes mestres yogis que não têm nada a ver com este mundo mundano tentam meditar em Seus pés de lótus. O interesse deles é de realização superior no mundo consciente. É dito que eles concentram sua maior atenção em Seus pés de lótus. E aqueles que estão ocupados em incrementar suas vidas neste mundo de exploração também estão ocupados em adorar Seus pés de lótus para escaparem do emaranhamento da ação e reação. Seus pés de lótus são o centro dos interesses dos elevacionistas (karmis) e dos salvacionistas (jñanis e yogis)".

O Krishna Pastoril

"E o que somos nós? Somos apenas pessoas do campo, e as vacas são nossa riqueza. Somos criadoras de vacas que vivem no campo, do comércio no ramo de gado leiteiro, e da venda de coalhada e leite nos subúrbios da sociedade. Não somos exploradores científicos (karmis), nem o tipo de exploradores que pesquisam o mundo da consciência. Só conhecemos a vida familiar. Não temos outras qualificações.

Estamos ocupadas com nossas vidas familiares nas classes mais baixas da sociedade. Mas em nossa audácia, oramos para que saiba que nos sentiríamos abençoadas, se, em qualquer momento, concordasse bondosamente em estender Seus pés de lótus até nossos corações desprezíveis. Estamos ocupadas em nossos afazeres familiares. Não conhecemos a vida das escrituras ou os métodos dos salvacionistas. Não sabemos nada de yoga, jñana, Vedanta ou dos Vedas. Nossa preocupação principal não é com as escrituras ou padrões morais. Mantemos uma posição insignificante na sociedade e apenas oramos para podermos nos lembrar de Seus pés de lótus em meio a nossa vida doméstica. Por favor, conceda-nos isso. Não podemos esperar mais nada de Você". Assim foi a petição delas.

Krishna respondeu, e disse:

mayi bhaktir hi bhutanam
amrtatvaya kalpate
distya yad asin mat-sneho
bhavatinam mad-apanah

"Sim, Eu sei. As pessoas desejam devoção a Mim para alcançarem a vida eterna. Elas vêm a Mim e Me adoram para atravessarem o limite da mortalidade e obter vida eterna. Elas desejam Meu serviço por essas razões, mas vocês, felizmente, possuem alguma afeição natural por Mim. Isso as trará finalmente a Mim".

Esse é o significado formal e superficial da conversa entre Krishna e as gopis. Mas os grandes preceptores em nossa linha extraíram outro significado dessas preces. Eles são conscientes da verdadeira relação íntima de ambas as partes. Portanto, concederam um outro significado baseado no sentimento divino entre o amante e o amado.

Quando as gopis oraram a Sri Krishna em Kurukshetra, seu verdadeiro propósito era o seguinte: "Oh, lembramos que um dia enviou Uddhava para nos consolar. Ele recitou muitas referências das escrituras sobre como o mundo é mortal, como não é nada, como todos iremos morrer, afeição não tem muito valor, o apego deve ser cortado. Disse que devemos tentar nos livrar de qualquer atração pelo ambiente e alcançar salvação. Queria nos dizer todas essas coisas aparentemente doces através de Uddhava. Agora, pessoalmente nos mostra o mesmo caminho. Diz que é grande e que todos devem tentar pensar em Você, para seu maior interesse". Essa explicação se encontra no Sri Chaitanya Charitamrita. As gopis dizem a Krishna: "Pensa que somos yogis e que ficaremos satisfeitas em meditação abstrata em Você? Poderemos nos satisfazer através da imaginação? Não fazemos parte disso. Nem somos karmis, trabalhadores lucrativos que só incrementam sua grande dívida com a natureza, que vêm à Sua porta para obter alívio, e oram: 'Ó Deus, alivie-nos de nossos pecados prévios'. Não pertencemos a nenhuma dessas duas categorias".

"Quem somos? Queremos viver com Você como Sua família. Não estamos interessadas em coisas abstratas nem em eliminar os erros de karma para anular as atividades pecaminosas. Não queremos usá-Lo para nenhum outro propósito. Queremos ter uma vida familiar direta com Você. Não sabe disso? E ainda assim envia mensagens através de Uddhava, e agora isto! Não tem vergonha"? Esse é o significado interno.

Resposta Íntima de Krishna

A resposta de Krishna também possui um aspecto interno. Ele responde: "Vocês sabem, todos Me querem. Desejam que os ajude a alcançar a posição mais elevada no mundo de benefício eterno através da devoção. Eles se consideram afortunados se possuírem uma conexão Comigo. Mas por outro lado, considero-Me afortunado por ter entrado em contato com a valiosa afeição que encontro em seus corações".

As gopis leram o significado interno dessa forma. E quando Radharani pôde ver o significado interno da resposta de Krishna, ficou satisfeita. Ela pensou: "Onde quer que Ele esteja no sentido físico, Ele é somente Meu de coração". Ela recompôs Seus problemas interiores e voltou a Vrindavana com o pensamento: "Ele não tem saída senão Se juntar novamente a nós muito em breve".

Srila Rupa Goswami Prabhupada revela o significado interno desse verso no Padyavali. Quando Krishna veio ao acampamento das gopis em Kurukshetra, encontrou Srimati Radharani de súbito e curvou-Se como se fosse tocar nos pés Dela. Radharani recuou e disse: "Que faz! Tentou tocar nos Meus pés"? Ela estremeceu: "Não fez nada de errado. É o Meu mestre. Tem liberdade de fazer o que quiser. Sou Sua criada e tenho de tentar satisfazê-Lo com cada nervo. Não cometeu nenhum crime. Eu é que sou a criminosa. Como é isso? Eu ainda mantenho Meu corpo e Minha vida. Esse é o crime - Não pude morrer de saudade de Você! Ainda mostro minha face ao público - sou indigna de Seu afeto divino. Todo o peso de quebrar a lei do amor está sobre Minha cabeça".

Nem uma Gota de Amor Divino

Srimati Radharani falou desse modo. Sri Chaitanya Mahaprabhu diz num verso similar:

na prema-gandho'sti darapi me harau
krandami saubhagya-bharam prakasitum
vamsi-vilasy-anana-lokanam vina
vibharmi yat prana-patangakan vrtha

"Não tenho nem mesmo uma única gota de amor divino por Krishna dentro de Mim. Não se encontra nenhum vestígio de amor por Krishna dentro de Mim. Pode perguntar: 'Então, por que derrama lágrimas profusamente, sem interrupção? Dia e noite, está sempre a derramar lágrimas por Krishna. Como explica isso'? Oh, não sabe! Faço isso só para aparecer e enganar as pessoas em geral para que pensem que tenho amor divino por Krishna. Mas sou um hipócrita. Por que digo isso? A prova positiva é essa: ainda estou vivo. Não pude morrer! Eu teria morrido de separação de Krishna se tivesse algum amor verdadeiro por Ele. Essa é a prova positiva de que não tenho nenhum vestígio de krsna-prema dentro de Mim".

Krishna-prema é tão elevado e atraente que ninguém pode manter a vida sem ele após ter entrado em contato. É tão elevado, tão belo, tão encantador - devora o coração! É impossível até mesmo concebê-lo. O amor divino em tão alto nível é conhecido como prema. Esse amor divino por Krishna não é para ser detectado neste mundo mundano. Se alguém por um acaso experimentar esse tipo elevado e vital de devoção, morrerá instantaneamente se houver qualquer separação dela. É tão bela e magnânima. Nosso propósito é procurar por esse amor divino neste mundo. E Sriman Mahaprabhu veio distribuir isso ao mundo para nosso bem.

"Tomemos Veneno..."

Ouvi dizer que um grupo de pessoas na América do Sul cometeu suicídio coletivo ao sentir que seu modo de vida crente seria destruído pela presente civilização. Eles não puderam suportar isso, e pensaram: "Tomemos veneno e deixemos este mundo para trás. Assim poderemos viver em segurança no mundo de nossa fé. Não temos nenhuma atração por qualquer coisa neste mundo mundano. Vamos em paz. Somos membros do mundo pacífico. Desfrutemos dessa paz que é independente da aquisição material".

Embora concordemos que não há encanto aqui que nos faça hesitar de nos removermos deste mundo, temos de discordar e dizer que nossa vida neste mundo é valiosa. Por quê? Podemos obter uma aspiração superior nesta vida. Temos a chance de adquirir o objetivo aqui neste plano. A vida humana é tão valiosa, pois nela podemos seguir o caminho da concepção divina suprema. Este corpo humano é altamente avaliado e raramente alcançado. O Srimad Bhagavatam (11.9.29) afirma:

labdhva su-durlabham idam bahu-sambhavante
manusyam artha-dam anityam apiha dhirah
turnam yateta na pated anu-mrtyu yavan
nihsreyasaya visayah khalu sarvatah syat

"A forma humana de vida é raramente obtida e, embora temporária, dá a chance de alcançar o objetivo supremo da vida. Portanto, aqueles que são sérios e inteligentes devem se esforçar imediatamente pela perfeição antes que outra morte ocorra. Há tantas formas de vida: aquáticos, reino vegetal, animais, pássaros, fantasmas e outros seres vivos, mas somente na posição humana é que possuímos a chave para completar a solução dos problemas da vida".

Se usarmos a vida humana de forma valiosa, conseguiremos a chave para nos livrarmos da cadeia da vida neste mundo problemático. Podemos nos livrar do cativeiro de todos os tipos de problemas mentais e físicos. A chave está aqui, nesta forma humana de vida. Jiva Goswami diz que formas inferiores de vida possuem compreensão insuficiente para realizar a verdade suprema. E nas formas de vida superiores, como as de semideuses, por terem previamente adquirido energia ou karma acumulado por todos os lados, os elementos de desfrute principais rodeiam os seres vivos. É muito difícil conseguir se livrar do encanto dessas influências e iniciar o prospecto de uma vida nova num plano superior de consciência. Esta forma humana de vida é a posição mais vantajosa para escapar do enredamento e alcançar o objetivo supremo de nossa vida divina.

O Conceito Supremo de Magnanimidade

As pessoas perguntam, às vezes: "Por que Sri Chaitanya Mahaprabhu escolheu a classe mais baixa, as pessoas de kali-yuga, para dar a concepção mais elevada de amor divino - krsna-prema"? Mas essa é a própria natureza de Sri Chaitanya-avatara. Por que as gopis são consideradas como os devotos mais exaltados e provêm de uma posição social desprezível? Qual é o significado do mais alto conceito de magnanimidade? Como deve ser sua natureza? Ajudar os mais necessitados.

Sri Chaitanya Mahaprabhu vem da posição mais elevada, por isso não pode dar coisas comuns; Ele tem de dar as coisas mais valiosas, e Sua atenção é voltada aos mais necessitados. Isso não é natural? A magnanimidade suprema deve atender os mais baixos e necessitados. E se Ele deseja ajudá-los, fará com Sua própria moeda. Ele não pode distribuir somente vidro ou pedras baratas. Por que procuraria por pedras baratas para distribuir ao nível inferior, enquanto possui a opulência de jóias e pedras preciosas? Ele deve estender aos inferiores e pobres o que considera ser verdadeira riqueza.

Mahaprabhu - O Grande Messias

Portanto, todos nós deveríamos cair aos pés do grande Messias, Sri Gauranga Mahaprabhu. Seus devotos dizem: "Se tivéssemos que conceber um lugar onde Gauranga não tivesse aparecido, não poderíamos manter nossas vidas. Nós estremecemos ao pensar em viver sem um amigo tão magnânimo como Sri Gauranga". Como se pode viver a vida sem Gauranga? É impossível. Não vale a pena viver no mundo sem Gauranga.

Sri Gauranga é o mais magnânimo. Sri Chaitanya Mahaprabhu e Seus companheiros do Pañcha-tattva vieram para elevar todas as almas de suas condições caídas. Em geral, somente os merecedores podem adentrar em Vrindavana, em krsna-lila. Mas Krishna em pessoa vem como Sri Chaitanya Mahaprabhu para curar os ofensores de suas ofensas e lhes garantir entrada em Vrindavana. Podemos nos purificar até mesmo da posição mais baixa e nos prepararmos para a participação em Vrindavana lila, simplesmente por cantar os nomes do Pañcha-tattva e lembrar o lila Deles.

Radha-Govinda desfrutam Seus passatempos de amor divino em Seu próprio círculo em Goloka Vrindavana. E existe uma outra região onde Radha-Govinda estão combinados como Sri Chaitanya Mahaprabhu - o próprio Krishna no humor de Radharani saboreia Sua própria doçura com Seu ambiente. Temos de realizar isso através do processo recomendado. Quem é Sri Chaitanya Mahaprabhu? Ele veio aqui para conceder a dádiva que nos promoverá ao objetivo supremo da vida.

Consciência de Gaura

Trazer Sri Gauranga para perto de nossa alma é obter, mesmo inconscientemente, uma garantia de alcance em krsna-lila. É mais útil para a alma caída cultivar devoção a Sri Gauranga. Isso nos dará a completa satisfação da vida com o mínimo de problema. Devoção a Gauranga não nos conduzirá a nenhuma consciência de Krishna casual ou mal concebida, mas sim à verdadeira consciência de Krishna. Podemos ter consciência de Krishna plena com a ajuda da consciência de Gaura. Depois de desenvolver devoção a Sri Gauranga, seremos capazes de sentir que consciência de Sri Gauranga também inclui consciência de Krishna - com algo a mais. O que é isso? A distribuição da consciência de Krishna.

Krishnadasa Kaviraja Goswami, quem nos deu o Sri Chaitanya Charitamrita, a literatura teológica mais valiosa que já viu a luz do dia, escreveu:

krsna-lila amrta-sara, tara sata sata dhara,
dasa-dike vahe yaha haite
se caitanya-lila haya, sarovara aksaya,
mano-hamsa caraha' tahate

"O que é krsna-lila? É a verdadeira essência do néctar. É o âmago da doçura, felicidade, e êxtase. A doçura do que se pode conceber de mais doce é representada em krsna-lila. Então o que é chaitanya-lila? Esse doce néctar de krsna-lila flui nas dez direções em centenas de córregos de uma fonte no chaitanya-lila". Embora chaitanya-lila tenha aparecido depois de krsna-lila, chaitanya-lila é a fonte, o alicerce. Vimos que Krishna apareceu em dwapara-yuga, a era prévia, e depois Sri Chaitanya Mahaprabhu apareceu mais tarde, na kali-yuga. Ainda assim, o lila Deles é eterno. Primeiro vem o doador, depois a dádiva. E a dádiva de Sri Chaitanya Mahaprabhu é que distribui rios ilimitados do doce krsna-lila neste mundo e nas dez direções.

Krishnadasa Kaviraja Goswami conclui: "Ó devotos, venham! Devem nadar no lago dos passatempos de Sri Chaitanya Mahaprabhu como muitos cisnes. Krishna-lila flui desse lago em direção ao mundo em vários córregos. Devotos, como nuvens, pegam o néctar desse lago, e distribuem o néctar gratuitamente às almas afortunadas. Venham e vivam nesse lago. Que esse cisne nade no lago nectáreo da vida e ensinamentos de Sri Chaitanya Mahaprabhu, de onde fluem centenas de córregos em todas as direções. Ó devotos, ofereço-lhes esta humilde prece".

Nitai Gaura Hari Bol!

 

 

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